Faye, a complicada história de Faye Dunaway
Realizado por Laurent Bouzereau, um documentário sobre Faye Dunaway, a lendária actriz com uma reputação pouco pacífica, estreia-se no domingo na Max.
Faye Dunaway é uma mulher complicada. É isso que a reputação da actriz de Bonnie & Clyde, Chinatown e vários outros filmes diz. Faye é um retrato da lenda de Hollywood, mais especificamente da Nova Hollywood, hoje com 83 anos, feito pelo realizador franco-americano Laurent Bouzereau, com a plena aprovação dela. Aborda muito essa percepção da artista difícil ao longo da sua hora e meia. Nunca foge disso. Vemos o ícone Bette Davis no talk show de Johnny Carson a afirmar que Dunaway era a pior pessoa em Hollywood. O documentário da HBO, que se estreia no domingo através do serviço de streaming Max, explora várias justificações – "continuo a ser responsável pelas minhas acções", afirma, ainda assim. Há, por exemplo, o diagnóstico tardio de bipolaridade, as depressões, a entrega total ao trabalho e ao rigor com que faz tudo. Mas também, como questiona James Gray, que a dirigiu no ano 2000 em Nas Teias da Corrupção (The Yards), será que se faria tanto alarido disso caso Dunaway fosse um homem?
O documentário começa, na onda de "está a filmar?", no apartamento nova-iorquino da actriz, a 29 de Março de 2021. Ela está sentada no sofá – "o pior assento do mundo", diz depois – e o realizador mostra-lhe uma famosa fotografia tirada por Terry O'Neill, com quem Dunaway foi depois casada, exactamente 45 anos antes. Ao nascer do dia, na manhã após ter ganhado o Óscar de melhor actriz por Escândalo na TV (Network), de Sidney Lumet, sentada numa cadeira em frente à piscina do Beverly Hills Hotel, em frente a vários jornais que noticiam o sucedido – e o prémio póstumo para Peter Finch, que tinha morrido meses antes – espalhados por todo o lado. Ao lado dela, uma mesa com jornais, a própria estatueta e uma bandeja com bebidas de pequeno-almoço. Foi uma série de fotografias sob a ideia, afirma ela, de "é só isto?".
Depois vemos algumas das "cabeças falantes" que farão parte do filme a apresentarem a actriz. Começa por Mark Harris, jornalista e autor de Five Came Back, cuja adaptação em série foi feita por Bouzereau, ou de uma biografia de Mike Nichols, Sharon Stone, actriz e amiga de Dunaway, o jornalista britânico Robin Morgan, amigo e catalogador da obra de Terry O'Neill, o actor Mickey Rourke, que contracenou com a protagonista em Barfly – Amor Marginal, de Barbet Schroeder, o filho Liam Dunaway O'Neill, que fala de como a mãe guarda as emoções e depois as deixa sair quando representa, e mais tarde vê fotografias antigas com ela, ou Annette Insdorf, professora universitária de cinema. Há ainda mais gente depois, como as actrizes Mara Hobel, que não tem muito de bom a dizer de ter trabalhado com Dunaway, que fazia de Joan Crawford em Querida Mãezinha (Mommie Dearest), de Frank Perry, e Rutanya Alda, o assistente de realização tornado produtor Hawk Koch, ou a jornalista e crítica Julie Salamon, o realizador Jerry Schatzberg, que ela trocou por Marcello Mastroianni ("Digo sempre, se vou perder alguém, que seja para Marcello Mastroianni", afirma ele), entre outros. Há ainda imagens de arquivo de pessoas que já desapareceram ou não são facilmente acessíveis e de entrevistas antigas dela e de outros.
Sobre a reputação de Dunaway, Morgan explica que adjectivos como "volátil, difícil, temperamental" são verdadeiros, mas devem vir seguidos de "meticulosa, profundamente preocupada, com um olho e temperamento para o detalhe". "Tem de se olhar mais a fundo para a artista", continua. Bouzereau mostra-nos a própria a ter cuidado com a forma como vai ser filmada e toda a preparação que é preciso para estar em frente à câmara. Justifica-se: "É o trabalho, exige o que exigir." Às vezes, há pormenores que falham e fica-se "nervoso e frenético", há tensão. Não é fácil, conta-nos.
O filme mostra as origens de Dunaway, que nasceu Dorothy Faye Dunaway a 14 de Janeiro de 1941 na Florida. A actriz sublinha a diferença entre Faye Dunaway, a estrela, uma persona, "alguém que eu talvez tenha criado", como descreve, e Dorothy Faye, "a menina do Sul" que ela já não é "há muito tempo". Ainda assim, afirma que ainda é uma "parte profunda" dela.
O documentário não explora muito esta ideia, apesar de voltar a ela no fim. O filme atravessa os começos no teatro com Elia Kazan, a chegada a Hollywood, a transformação em ícone de moda, os maravilhosos, para ela, anos 1970 – "uma mina de ouro" –, onde estão alguns dos seus filmes mais significativos, e os altos e baixos – e muitos estes últimos – das décadas seguintes, a viragem para a televisão e a produção e os papéis a secarem à medida que os anos avançavam.