Após descartar Moreira, Montenegro escolhe o Porto para apresentar estratégia para habitação

A forma como o partido tratou o presidente da Câmara do Porto no processo das europeias abriu feridas difíceis de sarar e que podem comprometer entendimentos futuros nas autárquicas do próximo ano.

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Primeiro-ministro apresenta a patir do Porto a estratégia do Governo para a habitação FERNANDO VELUDO / LUSA
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O primeiro-ministro, Luís Montenegro, escolheu a Câmara do Porto para divulgar, esta sexta-feira, a estratégia do Governo para a habitação. É a segunda vez que Luís Montenegro e Rui Moreira se encontram, na cidade do Porto, depois da escolha do cabeça de lista da AD às eleições europeias: quando tudo apontava para que Rui Moreira fosse o cabeça de lista pela coligação, o PSD optou pelo comentador político Sebastião Bugalho.

A vinda de Luís Montenegro ao Porto acontece sem que o PSD tenha desmentido ter convidado formalmente Rui Moreira a protagonizar uma candidatura às europeias pela Aliança Democrática, o que o pouparia a uma enorme exposição púbica. Escolhido o cabeça de lista, o lugar que Luís Montenegro ofereceu ao presidente da Câmara do Porto foi o de número dois. Como este não aceitou, acenaram-lhe ser mandatário da candidatura a Bruxelas, convite que também declinou.

A forma como o partido tratou o presidente da Câmara do Porto em todo este processo abriu feridas difíceis de sarar e que podem comprometer entendimentos futuros com vista às eleições autárquicas do próximo ano. Com a saída de Rui Moreira, em 2025, por limitação de mandatos, abre-se um novo ciclo político na Câmara do Porto e o apoio do movimento que deu três vitórias ao autarca independente poderia ser crucial para os sociais-democratas reconquistarem a autarquia portuense. Muitas das pessoas que integram o movimento independente saíram do PSD e do CDS-PP para apoiarem Moreira.

Ao escolher a Câmara do Porto para divulgar a estratégia para a habitação, Luís Montenegro pretenderá limpar um pouco a imagem do que aconteceu, numa clara gestão de danos políticos, reafirmando que não há qualquer atrito com Rui Moreira por causa das eleições europeias, que são o segundo teste à liderança de Montenegro, depois das legislativas. Já para o país, o primeiro-ministro passou uma mensagem consensual, demonstrando que não existe nenhum mal-estar com o presidente da Câmara do Porto e que a questão das europeias está resolvida entre os dois.

O facto de o município do Porto ser o maior senhorio da cidade também pode ter pesado na hora de decidir onde apresentar as 30 medidas que constam da estratégia do Governo para a habitação. A Câmara do Porto tem cerca de 13 mil fogos onde vivem quase 30 mil pessoas. A nível do país, 2% da população vive em habitação pública (Estado ou câmaras municipais). No Porto, cerca de 13% da habitação é propriedade municipal.

O PÚBLICO sabe que no partido há quem discorde da forma como o PSD geriu o processo, expondo publicamente o autarca que, apesar de ser apontado por várias figuras do PSD como sendo uma "boa solução" para as europeias, nunca foi alvo de nenhum convite para cabeça de lista.

O comentador Marques Mendes, o eurodeputado da AD Paulo Cunha ou o presidente da Câmara de Braga, Ricardo Rio (PSD), nunca levantaram nenhuma resistência em relação a Rui Moreira para liderar a lista às europeias. “Apesar de ser independente, não deixa de ser uma pessoa que converge em muitas das suas posições e das suas perspectivas sobre a gestão pública, sobre o país e sobre a Europa, em particular, que é o que importa neste contexto, como aquilo que são as posições do PSD”, declarou ao PÚBLICO, em Julho de 2023, Ricardo Rio.

Três meses depois, Luís Montenegro afirmou mesmo que Rui Moreira é uma das personalidades independentes que, “em abstracto”, preenchem os requisitos para um bom resultado do partido nas europeias. Num encontro entre os dois, ainda no ano passado, que decorreu no Porto, Rui Moreira garantiu não ter recebido nenhum convite de Luís Montenegro para encabeçar a lista do partido às referidas eleições.

Dois dias antes da reunião do PSD para escolher o cabeça de lista, um grupo de 20 militantes sociais-democratas, alguns dos quais autarcas, tornou público um comunicado em que se insurgia contra a possibilidade de Rui Moreira ser indicado pelo PSD como cabeça de lista às europeias. "Queremos deixar claro publicamente que nos demarcamos desta opção, pois consideramos ser uma traição aos portuenses, aos simpatizantes e autarcas eleitos pelo PSD", diz o comunicado, que adverte para as "marcas profundas na confiança que os portuenses têm no PSD".

Ao que foi possível apurar, Rui Moreira ficou profundamente magoado com o tom e o teor do comunicado, até porque o PSD tem um acordo de governação com o movimento independente na Câmara do Porto que permite que algumas das “bandeiras” eleitorais dos sociais-democratas (que constam do programa eleitoral) sejam aprovadas.

Um dos subscritores do comunicado é Miguel Côrte-Real, que até há poucos dias presidia à bancada do PSD na Assembleia Municipal do Porto (AMP). Próximo de Rui Rio, como são muitos dos subscritores do texto, Miguel CôrteReal pediu a demissão de líder da bancada no dia 1 de Maio. O deputado municipal Manuel Monteiro é o novo presidente da bancada do PSD na AMP.

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