IL e Chega propõem comissão de inquérito à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa

Liberais consideram que as várias audições que têm sido feitas no Parlamento sobre a SCML não têm “clarificado muita coisa” e Chega defende que é o “único instrumento que pode apurar a verdade”.

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Liberais querem inquérito à Santa Casa Nelson Garrido
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A Iniciativa Liberal propôs nesta quinta-feira a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à gestão financeira e à tutela política da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), considerando imperativo investigar os "investimentos ruinosos" feitos desde 2015. Também o Chega anunciou, ao início da tarde, ter entregado no Parlamento uma proposta de comissão de inquérito sobre a gestão e conduta dos anteriores responsáveis da SCML, admitindo trabalhar com os liberais para um texto conjunto.

Em declarações à agência Lusa, a líder parlamentar da Iniciativa Liberal (IL), Mariana Leitão, afirmou que o partido decidiu avançar com esta proposta por considerar que as várias audições que têm sido feitas no Parlamento sobre a SCML não têm "clarificado muita coisa". "O que percebemos é que, apesar nenhum dos intervenientes e de todas as pessoas que foram às várias audições solicitadas até agora poderem dizer que não têm responsabilidades, nenhum assumiu as responsabilidades relativamente a este processo", afirmou.

Mariana Leitão considerou que, na SCML, se verifica um "triângulo perverso", composto por "investimentos ruinosos", que têm causado "prejuízos avultados", uma "estrutura de custos completamente desfasada do que se espera de uma instituição com uma gestão eficiente", e a permeabilidade "a interferências político-partidárias, nomeadamente por conta das nomeações e das várias chefias que existiam".

Nesse âmbito, a IL decidiu apresentar uma comissão parlamentar de inquérito à "gestão financeira e à tutela política da SCML", cobrindo um período que começa em 2015, no final do executivo do então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, e vai até ao executivo actual, liderado por Luís Montenegro.

Mariana Leitão explicou que a IL optou por este período por ser precisamente em 2015 que começou uma política de "investimentos ruinosos", em particular através de um investimento em apostas hípicas, quando Pedro Santana Lopes era provedor da SCML, que "deu prejuízos de vários milhões".

"Queremos perceber não só esse investimento, como depois todo o processo de internacionalização, os vários investimentos que foram feitos em infra-estruturas da Saúde", disse, acrescentando que essa gestão da SCML é "transversal a vários governos e também é da responsabilidade de vários provedores que foram gerindo a Santa Casa".

A líder parlamentar da IL considerou imperativo perceber que avaliações de risco estiveram por detrás desses investimentos, o que é que os motivou e quais são os prejuízos que causaram à SCML, "de forma também a perceber o que é que é preciso corrigir". "A verdade é que, ao longo destes anos, estas decisões foram sendo tomadas, os alarmes foram soando, mas nunca houve uma acção efectiva, concreta, com planeamento de médio, longo prazo, para resolver as questões financeiras", afirmou.

Questionada sobre quem é que a IL admite chamar caso a comissão de inquérito seja aprovada, Mariana Leitão respondeu que deverão ser ouvidos "os provedores responsáveis por todos estes investimentos e os vários ministros da tutela" desde o XIX Governo Constitucional, de Passos Coelho. "Esses parecem-me óbvios. Os primeiros-ministros dependerão também da informação e do nível de detalhe que se consiga chegar e, se se justificar, obviamente que tomaremos essa decisão de os chamar", disse.

Interrogada sobre como é que espera que esta proposta seja acolhida junto dos restantes partidos, Mariana Leitão recordou que os requerimentos para audições sobre a SCML foram aprovados com os votos favoráveis de vários partidos.

"Portanto, estamos confiantes de que, eventualmente, os restantes partidos também estarão disponíveis para que se faça esse escrutínio que é tão importante", disse, recusando adiantar desde já se a IL vai procurar recolher as 46 assinaturas necessárias para impor este inquérito parlamentar. "Logo veremos quais serão os próximos passos, de acordo também com aquilo que for a situação desta primeira discussão e votação", disse.

Mariana Leitão defendeu que este inquérito parlamentar é importante do "ponto de vista da defesa do dinheiro dos contribuintes", para perceber "o volume de prejuízos" que estes investimentos causaram ao Estado, mas também porque a SCML é "uma instituição extremamente importante pelo papel social que tem e que é preciso salvaguardar".

"E a melhor forma de salvaguardar a instituição é garantir que chegamos ao fundo da verdade relativamente a todos estes investimentos que foram feitos, aos prejuízos que já causaram, para se conseguir também corrigir e permitir que a SCML tenha uma saúde financeira que lhe permita ter prosperidade", afirmou.

Única forma de "apurar verdade"

Já André Ventura revelou que a iniciativa do Chega, que já consta da página do Parlamento, foi entregue ainda antes de outra da da IL, adiantando estar disponível para trabalhar num texto conjunto. "O Chega ponderou todos os instrumentos possíveis para obter esclarecimentos, mas ontem [quarta-feira] à noite decidimos dar entrada de um inquérito parlamentar que será discutido nos próximos dias", anunciou aos jornalistas no Parlamento.

Ventura disse não querer "banalizar as comissões parlamentares de inquérito", mas considerou que este é "o único instrumento que pode apurar a verdade sobre as acusações graves de uso indevido de dinheiro público" na SCML. "Ainda hoje [quinta-feira] encetaremos conversações com PS e PSD" para que possam viabilizar esta iniciativa, disse, até porque o Chega já utilizou o seu direito potestativo de impor um inquérito parlamentar (limitado a um por sessão legislativa) sobre o caso das crianças brasileiras tratadas em Portugal.

De acordo com o projecto disponível na página da Assembleia da República, o Chega pretende um inquérito parlamentar "para averiguação da gestão, transparência de funções e conduta dos anteriores responsáveis envolvidos nos desequilíbrios de contas e funcionamento da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa".

Ventura salientou que as comissões de inquérito têm um conjunto de poderes que as comissões permanentes não dispõem, nomeadamente a obrigatoriedade de envio de documentação. "Queremos perceber porque é que a SCML tem 500 pessoas com salários de chefe", exemplificou.

Segundo o líder do Chega, há "acusações graves da ministra à antiga provedora" e, sobretudo, suspeitas de "dinheiro desbaratado em investimento no Brasil". "Isto é, eventualmente, até mais grave que o caso da TAP, não poderíamos usar um critério diferente", justificou.

A administração da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa foi exonerada a 29 de Abril passado.

Esta situação levou na quarta-feira Ana Jorge a ser ouvida no Parlamento e esta quinta-feira é a vez da ministra Maria do Rosário Ramalho dar explicações aos deputados. "Nos últimos dias tivemos notícias particularmente graves em relação à SCML, que vão no sentido de ter havido um conjunto de investimentos duvidosos e com resultados objectivamente escandalosos", apontou.

Para o líder do Chega, as audições parlamentares dos últimos dias permitiram perceber que "a gestão dos últimos anos da SCML foi altamente danosa para o erário público". "Podia ser um mero ato de má gestão ou de incompetente administração, mas os dados que têm vindo à tona nos últimos dias demonstram-nos que temos tido uma gestão abusiva, luxuosa e, por diversas vezes, negligente e grosseira do património da Santa Casa", acusou.

Ventura disse ter "perfeita noção do momento parlamentar" que se vive hoje, referindo-se a iniciativas desencadeadas pelo seu partido de promover uma comissão parlamentar especial para acusar o Presidente da República de traição à pátria e de impor um inquérito ao caso das crianças gémeas luso-brasileiras tratadas em Portugal.

"Mas o parlamento não pode ignorar a gravidade das declarações que têm vindo a público, quer de membros do Governo, quer de membros da antiga administração da Santa Casa", afirmou.

Notícia actualizada com a iniciativa do Chega