“Nem mais um cêntimo”: ultimato do primeiro-ministro causa revolta dos polícias nas redes sociais
Depois de ministra ter convocado sindicatos para retomar negociações, o facto de Montenegro vir dizer que não iria dar “nem mais um cêntimo” ameaça reacender a animosidade dos agentes e militares.
O primeiro-ministro, Luís Montenegro, afirmou nesta terça-feira que o Governo não vai pôr "nem mais um cêntimo" na proposta para as forças de segurança, dizendo que já fez "um esforço medonho" e não está disponível para "trazer de volta a instabilidade financeira". Estas afirmações foram feitas depois de ontem, no final do dia, a ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, ter convocado os sindicatos para uma nova reunião no dia 9 de Julho, no que pareceu uma tentativa de arrefecimento dos ânimos em vésperas da convocatória do Chega para a comparência dos agentes no Parlamento, por ocasião das votações previstas para o dia 4, quinta-feira.
A reacção às palavras do primeiro-ministro foi automática. Na rede social Telegram apareceu logo um cartaz com a imagem do governante e a frase: "Governo não vai colocar 'nem mais um cêntimo' na proposta para as Forças de Segurança." Por baixo: "Vamos continuar a aceitar o destrate? Já chega de sermos o parente pobre da função pública! Dia 4 às 15 horas, todos ao Parlamento! Necessitam mais de nós do que imaginam." E rapidamente também começaram a ser postas em causa as estruturas sindicais: "O que vai fazer a plataforma de sindicatos no próximo dia 9 de Julho? Ainda gozam!"
Para os sindicatos, a nova convocatória da ministra renovou a esperança de que houvesse a possibilidade real de chegar a um consenso quanto a um valor para o suplemento de risco dos polícias. De recordar que as negociações entre o Governo e os sindicatos da PSP e associações da GNR sobre esta matéria permanecem, ao fim de três meses, sem acordo. Isto depois de o MAI ter proposto um aumento de 300 euros, valor que seria pago de forma faseada até 2026, passando o suplemento fixo dos actuais 100 para 400 euros, além de se manter a vertente variável de 20% do ordenado base. Ou seja, 200 euros mensais seriam pagos já a partir deste dia 1 de Julho, um segundo aumento, de 50 euros, ficaria remetido para 1 de Janeiro de 2025 e um terceiro aumento, do mesmo montante, para Janeiro de 2026.
A plataforma de sindicatos da PSP e da GNR, por sua vez, propõe um aumento de 400 euros pago em três vezes (200 euros este ano, 100 euros em 2025 e outros 100 em 2026). De referir que há sindicatos, como o Sindicato Nacional da Polícia (Sinapol), que se demarcaram desta proposta e exigem um suplemento de missão igual ao da PJ (600 euros), com termos ainda apresentar.
No entanto, as palavras de Luís Montenegro deixam antever que Margarida Blasco não leva para a mesa das negociações mais dinheiro. O primeiro-ministro disse que "convém lembrar que 300 euros mensais vezes 14 remunerações são 4200 euros anuais" e que tal representa "quase quatro vencimentos a mais" para os profissionais da PSP e GNR que ganham menos e "um a 1,5 vencimento a mais" para os que estão no topo da carreira. Por isso, adiantou Luís Montenegro, o Governo apenas está disponível para fazer "acertos no acordo, não nos valores".
A marcação da nova reunião também era importante para os sindicatos, sobretudo para tentar acalmar os ânimos dos polícias que têm demonstrado bastante ansiedade e que nas redes admitiram responder positivamente ao apelo do presidente do Chega, André Ventura, para irem "em força" ao Parlamento, no dia 4 de Julho, dia em que serão discutidas propostas como a atribuição do suplemento de missão à PSP e à GNR e a criminalização do incitamento ao ódio contra órgãos de polícia criminal e judiciais.
O apelo de André Ventura não caiu nada bem nos sindicatos. "Não é papel de qualquer líder parlamentar ou partido político – seja ele qual for – mobilizar e instrumentalizar massas sectoriais", disse Bruno Pereira, presidente do Sindicato Nacional dos Oficiais da Polícia e porta-voz da plataforma de sindicatos da PSP e GNR, sublinhando que, no entanto, cada um é livre de participar ou não, isto é, compete a cada um dos agentes decidir se vai ou não ao Parlamento, na quinta-feira.
Com estas declarações do primeiro-ministro, os sindicatos temem que movimentos mais radicais de protestos ganhem força. "Vai contra tudo o que se queria. É mau para a paz que queríamos ter", afirmou Bruno Pereira. "Se o primeiro-ministro diz nem mais um cêntimo, nós só podemos dizer nem menos um cêntimo", avisa, para concluir que "o Governo não quer assumir responsabilidades políticas e está a transferir o ónus para o Parlamento", criticou.