Como lidar com pessoas manipuladoras?

Intencional ou não, a manipulação mina as relações (e as vítimas). Do estabelecimento de limites à ajuda de terceiros, há coisas que podemos fazer para lidar com manipuladores.

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Como lidar com pessoas manipuladoras? tatianazaets/Getty Images

Dizem-nos o que fazer, o que pensar, vitimizam-se e deixam-nos a pensar: estarei a enlouquecer? São assim as pessoas manipuladoras, que podemos encontrar no trabalho, nas amizades ou no amor. As consequências que podem ter em nós são nocivas — e nem sempre nos apercebemos do que está a acontecer.

Há comportamentos que nos ajudam a identificar um manipulador (uma pista: confia no teu instinto) e há também forma de lidar com eles. A psicóloga Edite Queiroz ajuda. Em último recurso, pode ser preciso retirá-los da nossa vida.

O que é a manipulação?

A manipulação é “um estilo de comunicação”, uma forma de interagir com os outros, em que “alguém tenta, seja pelo seu comportamento ou verbalizações, influenciar, controlar, alterar ou condicionar o comportamento ou a forma como outra pessoa pensa”, explica a psicóloga.

Pode haver uma “intenção para benefício” de quem manipula, ou, por vezes, é “simplesmente o estilo com que a pessoa comunica”.

A manipulação pode ser inconsciente?

Sendo a manipulação uma forma de comunicar, pode “depender das nossas características e personalidade”. Assim sendo, “a pessoa pode não ter um propósito concreto quando está a manipular outra” – ou seja, pode não querer exactamente levar outra pessoa a fazer algo ou a pensar de determinada forma, mas ser essa a maneira como se expressa.

A comunicação manipuladora pode inserir-se num estilo de comunicação mais passivo: “A pessoa não comunica explicitamente de uma forma agressiva, mas mistura uma certa agressividade com elementos passivos, o que acaba por induzir na outra pessoa uma certa confusão.”

Por exemplo: verbalizações como: “Se eu fosse a ti, fazia assim. Mas tu é que sabes”; absolutismos do género “És sempre assim” ou chantagem emocional como “Se gostasses mesmo de mim, fazias isto”. São, portanto, “formas indirectas de influenciar a outra pessoa”, sem ser num estilo agressivo directo.

“Todos nós temos estilos mais ou menos prevalecentes, que dependem da experiência, dos factores contextuais, da cultura, mas também da nossa história”, explica Edite Queiroz. E a forma como nós entendemos que “a comunicação é mais ou menos manipuladora depende também da nossa percepção”: “Alguém pode estar a ser extremamente manipulador comigo, mas eu, pelas minhas características e personalidade, posso não entender aquela comunicação como manipuladora.”

Mas a manipulação também pode ter alguma componente psicopatológica. “Seja de uma forma mais leve, do ponto de vista da comunicação, ou seja de uma forma mais patológica, tem sempre um denominador comum: a falta de empatia pelo outro.”

Como identificar um manipulador?

Para dizer que alguém é manipulador é preciso “observar o comportamento da pessoa ao longo do tempo, para perceber se é meramente um estilo de comunicação ou se existe uma intenção por detrás do comportamento”. Só aí, depois de observada uma consistência, é que se pode sinalizar uma red flag.

Quais os comportamentos a prestar atenção? “Pequenas mentiras frequentes, uma atitude permanente de vitimização em que se tenta ganhar a simpatia da outra pessoa, tentar culpar os outros para desviar a atenção da sua própria responsabilidade, ou exercícios de charme, em que a pessoa tenta usar o seu carisma ou simpatia para tentar levar os outros a concordar com ela.”

Se houver uma “discrepância ao longo do tempo entre o que a pessoa diz e o que faz”, é também motivo de alerta. O mesmo para as promessas que nunca são cumpridas, o “ultrapassar consistentemente os limites do outro, tocar em assuntos ou utilizar referências que sabe que são dolorosas para o outro”.

Uma forma eficaz de identificar red flags, que às vezes é ignorada, é a forma como nos sentimos com alguém. “Às vezes vamos para casa e sentimos que estar com uma pessoa é desconfortável, que ela nos provoca ansiedade, desconforto... e às vezes nem sabemos bem porquê”, afiança a psicóloga. Esta sensação deve ser encarada como “um sinal para procurar de forma mais activa” alguns sinais de manipulação. Portanto, há que confiar nos instintos.

Que consequências pode ter?

Apesar de a manipulação poder ocorrer em diferentes contextos, como no trabalho ou em amizades, ouvimos falar comummente dela em relações amorosas. Aqui, e quando já entra em “técnicas mais calculadas”, pode ter um “impacto expressivo na outra pessoa” e “entrar numa dimensão mais abusiva”.

Isto pode fazer com que a vítima se sinta “envergonhada, culpada, com medo, levando-a a questionar-se a si própria, o seu próprio valor e percepção” – aquilo a que vulgarmente chamamos “gaslighting”, um comportamento “complexo, porque é subtil, prolongado no tempo, em que a pessoa vai exercendo o seu poder sobre o outro, de uma forma sub-reptícia, lenta, e a outra pessoa vai também, muitas vezes sem se aperceber, questionando a sua percepção sobre as coisas, a sua memória, a sua sensibilidade”. E esticando limites.

Como lidar?

É importante, em primeiro lugar, ter consciência de que isto é um problema. “Quando alguém sente que a sua auto-estima e confiança estão minadas no contexto de uma relação, é muito importante não desvalorizar esse sentimento”, alerta a psicóloga.

Depois, é preciso “identificar padrões”. Ter atenção aos comportamentos acima descritos e perceber se eles são constantes.

Ter uma rede “com quem se possa confrontar interpretações” também pode ajudar. Confirmar comportamentos e validar percepções pode ser determinante – e, para isso, precisamos de outras pessoas.

Depois, é preciso “haver um reequilíbrio da dinâmica de poder”, porque geralmente, nas relações em que um comunica desta forma manipuladora, tende a ultrapassar os limites do outro. É, por isso, importante “estabelecer limites claros e firmes, expressando o que é aceitável ou não na relação, não tendo medo de expressar desacordo”, mas também “aprender a dizer que não, a comunicar de forma assertiva – mostrando que se está consciente dos seus direitos, que não tem medo de expressar os seus sentimentos e necessidades”.

Para tudo isto, pode ser necessário “treino e até procurar ajuda”. No limite, pode ser preciso “criar distância da pessoa que está a manipular, para conseguir reganhar equilíbrio psicológico”.

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