Projecto-piloto pode contribuir para “oligopólio da saúde”?

Especialistas consideram que, mesmo que o projecto seja alargado a três ou quatro grandes grupos, partilha de dados vai “minar ainda mais a possibilidade de concorrência”.

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Inicialmente, Governo admitiu fazer partilha de dados apenas com o grupo CUF Rui Gaudêncio
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Na sua versão inicial, o projecto-piloto de partilha de dados de utentes com o Serviço Nacional de Saúde abrangia apenas o grupo CUF e os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) só admitiram o seu alargamento a outros grupos de saúde privados depois de estes terem manifestado o seu descontentamento face ao que consideraram ser uma situação de concorrência desleal. E os investigadores ouvidos pelo PÚBLICO concordam: avançar com o projecto-piloto do Registo de Saúde Electrónico apenas com um actor privado dar-lhe-ia uma enorme “vantagem competitiva”.

Isto apesar de, como considera o economista Julian Perelman, o risco não desaparecer se o projecto ficar nas mãos “de três ou quatro grandes grupos”. “Impede completamente outros grupos de emergir, porque eles vão ficar com uma vantagem enorme.”

“O oligopólio já existe”, considera o investigador. “A saúde privada em Portugal já é detida por três ou quatro grandes grupos. O grupo Luz, os Lusíadas e o grupo CUF. Depois o grupo Trofa-Saúde, de menor dimensão.”

“Eu não vou a uma clínica pequenina que não vai saber nada de mim se sei que posso ir à CUF, à Luz, aos Lusíadas, onde sei que toda a minha informação vai estar acessível. Portanto, vamos minar ainda mais a possibilidade de concorrência”, acrescenta o professor universitário.

Henrique Martins concorda que, se a escolha do grupo CUF foi feita sem convidar os restantes actores privados, “não é ilegal, mas não é a melhor maneira de estimular o ecossistema, porque o objectivo desse piloto não é provar que a CUF é capaz”.

Ainda assim, o antigo presidente da SPMS considera que “um piloto não tem de envolver toda a gente”. Caso haja vários interessados, é necessário definir critérios para seleccionar candidatos.

Um dos critérios pode ser o chamado “first come, first served”. “Fazemos o piloto com a instituição que mandar o email primeiro”, exemplifica o investigador.

“Ou posso dizer, vamos fazer com duas das entidades que estejam com um nível de maturidade mais elevado.” Nesse caso, é necessário definir critérios de maturidade, como, por exemplo, “já ter uma app com utilização de pelo menos 50% dos seus doentes”, ou “já utilizar standards internacionais para comunicar”.

Nesse caso, as instituições que ficarem de fora “ficam a saber que vão ter de se preparar naquele sentido”.

Luísa Álvares salienta que a selecção dos candidatos para o projecto-piloto é uma escolha política e lembra que “a falta de regulamentação adequada é responsabilidade do Parlamento”.

“A lei da concorrência prevê no seu artigo 6.º o escrutínio pela Assembleia da República, mais especificamente, que a ‘AR realizará, pelo menos uma vez em cada sessão legislativa, um debate em plenário sobre a política de concorrência’. Dificilmente se encontra matéria mais importante sobre distorções à concorrência do que no mercado da saúde”, remata a farmacêutica, responsável de avaliação económica de tecnologias de saúde.

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