O número de queimadas na Amazónia brasileira no mês de Agosto foi o maior desde 2010, mostram dados de uma instituição pública divulgados no domingo. Uma seca recorde que está há vários anos a assolar a floresta contribui muito para este resultado.
No ano passado, as chuvas chegaram tarde e foram mais fracas do que o habitual, por causa do padrão meteorológico El Niño. Potenciado pelas alterações climáticas, este fenómeno cíclico deixou a floresta tropical especialmente vulnerável aos incêndios.
Também o Pantanal, uma zona naturalmente ainda mais húmida que a Amazónia, está a ter um ano negro: cerca de 2,3 milhões de hectares do Pantanal foram consumidos por incêndios desde o início de 2024, segundo dados actualizados do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Isto significa que mais de 15% deste bioma brasileiro, que abriga flora e fauna únicas – incluindo espécies ameaçadas de extinção –, foram total ou parcialmente afectados pelas chamas este ano.
Os fogos tiveram início no final de Maio – o que é invulgarmente cedo para esta zona húmida, persistiram durante Junho e Julho, e, agora, em Agosto, ganharam proporções excessivas. Devido à seca extrema, que transforma em combustível o que devia ser matéria molhada, os incêndios no Pantanal brasileiro estão a trazer de volta memórias trágicas de 2020, quando o bioma foi atingido pelos piores fogos de que há memória.
Satélites detectaram 38.266 focos de incêndio na Amazónia brasileira em Agosto, mais que o dobro do que no ano anterior e o maior número para este mês desde 2010, revelam dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Com a explosão das queimadas, os chamados “rios voadores”, que levam a humidade da floresta amazónica para outras regiões do continente, transformaram-se num imenso corredor de fumo que pode ser visto até do espaço. Ao longo de Agosto, o fumo espalhou-se por outras zonas do Brasil, a milhares de quilómetros de distância, atingindo pelo menos 11 estados, salienta a WWF-Brasil.
Os dados de Agosto, que mostram o valor máximo dos últimos 14 anos, surgem depois de, em Julho, os focos de incêndio na Amazónia terem já sido os mais elevados nas últimas duas décadas.
É de salientar que, embora estes dados sejam o indicador mais rápido que se pode ter da quantidade de incêndios na Amazónia, que normalmente atingem o pico entre Agosto e Setembro, não dão indicações sobre a intensidade do fenómeno.
Com muita frequência, os incêndios na floresta naturalmente húmida começam em explorações pecuárias, onde a selva foi convertida em pastagens para a criação de gado.
O ar mais quente e a vegetação mais seca criaram condições para que os incêndios se propaguem mais rapidamente e ardam com maior intensidade e durante mais tempo. A desflorestação também reduziu a capacidade da floresta tropical de produzir chuva e humidade.
Helga Correa, especialista em conservação do WWF-Brasil, disse numa avaliação inicial dos dados de Agosto feita na semana passada que os incêndios foram causados por uma combinação de meteorologia, alterações climáticas e acções humanas.
"A região onde detectámos fumo concentrado em Agosto coincide com o chamado 'arco do desmatamento', que inclui o Norte de Rondónia, o Sul do Amazonas e o Sudoeste do Pará", disse. Estas são as áreas dos estados da Amazónia onde a desflorestação mais tem avançado.
"Isto indica que, para além das alterações climáticas e do El Niño, as mudanças no uso do solo produzidas pelos seres humanos tiveram um papel central no aumento dos incêndios", afirmou Helga Correa.
Dados divulgados no fim de Agosto pela MapBiomas estimam que o Brasil perdeu 33%, ou 281 milhões de hectares, de matas naturais, superfícies de águas e áreas não naturais, como praias e dunas, desde 1500, início da colonização portuguesa. Desse total, 55 milhões de hectares foram destruídos na Amazónia.