Margem Sul arrisca não ter urgências de obstetrícia entre esta sexta-feira e quarta-feira

Serviço do Hospital do Barreiro fecha a partir das 8h00 de sexta-feira, juntando-se aos encerramentos de Setúbal e de Almada. Direcção Executiva do SNS procura solução.

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Dificuldades para cumprir as escalas estão a levar ao encerramento de várias urgências de obstetrícia Rui Gaudêncio
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A urgência de obstetrícia e ginecologia do Hospital de Nossa Senhora do Rosário, no Barreiro – a única que tem estado a funcionar na Margem Sul do Tejo nos últimos dias –, vai fechar a partir das 8h00 desta sexta-feira, juntando-se à do Hospital Garcia de Orta (Almada) e à do Hospital de Setúbal, o que significa que poderá não haver qualquer urgência de obstetrícia a funcionar na região no fim-de-semana e início da semana.

De acordo com as escalas das urgências disponíveis à data de hoje no site do SNS, às urgências de obstetrícia e ginecologia dos hospitais Garcia de Orta (Almada) e do Hospital de São Bernardo, em Setúbal, que já estavam fechadas toda a semana, junta-se, a partir das 8h00 de sexta-feira, o encerramento da urgência de obstetrícia do Hospital do Barreiro, que já no fim-de-semana passado esteve bastante sobrecarregada. A urgência de pediatria do Barreiro também estará encerrada.

Neste fim-de-semana, deveria ser o Hospital Garcia de Orta a garantir a assistência às grávidas da margem Sul, alternando com o Hospital do Barreiro, que esteve aberto no fim-de-semana anterior, se fosse seguido o esquema rotativo definido pela Direcção Executiva do SNS para os meses de Junho e Julho. Mas o PÚBLICO não conseguiu apurar se a Direcção Executiva do SNS, agora liderada por António Gandra de Almeida, definiu um plano para o funcionamento em rede durante o mês de Agosto.

Questionado sobre esta matéria, o Ministério da Saúde garantiu que “a Direcção Executiva do SNS está a trabalhar no assunto para se encontrar uma solução”, sem especificar quais são as soluções em cima da mesa.

As grávidas devem ligar sempre para o SNS24 (808 24 24 24) antes de se dirigirem a um serviço de urgência.

O problema é o mesmo de sempre: não há médicos especialistas em número suficiente para garantir as escalas dos turnos de urgência. A Ordem dos Médicos definiu um número mínimo de profissionais para estas escalas num regulamento de 2022 que ainda está em vigor.

Apesar de os anteriores ministros da Saúde e o ex-director executivo do SNS terem tentado negociar com a OM a redução deste número, as regras ainda em vigor determinam que, para permanecer aberta, uma urgência de obstetrícia tem que ter uma equipa mínima que, num caso como a da Maternidade Alfredo da Costa - que realizou em 2023 mais de 3500 partos anuais - é de cinco a seis especialistas em presença física em cada turno.

Uma exigência que se torna quase impossível de cumprir em hospitais de menor dimensão, sobretudo durante os períodos de férias. Assim, por vezes basta que um médico falte para que uma maternidade seja obrigada a fechar as portas ao exterior, caso não consiga contratar um prestador de serviços (tarefeiro) que complete a equipa.

As escalas disponíveis no Portal do SNS mostram que a urgência de obstetrícia do Barreiro (tal como as restantes da margem Sul) irá estar fechada pelo menos até dia 14, quarta-feira, obrigando a que todas as situações de urgência sejam transferidas. Em Lisboa também há vários serviços encerrados no mesmo período, como o São Francisco Xavier e o Hospital de Vila Franca de Xira.

Adivinha-se um novo fim-de-semana e início de semana complicado para a Maternidade Alfredo da Costa (MAC), em Lisboa, que já no fim-de-semana passado teve um grande acréscimo de procura face aos encerramentos de vários serviços na região, tendo duplicado o número de partos.

Caldas e Leiria fechadas em simultâneo

Mas a área metropolitana de Lisboa não é a única com problemas este Verão. Na Região Oeste, o encerramento da maternidade do Hospital de Leiria durante duas semanas, até ao próximo dia 19, obrigou já a encaminhar alguns partos programados para o Porto, a cerca de 200 quilómetros de distância. Várias grávidas têm também sido enviadas para a Unidade Local de saúde de Coimbra, a quase 80 quilómetros de distância.

O problema é que, além do Hospital de Leiria, também a urgência de obstetrícia do hospital das Caldas da Rainha (a que fica mais próxima de Leiria) tem estado fechada e vai continuar encerrada durante alguns dias, deixando esta vasta região a descoberto, o que acontece pela primeira vez. Esta quinta-feira, a urgência de obstetrícia das Caldas está encerrada, e está de novo encerrada esta sexta-feira (dia 9) e na segunda-feira (dia 12), segundo a informação disponível no Portal do SNS.

Na segunda-feira passada, uma mulher com hemorragias após sofrer um aborto espontâneo terá visto negada a assistência no hospital de Caldas da Rainha, cuja urgência obstétrica estava encerrada, e apenas terá sido atendida após insistência do CODU e dos bombeiros. O caso motivou a abertura de dois inquéritos, um pela Entidade Reguladora da Saúde e outro pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS).

​Segundo informação disponibilizada esta quinta-feira pela Direcção-Executiva do SNS, o protocolo com o Centro Materno Infantil do Norte (CMIN), no Porto, mantém-se e ali já nasceram oito bebés de mães encaminhadas pela ULS da Região de Leiria e estão previstos mais três partos para o dia de hoje.

"O planeamento entre a ULS Região de Leiria e o CMIN tem decorrido dentro do programado e com toda a normalidade. Após a diligência da DE-SNS junto da ULS de Coimbra foi possível dar resposta às restantes utentes de Leiria com partos programados, além desta ULS estar a garantir as urgências de ginecologia e de obstetrícia das utentes da área de influência de Leiria. Será dado a escolher à grávida as duas alternativas, ou o CMIN ou a ULS de Coimbra, sendo o transporte acautelado pela ULS da Região de Leiria.

Médicos do Norte foram para Sul

No Verão passado, a Direcção Executiva do SNS conseguiu tapar alguns buracos das escalas de diversas maternidades na região de Lisboa e Vale do Tejo e do Algarve convencendo médicos da região Norte - Guimarães, Porto, Matosinhos - a fazer urgências a mais de 300 quilómetros de distância, recorda Francisco Goiana da Silva, da equipa da anterior DE-SNS. E as urgências de obstetrícia dos hospitais de Leiria e das Caldas da Rainha nunca estiveram encerradas em simultâneo, sublinha.

Esta quinta-feira, a secretária de Estado da Saúde, Ana Povo, respondeu às críticas dos partidos da oposição - que questionaram os "erros" nos mapas semanais das escalas das urgências -, argumentando que "ultimamente" tal "não tem acontecido". Ana Povo defendeu, na CNNPortugal, que esta estratégia visa "garantir que não aconteça o que aconteceu no passado, que é grávidas em ambulâncias a circularem de urgência a urgência, até encontrarem uma que esteja aberta".

A governante admitiu também que, apesar de o Governo estar "consciente das dificuldades que o sector [da saúde] vivia" quando assumiu funções, acabou por constatar agora que estas "são maiores do que as esperadas".

Texto actualizado às 21.12 horas com informação da Direcção Executiva sobre o facto de a ULS de Coimbra ir receber grávidas de Leiria

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