Quatro mortos em agravamento dos motins na Nova Caledónia
O Presidente francês, Emmanuel Macron, declarou estado de emergência na região. Vários edificios e carros foram incendiados numa noite marcada pela violência.
Os motins iniciados devido às tensões sobre uma controversa reforma eleitoral na noite de segunda para terça na Nova Caledónia, território ultramarino francês do oceano Pacífico, agravaram-se nesta noite, tendo-se registado três mortes e mais casos de danos e ataques com fogo posto.
Três das vítimas mortais registadas nesta madrugada eram membros da etnia Kanak, povo autóctone do arquipélago da Nova Caledónia, segundo o presidente do governo regional Louis Mapou. A quarta, registada já nesta quarta-feira, foi um guarda militar da região.
Para além das mortes, foram incendiados carros e lojas, tendo-se verificado também saqueamentos a vários estabelecimentos na região, segundo a agência Reuters. As escolas mantiveram-se encerradas e vários habitantes armaram-se e barricaram-se para se protegerem.
O alto representante da República na região Louis le Franc voltou a considerar a situação “muito séria” e avisou que a região podia entrar numa “espiral mortífera” com mais vítimas caso o apelo à calma não seja ouvido, segundo o órgão noticioso ultramarino La 1ere, que ouviu a declaração do representante numa conferência de imprensa.
Segundo o representante, uma das vítimas mortais foi encontrada numa zona industrial onde terá sido morta a tiro. O representante afirma que a morte terá ocorrido enquanto a pessoa se tentava “defender a si própria”, afastando que o tiro pudesse ter vindo da polícia.
O alto representante informou ainda que o fornecimento de bens e serviços essenciais está a ser comprometido. Le Blanc apontou "problemas de saúde nos hospitais", tendo uma pessoa a fazer diálise morrido devido aos constrangimentos provocados pela violência e ainda problemas no fornecimento de comida.
"Vamos ficar sem comida aqui, especialmente em Nouméa", avisou o representante. Várias lojas e supermercados foram saqueados e incendiados, como uma loja da cadeia francesa Carrefour na ilha.
O Presidente francês, Emmanuel Macron, declarou, nesta terça-feira, estado de emergência na Nova Caledónia, após uma reunião do Conselho de Defesa e Segurança Nacional para abordar a resposta do estado central à situação no território ultramarino. O Ministério do Interior e do Ultramar, liderado por Gerald Darmanin, nesta quarta-feira, anunciou que estava a chegar um reforço de 550 guardas militares e equipamento militarizado.
Macron tinha condenado, numa carta enviada aos partidos regionais na noite passada divulgada por um líder de um partido lealista, a violência vivida na região ultramarina, considerando que tinham um “carácter indigno e inaceitável” e apelando à condenação generalizada dos motins pelas forças partidárias da Nova Caledónia.
As forças partidárias regionais, independentistas ou não, são unânimes no “apelo à calma e à razão” na “situação insurreccional” que se vive na região. Nesta quarta-feira, os principais partidos da Nova Caledónia emitiram um comunicado conjunto contra a violência nas ruas.
Estamos convencidos de que é através do diálogo e da resiliência que poderemos sair desta situação colectivamente”, afirmaram os partidos.
Em Paris, a reforma terá votação final após diálogo
Entretanto, perto da meia-noite em Paris, a reforma eleitoral proposta pelo Governo passou mais um crivo no Parlamento francês, tendo sido aprovada na Assembleia Nacional, câmara baixa da legislatura do país. Para a proposta ser votada de forma definitiva, o Parlamento francês tem de se reunir em forma de Congresso, uma reunião conjunta de ambas as câmaras legislativas, por requerer uma revisão a normas incluídas na Constituição francesa.
A reforma, muito contestada pelos independentistas, implica a alteração do definido nos acordos de Nouméa em 1998 entre o Estado central, as forças lealistas e os partidos independentistas. Nesse acordo estabeleceu-se que os cadernos eleitorais seriam restritos às pessoas que viveram nos dez anos anteriores à assinatura. O acordo deu ainda origem a três referendos sobre a independência desde 2018, tendo o “Não” ganho em todos.
Macron, por carta, convidou todos os partidos da região para uma reunião na sede do Governo central no Hotel Matignon, em Paris, de modo a “criar condições para um diálogo que envolva ambos os lados”, e crê que ainda é possível um acordo com os partidos locais. Sobre a votação em Congresso, o Presidente disse que seria antes do fim de Junho e depois da realização do diálogo com os partidos da região.
Uma das principais forças independentistas, a Frente de Libertação Nacional Kanak e Socialista (FLNKS), pediu, num comunicado divulgado nas redes sociais do partido, para que o projecto seja retirado “de forma imediata” do procedimento legislativo. No entanto, a FLNKS acolheu bem a proposta de diálogo do Presidente Macron, bem como a decisão de só reunir mais tarde o Parlamento em Congresso, dando espaço “ao diálogo e ao consenso”.
Texto editado por Ivo Neto