Von der Leyen promete manter o rumo no clima, a natureza fica para depois

A presidente da Comissão Europeia precisava dos votos dos Verdes para ser eleita. Satisfez os mínimos das exigências dos ecologistas, salvando compromisos climáticos mas omitindo a biodiversidade.

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Ursula von der Leyen celebra a reeleição, com o apoio dos Verdes no Parlamento Europeu Johanna Geron/REUTERS
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Ursula von der Leyen fez as contas. Para conseguir um segundo mandato à frente da Comissão Europeia, precisava do apoio dos 53 eurodeputados Verdes. Portanto, acedeu a um mínimo das exigências dos Verdes: focou-se no calendário de redução das emissões de gases com efeito de estufa e prometeu ter um novo Pacto Ecológico Industrial nos primeiros 100 dias do novo mandato. A protecção da natureza, no entanto, não mereceu a mesma atenção.

Os 26 eleitos dos Irmãos de Itália, o partido da primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, não chegariam para lhe garantir os votos necessários para a reeleição. Por isso, Von der Leyen deu-se ao luxo de os desperdiçar: “O nosso apoio tornou-se impossível quando os Verdes oficializaram o voto favorável a [Von der Leyen]”, afirmou Carlo Fidanza, líder do grupo dos Irmãos de Itália no Parlamento Europeu (PE), citado pelo jornal La Repubblica.

Von der Leyen assegurou que vai continuar a defender os objectivos do Pacto Ecológico, declarou. Mantém os objectivos para 2030 e 2050 e propôs uma nova meta vinculativa de redução nas emissões de gases de estufa, nos 27 Estados-membros, de 90% até 2040, tendo como referência 1990. Haverá “um novo foco na implementação e investimento”, para que os países cumpram as reduções com que se comprometeram.

A presidente alemã da Comissão Europeia prometeu ainda apresentar um plano para apoiar os países a adaptarem-se aos efeitos das alterações climáticas – como a seca e os incêndios florestais que afectam países do Sul, como Espanha, Grécia e Portugal.

“O que estamos a fazer hoje é a dar um voto de confiança”, disse, por seu lado, Bas Eickhout, o eurodeputado dos Países Baixos co-presidente do grupo dos Verdes no PE, num comunicado. “Agora, Ursula von der Leyen tem de provar que quer mesmo progredir no Pacto Verde”, frisou.

No entanto, Von der Leyen, que vem do Partido Popular Europeu (PPE), prometeu que o Pacto Ecológico será cumprido “de forma pragmática” – aqui a falar para a sua família política de centro-direita, direita e até a extrema-direita que se tornou aceitável, a de Giorgia Meloni. Neste espectro político, o entusiasmo com as políticas ambientais vai de moderado a nulo.

Por exemplo: a presidente da Comissão garantiu que se manterá a decisão polémica de banir a venda de veículos novos que produzam emissões de gases de estufa a partir de 2035. No entanto, prometeu que será aprovada uma emenda para permitir o uso de combustíveis sintéticos, também chamados e-fuels – algo que satisfaz o PPE, e grandes fabricantes de automóveis, nomeadamente os da Alemanha.

Os e-fuels são produzidos sintetizando as emissões de dióxido de carbono (CO2) capturadas, para obter hidrogénio, o que resulta em electricidade renovável ou isenta de CO2. No entanto, a produção destes combustíveis é muito cara, e exige uma grande quantidade de energia renovável – que poderia ser usada directamente em veículos eléctricos ou outros fins.

Von der Leyen prometeu ainda que os agricultores seriam recompensados por “trabalhar com a natureza, preservar a biodiversidade e os ecossistemas naturais”. Mas não fez qualquer sugestão de condicionar os apoios da Política Agrícola Comum à protecção do ambiente, por exemplo. Nada sobre o uso de pesticidas – a Comissão retirou a sua proposta de legislação para o uso sustentável de pesticidas na agricultura por não haver acordo.

“É um programa ecológico? Não”, disse ao Le Monde Terry Reintke, co-presidente dos Verdes no PE, que ainda assim apoiou a reeleição de Von der Leyen.