Total de crédito à habitação renegociado aumentou 300% em 2023

Valor das amortizações antecipadas cresceu 64,6%, ao passo que os novos empréstimos para compra de casa caíram nos primeiros três trimestres do ano passado. Opção por taxa mista disparou.

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Um número elevado de famílias teve necessidade de renegociar empréstimos da casa no ano passado Rui Gaudêncio
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O orçamento de um grande número de famílias não conseguiu acomodar o aumento de encargos do crédito à habitação, decorrente da subida de taxas Euribor, tendo tido necessidade de renegociar as condições dos contratos. No último ano, foram realizadas 154.071 renegociações, envolvendo 144.930 contratos de crédito à habitação, no montante total renegociado de cerca de 17 mil milhões de euros, segundo dados divulgados esta quinta-feira pelo Banco de Portugal (BdP).

Face a 2022, o número de renegociações cresceu uns impressionantes 271,6%, e o montante renegociado representou um aumento de 300,8%, informação que consta do Relatório de Acompanhamento dos Mercados de Crédito, relativo a 2023.

Apesar da grandeza dos números, o BdP destaca que “na generalidade dos contratos renegociados (89,9%) os mutuários não se encontravam em situação de incumprimento, à semelhança do que se observou em 2022 (83,8%)”. E ainda que, “face à pressão da subida das prestações, os mutuários terão também sido mais proactivos na renegociação dos seus contratos de crédito com as instituições, com o objectivo de obter condições financeiras mais favoráveis”.

A ajudar à decisão das famílias terá estado o facto de “a suspensão da comissão de reembolso antecipado poder igualmente ter contribuído para facilitar a renegociação dos contratos”, suspensão que termina, se não houver alterações, no final do corrente ano.

O que também subiu muito foram os reembolsos de crédito à habitação. "O número de reembolsos antecipados subiu 74,4% em relação a 2022 e o montante total amortizado cresceu 64,6%”, revela o relatório, dando conta de que foram realizados 247.601 reembolsos antecipados (parciais ou totais), com um montante global de 11,2 mil milhões de euros.

Novo crédito diminui

Em diminuição esteve a concessão de novo crédito para a compra de habitação, embora em recuperação no último trimestre, altura em que as taxas de juro deram sinais de inversão de tendência, apesar do forte domínio das taxas mistas (período inicial de taxa fixa, passando a variável, ou associada às Euribor).

Em 2023, foram celebrados, em média, 8358 contratos de crédito à habitação por mês, menos 14,4% que no ano anterior, e com um montante global de 1131 milhões de euros, menos 13,9% face ao mesmo período.

O número de novos contratos de crédito à habitação e o montante inicial concedido diminuíram, respectivamente, 14,4% e 13,9% em relação a 2022.

Isolando os dados do quarto trimestre do ano, o número e o montante dos novos contratos aumentaram relativamente ao mesmo período no ano anterior, respectivamente, 15,9% e 16,2%, o que em parte é explicado pela entrada em vigor, nesse período,"das novas regras macroprudenciais que alteraram os critérios para a ponderação do impacto, na solvabilidade dos consumidores, de aumentos do indexante dos contratos de crédito a taxa de juro variável ou mista". Tratou-se, na prática, de aliviar os critérios da taxa de esforço (peso dos encargos com crédito no orçamento das famílias).

O montante médio por contrato manteve-se relativamente estável (136.958 euros, em 2023, e 136.143 euros, em 2022).

Positiva foi a redução, pelo terceiro ano consecutivo, do prazo médio dos novos contratos de crédito à habitação, que passou de 31,8 anos em 2022 para 30,6 anos em 2023, embora, em sentido contrário, se tenha verificado que o prazo médio dos contratos em carteira aumentou ligeiramente, de 33,6 para 33,7 anos, o que pode ser explicado pelas renegociações de contratos.

Taxa mista dispara

Ainda relativamente aos novos contratos com taxa variável verificou-se uma redução ligeira do spread (ou margem comercial do banco) para 0,93% (1,09% em 2022), mas este tipo de contratos diminuiu drasticamente, passando a representar 42,6% dos contratos celebrados, contra 80,8% em 2022, e 41,5% do montante concedido (79,3% no ano anterior).

Em contrapartida, o peso dos novos contratos de crédito à habitação celebrados a taxa mista aumentou de 12,3%, em 2022, para 45% em 2023, e de taxa fixa passou de 6,9% para 12,4%.

Contudo, “no final do ano, a maioria dos contratos na carteira das instituições continuava a ser à taxa variável (86,2% dos contratos e 79,1% do saldo em dívida)”, de acordo com o relatório.

Considerando a carteira total de crédito à habitação existente no final do ano passado, que ascendia a 1,35 milhões de contratos, com um saldo em dívida de 98,7 mil milhões de euros, verificou-se uma queda de 9,5% e 2,2% respectivamente, face a 2022.

Crédito ao consumo desacelera

O montante de crédito aos consumidores ascendeu a 632,7 milhões de euros, um número que corresponde a um crescimento de 0,8% no ano passado, muito abaixo dos aumentos de 15,6% e 11,6% verificados em 2022 e 2021, respectivamente.

A taxa de juro deste crédito voltou a aumentar em 2023, “no contexto da subida das taxas de juro de referência do mercado”, lê-se no relatório, com a Taxa Anual de Encargos Efectiva Global (TAEG) média a situar-se nos 12,4% no quarto trimestre de 2023, um aumento de 1,4 pontos percentuais em relação ao período homólogo. O aumento do custo do crédito foi transversal aos três segmentos de crédito (pessoal, automóvel e revolving).

Em montante, verificou-se um crescimento de 7,4% no crédito automóvel e 4% no crédito revolving (cartões de crédito e outros descobertos bancários), e uma redução de 5% no crédito pessoal (tinha aumentado 25,7% no ano anterior).

O montante de crédito concedido através de intermediários de crédito, muitos deles a actuar no ponto de venda, voltou a crescer no ano passado, representando 45,2% do total (43,9% em 2022). “Para este aumento contribuiu o acréscimo da importância dos intermediários no crédito revolving e o aumento do peso do crédito automóvel, segmento em que a maioria do montante de crédito é concedida através deste canal de comercialização”, revela o estudo.

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