Descoberta estátua de deus grego escondida num esgoto romano há mais de 1500 anos

Escultura de Hermes feita no século II terá sido colocada numa conduta de esgoto e coberta de terra depois de um sismo. Numa altura em que o cristianismo era já religião oficial do império romano.

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A estátua em mármore foi descoberta na antiga cidade de Heraclea Sintica, no sudoeste da Bulgária Spasiyana Sergieva/Reuters
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Não é todos os dias que se encontra uma escultura de dois metros de um deus grego quase intacta, caso ainda mais raro no contexto de uma escavação num velho esgoto romano.

A divindade representada é Hermes, filho de Zeus associado à prosperidade e ao comércio, e a estátua em mármore descoberta recentemente na antiga cidade de Heraclea Sintica, no sudoeste da Bulgária, tem dois metros de altura e está bem preservada. Não lhe falta, sequer, a cabeça, um dos primeiros elementos a desaparecerem quando os sítios arqueológicos são saqueados.

Segundo a agência de notícias Reuters, a equipa búlgara responsável pelas escavações neste sítio junto da fronteira com a Grécia atribui o bom estado de conservação da escultura à forma como foi protegida há mais de 1500 anos.

Depois de nos anos de 388 e de 425 dois terramotos terem destruído boa parte de Heraclea Sintica, uma cidade em franco crescimento, a escultura terá sido guardada num dos seus esgotos e coberta de terra, e o cuidado dedicado ao seu acondicionamento explica por que razão chegou até nós praticamente completa, explicou à Reuters Lyudmil Vagalinski, que lidera a equipa responsável pela escavação.

A escultura, uma cópia romana de um original grego, não foi destruída, explicam os arqueólogos, porque a população a terá escondido para a preservar, depois de o cristianismo ter sido adoptado como religião oficial do império romano.

“Tudo o que era pagão era proibido e os habitantes aderiram à nova ideologia, mas, aparentemente, cuidaram das suas antigas divindades”, disse Lyudmil Vagalinski, do Museu Nacional de Arqueologia búlgaro, lembrando que depois dos terramotos a cidade fundada pelo rei Filipe II da Macedónia entre 356 e 339 a.C. foi perdendo importância, até ser definitivamente abandonada por volta do ano 500.

De acordo com algumas das fontes (outras falam nos anos 50), as ruínas desta cidade só foram localizadas em 2002, depois de os arqueólogos terem descoberto uma inscrição em latim que testemunha uma troca de correspondência de um imperador romano.

A estrutura de saneamento onde esta estátua foi encontrada começou a ser posta a descoberto há já seis anos. Foi na tentativa de avaliar o seu estado de conservação que os arqueólogos se depararam agora com a escultura de Hermes, começando por destapar-lhe um pé.

“Encontrámo-la por acaso”, contou Vagalinski ao diário norte-americano The New York Times. “Foi espantoso. [Gradualmente], uma estátua inteira foi aparecendo à nossa frente”, disse este arqueólogo que acredita que a escultura feita a partir de um bloco único de mármore foi escondida na sequência do sismo de 388.

“Ainda temos muito trabalho a fazer e não quero tirar conclusões precipitadas, mas a partir de agora posso dizer que esta antiga escultura não só é a mais bem preservada das que foram descobertas aqui, como também em todo o território da Bulgária”, acrescentou o director da escavação em declarações à publicação científica Archaeologia Bulgarica.

A escultura não tem parte do braço direito e a sua mão esquerda também pode estar danificada, mas, de resto, parece praticamente intacta. Será agora alvo de trabalhos de conservação e restauro e mais tarde exposta no Museu de História de Petrich, a cidade contemporânea mais próxima da velha Heraclea Sintica.

“Estas cópias romanas de modelos gregos antigos podem ser vistas em Atenas e no norte da Grécia, bem como no Museu do Louvre, mas são raras”, disse ainda Lyudmil Vagalinski, desta feita à agência France-Presse, salientando também a sua “elevadíssima qualidade” artística.

Os especialistas esperam agora que a descoberta desta escultura possa trazer novas pistas sobre esta cidade fundada no sopé da montanha vulcânica de Kozhuh, perto da fronteira da Bulgária com a Grécia e a Macedónia do Norte.

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