Encargos com habitação ultrapassam 40% do rendimento dos mais pobres
Dados recolhidos por Portugal, Balanço Social descrevem ainda que as desigualdades e privação material são mais prevalentes nas Regiões Autónomas. Mas pobreza também cresceu em Lisboa
Para muitas famílias, os encargos com habitação excedem 40% do seu rendimento. Esta é a realidade para um pouco mais de um terço dos agregados pobres no país, de acordo com os dados recolhidos pelo relatório Portugal, Balanço Social, fruto da Iniciativa para a Equidade, uma parceria entre a Fundação ”la Caixa”, a Nova SBE e o BPI. Entre aqueles que são definidos como não pobres, a percentagem dos que têm mensalmente um encargo tão elevado cai para apenas 6,6%. “A população pobre tem carências habitacionais bastante marcadas”, conclui-se.
Existem ainda mais desafios no que concerne à habitação. Entre 2021 e 2022, aumentou a percentagem da população pobre sem capacidade para aquecer a casa – com destaque para as pessoas mais velhas (23,6%). Quase um quarto dos idosos vive em alojamentos com telhado, paredes, janelas e chão permeáveis a água, e 1% não tem instalações de banho ou duche no interior. Apenas 3% vivem em situações de sobrelotação, mas esta percentagem sobre para 16% no caso das crianças.
Segundo Portugal, Balanço Social, que está disponível para consulta, “em 2022, 20,5% dos agregados familiares pobres viviam em alojamentos sobrelotados (um aumento face a 2021), valor que desce para 7,2% no caso das famílias não pobres.” E mais de um terço tinham casas sem isolamento para a entrada de água ou onde se passava frio.
Houve outras privações que se tornaram mais frequentes neste período, como assegurar capacidade financeira para uma despesa inesperada, comer proteínas em dias alternados, comprar roupa, mas também, para pagar uma semana de férias, substituir móveis usados, adquirir um computador ou ter um encontro social por mês.
Em contraste, não aumentou a percentagem de pessoas com atraso no pagamento da hipoteca ou de contas mensais como água ou electricidade. “Tal sugere que as medidas de mitigação implementadas pelo governo foram suficientes e que as pessoas cortaram noutras despesas, patentes no aumento das restantes dimensões de privação”, referem os autores deste relatório, Susana Peralta, Bruno P. Carvalho e Miguel Fonseca, membros do Nova SBE Economics for Policy Knowledge Center.
Açores com os piores indicadores
Num país de contrastes, em que a privação é cinco vezes mais comum entre os pobres do que os não pobres, Portugal, Balanço Social confirma igualmente a existência de diferenças regionais. “A prevalência da pobreza é maior nas Regiões Autónomas, que também têm mais privação material e social e mais desigualdade do que Portugal continental”, refere este relatório, que está já na sua quarta edição e que pode conhecer na íntegra aqui.
É dada uma atenção especial aos Açores, que detém os piores resultados em vários indicadores de pobreza e desigualdade. São a única região do país onde, entre 2021 e 2022, a taxa de privação material e social severa aumentou (9,8%) – o que significa que, 1 em cada 10 pessoas estavam nesta situação, manifestando carências em itens já descritos como a incapacidade de aquecer adequadamente a casa, pagar a hipoteca, realizar uma refeição de carne ou peixe de dois em dois dias, entre outras.
Com uma média nacional de 5,3%, de acordo com os dados retirados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (ICOR), o Alentejo apresenta a percentagem mais baixa (3,2%). As restantes regiões tinham, em 2022, situações diversas quanto a este indicador: 3,9% no Centro, 5% no Algarve, 5,1% na Área Metropolitana de Lisboa, 6,3% no Norte e 7,8% na Madeira.
O risco de pobreza é também elevado nas regiões autónomas: está presente em mais de 25% da população total. Além dos Açores, apenas em Lisboa se registou um aumento da taxa de pobreza, em 2023. No Continente, é no Algarve que, apesar de uma redução de 2,4 pontos percentuais no mesmo ano, ainda se regista a maior taxa de pobreza (19,7%).