Milei já despediu cerca de 30 mil funcionários públicos e quer chegar aos 75 mil

Políticas de género são as mais afectadas pelo desmantelamento dos serviços do Estado num país onde a violência sobre as mulheres não dá tréguas.

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Desde que tomou posse, em Dezembro, Javier Milei tem apostado na redução do Estado AGUSTIN MARCARIAN / REUTERS
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Javier Milei, o Presidente auto-intitulado “anarcocapitalista” da Argentina, está a cumprir a passos largos a promessa de despedir 75 mil funcionários públicos que fez no início de Junho, no 10.º Fórum Empresarial Latino-Americano, em Buenos Aires. Aos 25 mil postos de trabalho que já tinha extinguido nessa altura somam-se agora cerca de 5000 despedimentos, nas estimativas do sindicato dos trabalhadores do Estado ATE.

A maioria dos despedimentos está a acontecer nas áreas sociais, relacionadas com as políticas de género, mas também na saúde e nas universidades, acelerando o desmantelamento do Estado social que prometeu. Javier Milei acredita que o Estado é "uma associação criminosa" que ele quer reduzir ao mínimo.

Num país onde morre uma mulher a cada 35 horas vítima de violência doméstica, o orçamento destinado à prevenção da violência de género foi reduzido e, em Junho, o Governo extinguiu, de uma vez por todas, o que restava do antigo Ministério das Mulheres, Género e Diversidade, responsável pelas políticas públicas específicas para combater este problema.

“Do total de 1100 funcionários [daquele ministério] que encontrámos em 10 de Dezembro, 85% já foram eliminados”, confirmou o porta-voz presidencial Manuel Adorni em conferência de imprensa na segunda-feira. “Nesta Administração não há espaço para gastos supérfluos com o dinheiro dos contribuintes”, disse, citado pelo El País Argentina.

Já na campanha eleitoral Javier Milei tinha prometido acabar com o ministério promotor das políticas de igualdade de género, afirmando: "Não se trata de um direito, trata-se de privilégios (...) O que é preciso garantir é a igualdade perante a lei."

Algumas políticas de género foram totalmente interrompidas, enquanto outros programas foram reduzidos ao mínimo. Entre estes últimos está a linha telefónica 144 para atendimento a vítimas de violência de género, que funcionava sem interrupções, ou o programa Acompañar, que dava ajuda financeira a mulheres sem recursos para que pudessem abandonar a casa que partilhavam com o agressor.

Em Fevereiro, o Governo ordenou o fecho do Instituto Nacional contra a Discriminação, a Xenofobia e o Racismo. Em Maio, o porta-voz da Presidência respondeu, assim, a uma pergunta sobre o ataque mortal a quatro mulheres lésbicas em Barracas: “Não gosto de o definir como um ataque a um determinado grupo, a um colectivo. É errado, é terrível, repudiável, seja contra quem for”.

Quando Milei assumiu a presidência da Argentina, em Dezembro, a máquina pública tinha 341.477 funcionários, na sua maioria contratado a prazo. A sua política foi começar por reduzir o prazo dos contratos para três meses, não os renovando depois disso. Em consequência, o desemprego disparou: no primeiro trimestre do ano, aumentou dois pontos, para 7,7%, de acordo com os últimos dados oficiais, e o valor continuou a aumentar desde então.

Os despedimentos e subfinanciamento afectam também particularmente a saúde e o ensino superior. Em Abril, cerca de meio milhão de pessoas encheram as ruas de Buenos Aires em protesto contra as políticas de austeridade impostas pelo Governo. As manifestações tinham sido convocadas pelas organizações que congregam as universidades argentinas, sindicatos e associações estudantis, unidas na denúncia do desinvestimento nas instituições de ensino superior no país, mas depressa se tornaram uma contestação global às políticas de Milei.

“Sabíamos que o programa ia gerar tensão social. Reduzir a quantidade de ministérios a metade não foi grátis”, afirmou no Fórum Empresarial Latino-Americano em Junho. De lá para cá, conseguiu ver aprovada uma abrangente reforma do Estado e de medidas de desregulação da economia, debaixo de fortes protestos nas ruas de Buenos Aires.

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