Guerra em Gaza ameaça mosteiro com mais de 1600 anos que é património mundial
UNESCO inscreveu o Mosteiro de Santo Hilário em duas das suas listas e ao mesmo tempo, como é habitual em situações de conflito: na do património da humanidade e na dos bens em risco.
É um dos locais mais antigos do Médio Oriente, com a particularidade de ter sido a casa da primeira comunidade monástica da Terra Santa, um pequeno grande pormenor que terá contribuído de forma decisiva para a sua classificação como património da humanidade.
A integração do Mosteiro de Santo Hilário, na Faixa de Gaza, nesta lista de excelência da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO, na sigla em inglês que naturalmente se generalizou) foi feita na sexta-feira, na reunião anual do Comité do Património Mundial, desta vez em Nova Deli, Índia.
Atendendo à guerra na região, este comité recorreu ao procedimento de inscrição de emergência previsto na Convenção do Património Mundial, explica a UNESCO no comunicado em que dá conta da classificação deste mosteiro do século IV, e colocou-o de imediato na lista de bens em perigo, uma medida habitual em casos de conflito.
“A inscrição na Lista do Património Mundial em Perigo abre automaticamente a porta a mecanismos internacionais reforçados de assistência técnica e financeira para garantir a protecção do bem e, se necessário, facilitar a sua reabilitação”, pode ler-se no mesmo documento.
O mosteiro está integrado no sítio arqueológico de Tell Umm Amer, no campo de refugiados de Nuseirat, menos de dez quilómetros a sul da cidade de Gaza.
O sítio foi localizado em 1999 e tem vindo a ser escavado com maior intensidade desde 2013. Pelos artefactos encontrados e pelas estruturas postas a descoberto até hoje, os arqueólogos acreditam que terá sido ocupado com comunidades cristãs entre os séculos IV e VIII. O Mosteiro de Santo Hilário é a mais importante das suas construções, mas na área também foram identificados outros claustros, uma igreja e até um complexo de banhos e habitações, este último, estimam, para uso dos peregrinos que ali acorriam em busca da protecção do santo.
De acordo com algumas fontes, certamente com muita tradição à mistura, Santo Hilário (291-371) viveu no mosteiro que terá começado a ser construído por volta de 340, já este cidadão nascido a sul de Gaza numa família pagã tinha muitos seguidores.
“Situado no cruzamento das principais rotas de comércio e intercâmbio entre a Ásia e a África, era um centro de trocas religiosas, culturais e económicas, ilustrando a prosperidade dos locais monásticos do deserto no período bizantino”, diz ainda a UNESCO no comunicado já citado, dando conta da singularidade do mosteiro dedicado a este santo anacoreta que é venerado pelas igrejas ortodoxa e católica de Roma, depois de ter vivido mais de 20 anos isolado, dedicado a Deus e à contemplação, e de lhe terem sido atribuídos vários milagres.
Apesar da inscrição urgente na lista do património mundial – o Mosteiro de Santo Hilário é o quinto monumento localizado na Palestina e o terceiro a entrar como bem em risco –, e por causa da guerra que opõe Israel ao Hamas, a UNESCO não teve ainda condições para enviar os seus técnicos ao terreno para confirmar o estado da estrutura com mais de 1600 anos.
“[Colocá-lo na lista dos bens em risco] é o único recurso para proteger o local da destruição no contexto actual”, disse Lazare Eloundou Assomo, director do Centro do Património Mundial da UNESCO à AFP, referindo-se à guerra desencadeada pelo ataque do Hamas a Israel a 7 de Outubro.
Em Dezembro do ano passado, o Comité Intergovernamental da UNESCO para a Protecção dos Bens Culturais em Caso de Conflito Armado tinha já decidido conceder uma “protecção reforçada provisória” ao mosteiro agora classificado, uma casa religiosa que foi praticamente destruída no ano de 614.