O que defendem os partidos sobre imigração e asilo na União Europeia?
De protecção de refugiados LGBT+ à “política Ruanda”, os partidos propõem medidas diferentes sobre fronteiras e acolhimento de imigrantes. O resumo não dispensa a leitura dos programas eleitorais.
A migração é um dos principais temas que dividem os eleitores em vésperas das Eleições Europeias.
A atitude face ao Pacto de Migração e Asilo, o controlo de fronteiras e a integração de migrantes nos Estados-membros da União Europeia são exemplos de posições marcantes nos programas eleitorais e debates. Aqui ficam os pontos essenciais dos programas dos oito partidos com representação na Assembleia da República para as eleições de 9 de Junho.
AD foca-se na gestão das fronteiras
No programa eleitoral “Voz na Europa”, a Aliança Democrática (AD) defende alterações no recém-aprovado Pacto de Migração e Asilo da União Europeia (UE).
Sebastião Bugalho, cabeça de lista do partido, no primeiro debate eleitoral, a 13 de Maio, criticou o facto de o pacto apresentar “limitações”.
O candidato a eurodeputado deu como exemplo a questão de o documento prever que “um Estado-membro que não queira acolher determinado número de imigrantes tenha que pagar para compensar os custos do acolhimento desses migrantes noutro Estado-membro”. “Se um Estado que não quer acolher migrante nenhum for rico pode pagar ad aeternum para nunca receber refugiados”, justifica.
Bugalho defende que “a única forma de combater a imigração ilegal” e as redes de tráfico humano é o reforço de “mecanismos de imigração legal”. O cabeça de lista enfatiza que, no pacto, os mecanismos previstos “são muito curtos e muito pouco ambiciosos”.
Um dos exemplos que deu é o Cartão Azul, autorização de trabalho que permite que cidadãos altamente qualificados que não pertençam à União Europeia possam trabalhar e viver em 25 dos 27 países (excepto Dinamarca e Irlanda). No debate, o representante da AD referiu que pretende propor no Parlamento Europeu “baixar o salário previsto para o Blue Card”, de forma a “permitir a integração de migrantes altamente qualificados, mas que não tenham a necessidade de ganhar tanto dinheiro ao fim do mês” (em 2014, Portugal definiu o limiar salarial anual bruto mínimo: 23 711 euros).
O maior foco do programa da Aliança Democrática reflecte-se, no entanto, em medidas de gestão e controlo de fronteiras, assim como o Partido Popular Europeu (PPE), no qual se insere a nível europeu.
O PPE, que deverá continuar a ser o maior grupo no Parlamento Europeu, aposta no reforço das fronteiras externas e quer um rastreio “rigoroso” de todas as chegadas irregulares e uma monitorização electrónica "abrangente" em todos os pontos de entrada. Além disso, o PPE prevê um reforço do papel e do orçamento para a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex).
Socialistas querem uma postura humanista de inclusão e coesão social
A cabeça de lista do Partido Socialista (PS), Marta Temido, no primeiro debate eleitoral, explicou que o Novo Pacto para as Migrações e Asilo “representa, de alguma forma, um avanço”. No entanto, aponta “fragilidades”.
“Aquilo que precisamos de fazer é garantir um acompanhamento preciso e cuidado daquilo que é o pacto”, esclarece.
A representante apontou como pontos positivos do documento a “garantia de que há canais seguros e regulares para as migrações”, a “garantia de que a integração é uma dimensão essencial e que é acompanhada” e a “questão das parcerias” com os países de origem, “para o apoio ao desenvolvimento de aspectos que podem levar à origem das migrações”, pontos estes que o partido defende no seu programa eleitoral, “O futuro de Portugal na Europa”.
A nível europeu, o PS insere-se no Partido Socialista Europeu (PSE). O PSE quer garantir condições de recepção “humanas e decentes”, assistência jurídica para os migrantes, protecção especial para crianças e a luta contra o tráfico humano.
Chega quer quotas anuais para a imigração
No programa eleitoral “A Europa precisa de uma limpeza”, o partido de direita radical Chega defende o “abandono” do Pacto de Migrações da ONU e a “revogação” do acordo de mobilidade CPLP, que já tem novas exigências desde que o novo Governo entrou em cena.
António Tânger Corrêa, cabeça de lista do Chega às Europeias, referiu no segundo debate eleitoral, a 15 de Maio, que o Chega quer “uma imigração controlada”. “Quando se abrem as portas de forma escancarada, entram os maus elementos”, disse o representante do partido, enfatizando que o Chega não é “de todo contra a imigração”.
No seu programa, defende o estabelecimento de “quotas anuais” para a imigração com base “nas qualificações, nas necessidades do mercado de trabalho do país e nas mais-valias para Portugal”.
Em debate, António Tânger Corrêa disse que “temos que fazer um equilíbrio entre as nossas necessidades para desenvolver o país e, por outro lado, dar um bom nível de vida aos portugueses e às famílias portuguesas”.
Como consta no seu manifesto, o fluxo migratório “não atinge os 27 Estados-membros da mesma forma”, pelo que apoia a protecção das fronteiras externas da União Europeia. E sustenta um “reforço significativo” da Frontex, transferindo-a para Portugal.
O Chega defende também a “revisão” da lei da nacionalidade, alargando o prazo previsto de concessão e fazendo-a depender de “testes de Português e de História de Portugal”.
A nível europeu, surge a dúvida de onde se coloca o Chega: do lado dos conservadores ou da extrema-direita.
No quinto debate eleitoral, de 21 de Maio, o cabeça de lista do Chega referiu que “caracterizar o Chega como um partido de extrema-direita é profundamente errado”, assumindo a posição do partido como conservadora.
“Não é altura neste momento para nós debatermos qual é a família a que pertencemos e vamos esperar pelas votações dos vários grupos e das várias famílias. E nessa altura poderá eventualmente haver uma negociação para aumentar a base de apoio à base conservadora”, adicionando que é aquela em que o Chega “se vai inserir no futuro”.
O Reformistas e Conservadores Europeus (RCE), como enumera a Euronews, defende no seu manifesto que os Estados-membros não devem forçar “os seus cidadãos a receber imigrantes ilegais sem o seu consentimento”. Querem também controlar “todos os possíveis pontos de entrada” por via aérea, terrestre e marítima. O grupo europeu de extrema-direita ainda não publicou um manifesto comum.
Iniciativa Liberal quer política de migração assente nos valores liberais
A Iniciativa Liberal (IL) ambiciona no seu programa, “Europa, um espaço de liberdade”, uma política de migrações “baseada em valores liberais”, respeitando a “liberdade individual, direitos humanos, democracia”.
Relativamente ao Pacto das Migrações, João Cotrim Figueiredo, cabeça de lista da IL, em entrevista ao PÚBLICO, assumiu que este tem “alguns princípios” que “parecem de louvar”.
“Não é um pacto ingénuo, não diz que tudo isto é a paz dos deuses e não há problemas. Então, define uma série de critérios que me parecem razoáveis e bem pensados, e a expressão que foi usada na apresentação acho que é feliz: vamos ser justos e humanos com quem é elegível, firmes com quem não é elegível e intransigentes com quem trafica e se aproveita desta situação de necessidade das pessoas que querem entrar no espaço europeu”, referiu o liberal.
O representante da IL enfatizou a necessidade de controlo de fronteiras. “O trabalho nas fronteiras externas tem de funcionar na triagem das pessoas, na verificação dos antecedentes, na verificação da situação política, sanitária ou económica dos países de origem, para que possamos ter a certeza de que quem está a pedir asilo o está a pedir pelos motivos correctos, verdadeiros e é verdadeiramente elegível ao abrigo deste pacto”, disse.
No programa, o partido apoia, de igual forma, a colaboração “mutuamente benéfica” dos países europeus com os “países terceiros de origem”, para levar à resolução dos “problemas dos países da linha da frente”.
O partido insere-se no Partido da Aliança dos Liberais e Democratas pela Europa.
BE quer mudar “por completo” a política de migrações
No manifesto eleitoral “Europa por ti”, o Bloco de Esquerda (BE) defende uma mudança total na política de migrações por razões “humanitárias, democráticas e mesmo económicas”, colocando um fim àquilo que considera uma “abordagem xenófoba”.
Catarina Martins, no segundo debate eleitoral de 15 de Maio, defendeu que o problema da imigração se resolve com “regularização e políticas de imigração”.
“É claro que é possível fazer um processo de regularização a pessoas que trabalham em Portugal, têm descontos para a Segurança Social, e ficam na situação de serem alvo de todo o tipo de exploração por não terem os documentos regularizados. É preciso uma unidade de missão para tratar disto”, defende a representante.
Quanto a imigrantes que vêm para o país como resposta a pedidos de trabalho, a bloquista defende que “quem precisa da mão-de-obra” deve ter responsabilidade pelas “condições de habitação dos seus trabalhadores”. “O problema não está nas pessoas que imigraram, o problema está em quem está a explorar essas pessoas, e isso é que deve ser combatido”, referiu.
O partido quer terminar com os acordos de externalização de fronteiras, assim como da criminalização do resgate e salvamento de migrantes.
Apoia a criação de canais de entrada seguros para os migrantes e novos programas de acolhimento na União Europeia, assim como a consagração de direitos a quem entra na Europa.
O BE insere-se no Partido da Esquerda Europeia.
CDU denuncia uma visão “selectiva, utilitarista e exploradora” das migrações
No compromisso para as Eleições ao Parlamento Europeu “Sempre contigo”, a Coligação Democrática Unitária (CDU) enfatiza a “visão criminalizadora das migrações e dos migrantes” difundida pela extrema-direita.
Em entrevista ao PÚBLICO, João Oliveira, cabeça de lista da CDU nas eleições, criticou o Pacto das Migrações, referindo que “traduz um conjunto de concepções desumanas”.
O representante denuncia a União Europeia como encarando os migrantes, “em alguns casos, como ocupantes do espaço europeu, em outros casos, como peças de uma engrenagem produtiva”, ressaltando a visão “utilitarista e desumanizadora da vida” dos migrantes.
O partido preza, assim, no seu compromisso, a garantia dos direitos dos migrantes e dos refugiados, assim como a sua inclusão. Defende a melhoria das condições de acolhimento através de um reforço do financiamento da União Europeia. Por fim, apoia a promoção de “políticas de desenvolvimento” que “ataquem” as causas das migrações.
A CDU insere-se na Esquerda Unitária Europeia, que defende que o Novo Pacto deve ser “cancelado” pois, na sua opinião, condena os requerentes de asilo à detenção e deportação, escreve a Euronews. Apresenta também uma proposta directa para a “dissolução” da Frontex.
Livre quer fim imediato de “todos os controlos de fronteiras” no Espaço Schengen
Francisco Paupério, cabeça de lista do Livre, explicou em entrevista ao PÚBLICO que o partido é “sempre a favor” de receber imigrantes “de forma humana”, defendendo que o Pacto de Migrações “não vai contribuir para essa humanização”.
“Precisamos de equipas preparadas, não só para tratar da parte burocrática, mas para fazer o primeiro processo de inclusão. Não temos espaços culturais diversos nem programas sociais direccionados para estas comunidades. Temos de fazer isso a nível nacional. A nível europeu temos que ter uma burocracia célere, que dê segurança a estas pessoas e que dê condições de vida assim que cheguem”, esclareceu Francisco Paupério.
Para o candidato, fechar fronteiras não representa uma solução: “Se fecharmos fronteiras não acabamos com a imigração, acabamos apenas com a imigração legal. E vamos estar dependentes dos senhores da guerra, dos grupos de tráfico humano, que se aproveitam desta fragilidade das pessoas e desta vontade de vir para a Europa e com isso vão fazer dinheiro e aumentar os grupos criminosos.”
No seu programa eleitoral “Por uma Europa Unida e Livre”, o Livre apoia a criação de “canais seguros, legais e abertos para entrar na Europa”. No segundo debate eleitoral, Francisco Paupério esclareceu que “o corredor humanitário serve para pessoas que estão em situação de emergência”. “O que faz este corredor humanitário é permitir a estas pessoas mobilizarem-se de um sítio que não é seguro para um sítio seguro que, neste momento, aqui perto será a Europa.”
Assim como Catarina Martins, o representante do Livre ressaltou que “não temos as portas escancaradas”. De forma a integrar os imigrantes, Francisco Paupério defende que “temos que ter políticas integradas”. “Primeiro, temos que ter uma coordenação europeia, não pode ser apenas uma coordenação portuguesa. E essa coordenação europeia começa pelas fronteiras externas, e aí podemos controlar quem chega à Europa, de onde vem, com que intenções, e regularizar a sua situação”, referiu. “Se a pessoa cumprir os requisitos para entrar deve poder entrar”, adicionou o cabeça de lista.
A medida que mais destaca o Livre no seu programa eleitoral é a “eliminação imediata de todos os controlos de fronteiras dentro do Espaço Schengen”. O partido considera que a livre circulação é um “pilar da União Europeia”, devendo ser estendida a “migrantes e refugiados” que residam no espaço “legalmente”.
O Livre, assim como o PAN, faz parte dos Verdes. O grupo quer a introdução de “vistos climáticos” para vítimas de desastres naturais fora do bloco europeu e atenção especial aos requerentes de asilo LGBTQIA+.
PAN considera que o actual pacto pode afectar os portugueses
Pedro Fidalgo Marques, cabeça de lista do Pessoas-Animais-Natureza (PAN), criticou o Pacto das Migrações, afirmando que “o actual pacto pode afectar inclusive os portugueses que vão para a Europa”.
“O actual pacto prevê que qualquer pessoa na Europa possa ser detida até cinco dias, se não tiver consigo os documentos. Isto pode levar, como acontece noutros países, como os Estados Unidos, a perfis racializados. Ou seja, eu vou à Suécia e, por ter uma barba e, se calhar, no Verão, por estar um bocado mais moreno, posso ser detido durante cinco dias, porque não tinha os documentos comigo naquele momento, mas sou um cidadão europeu”, explica.
O cabeça de lista defende que “temos de trabalhar muito mais nestas políticas de integração em termos de ensino da língua portuguesa”.
As medidas para a imigração que o PAN enviou ao P3 sustentam, portanto, que os imigrantes “com processo de regulamentação pendente” possam inscrever-se no IEFP, I.P., “para acesso a formação profissional, cursos de Português Língua de Acolhimento e procura de oportunidades de emprego”.
Defende também que estes imigrantes, “que pagam impostos e contribuições sociais”, devem ter acesso a prestações sociais e ao SNS “em iguais condições aos outros cidadãos”.
O partido quer “descentralizar” o processo de regularização dos imigrantes através da instalação de “balcões do cidadão” nos municípios, de forma a serem recolhidos os dados biométricos dos cidadãos.
Promove ainda programas de acesso à habitação que permitam que as pessoas possam ficar na mesma casa “através de pagamento de renda gradual”.