Mia Couto vence prémio da Feira Internacional do Livro de Guadalajara
Escritor moçambicano foi escolhido entre 49 autores de 20 países. Quatro autores de língua portuguesa (António Lobo Antunes, Lídia Jorge, Nélida Piñon e Rubem Fonseca) já mereceram o galardão.
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O escritor moçambicano Mia Couto é o vencedor do Prémio FIL (Feira Internacional do Livro de Guadalajara) de Literatura em Línguas Românicas 2024, anunciou esta segunda-feira o júri, numa conferência de imprensa no México.
O júri decidiu atribuir o prémio por unanimidade, algo que "diz tudo quanto ao reconhecimento da obra [de Mia Couto], do que significa literariamente, para a língua portuguesa e para quem escreve literatura nesse sulbúrbio da língua portuguesa que é Moçambique", referiu o ensaísta e professor português Carlos Reis, que integrou o júri e a quem coube anunciar o nome do vencedor.
Com este prémio "reconhece-se uma obra literária notável que inclui crónica, conto, novela", considerou o júri, composto por sete críticos literários e escritores.
O vencedor, que recebe um prémio de 150 mil dólares, foi escolhido entre 49 autores de 20 países, que escrevem em seis línguas: catalão, castelhano, francês, italiano, português e romeno.
Mia Couto vai estar presente na abertura da 38.ª FIL de Guadalajara, a 30 de Novembro. A feira decorre até 8 de Dezembro.
Numa videochamada a partir de Moçambique, Mia Couto mostrou-se surpreendido com distinção: "Foi uma grande e bela surpresa", disse aos presentes na conferência de imprensa, que foi transmitida online para todo o mundo.
Em resposta a questões dos jornalistas presentes, o escritor partilhou que "o primeiro grande assunto" que o preocupa actualmente é a paz, lembrando que vive num país "que ainda está em guerra".
"Preocupa-me também esta falsa busca de uma afirmação identitária, quando África se ocupa de afirmar o que é a sua própria universalidade", referiu.
Mia Couto considera que Moçambique "tem um desafio enorme que é não esquecer". "Luto também na minha escrita contra esse apagamento da História, essa espécie de 'historicídio'", defendeu.
Lembrando que começou a carreira como jornalista, o escritor mostrou-se preocupado com a crise vivida no jornalismo, "que pode significar um dia a sua morte". "Mas não é por causa da ameaça das redes sociais e da tecnologia, mas por causa de uma questão: quem são os donos dos meios de comunicação de hoje?", precisou
Esta não é a primeira vez que um escritor de língua portuguesa é distinguido com o Prémio FIL de Literatura em Línguas Românicas. Os portugueses António Lobo Antunes e Lídia Jorge receberam o prémio em 2008 e 2020, respectivamente, e os brasileiros Nélida Piñon e Rubem Fonseca em 1995 e 2003.
É, no entanto, a primeira vez que um escritor africano é premiado.
Mia Couto nasceu na Beira, em Moçambique, em 1955, trabalhou como jornalista e professor, repartindo-se hoje entre as ocupações de biólogo e escritor.
Prémio Camões em 2013, é autor, entre outros, de Jesusalém, O Último Voo do Flamingo, Vozes Anoitecidas, Estórias Abensonhadas, Terra Sonâmbula, A Varanda do Frangipani e A Confissão da Leoa.
Traduzido em mais de 30 línguas, o escritor foi igualmente distinguido com o Prémio Vergílio Ferreira, em 1999, com o Prémio União Latina de Literaturas Românicas, em 2007, e com o Prémio Eduardo Lourenço, em 2011, pelo conjunto da obra, entre outras distinções.
Terra Sonâmbula foi eleito um dos 12 melhores livros africanos do século XX, e Jesusalém esteve entre os 20 melhores livros de ficção mais publicados em França, na escolha da rádio France Culture e da revista Télérama.
Em Outubro está a prevista a edição de um novo livro de Mia Couto, A Cegueira do Rio, de que o PÚBLICO já divulgou um excerto.
O programa completo da 38.ª FIL de Guadalajara será anunciado a 8 de Outubro.