PS consegue aprovar fim das portagens nas ex-Scut contra a vontade do Governo
A proposta do PSD e CDS para a redução gradual foi rejeitada. O ministro dos Assuntos Parlamentares acusou PS e Chega de estarem unidos por uma “vontade de bloquear e minar a acção do Governo”.
Foi uma espécie de segunda ronda do debate sobre a redução do IRS, em que as propostas da esquerda foram aprovadas com a abstenção do Chega e da IL. Agora, o PS conseguiu ver aprovado o fim das portagens em algumas das antigas Scut (auto-estradas sem custos para os utilizadores), a partir de 2025, com os votos favoráveis da esquerda e do Chega e contra a vontade do executivo.
Já a recomendação do PSD e CDS ao Governo para implementar uma redução gradual destas portagens foi rejeitada por PS, Chega e PCP, apesar do voto a favor da IL e a abstenção dos restantes partidos. O PSD ainda desafiou os socialistas a baixarem a proposta à especialidade sem votação, mas sem sucesso.
A aprovação estava garantida desde esta manhã, quando o Chega anunciou que iria viabilizar a proposta do PS, que visa abolir as portagens na A4, A13 e 13-1, A22, A23, A24, A25 e A28 a partir de 1 de Janeiro do próximo ano. Isto, apesar de o PSD e o CDS defenderem uma diminuição faseada nestas ex-Scut (sem data definida) e de o próprio Chega ter recomendado uma redução gradual em dois anos de todas as portagens - proposta que não foi votada por ter sido substituída fora do prazo.
A iniciativa do PS, que contou com a abstenção da IL, tem um custo estimado pelos socialistas de 157 milhões de euros e pelo Governo de 180 milhões em 2025, que deverá ascender aos 1,5 milhões de euros até ao final do prazo das concessões.
Pelo caminho, ficaram o projecto de resolução da IL para se estudar os custos da isenção das portagens nas antigas Scut, os projectos de lei do BE e do PCP para abolir as portagens nas ex-Scut e passar a concessão rodoviária dessas auto-estradas para a IP - Infra-estruturas de Portugal e a recomendação do PAN para o executivo renegociar os contratos das parcerias público-privadas do sector rodoviário.
O debate, marcado pelo PS, acabou por ser também uma repetição da discussão sobre o Programa do Governo, em que o líder da bancada do PSD acusou os socialistas de “hipocrisia” por quererem abolir as portagens nas antigas Scut agora que estão na oposição, quando decidiram apenas pela redução durante a governação anterior. E um eco das declarações do primeiro-ministro que, na semana passada, lembrou o episódio do IRS para desafiar PS e Chega a esclarecerem se querem formar um “governo alternativo”.
A partir do hemiciclo, Hugo Soares acusou o PS de fazer “a quadratura do círculo” e não só considerou que a votação das propostas foi a “prova dos nove” para saber se os partidos “querem ser oposição ou bloqueio à governação”, como acusou o PS e o Chega de estarem em “conluio” para “governar através do Parlamento”.
Já após a sessão, o ministro dos Assuntos Parlamentares acusou o PS de "irresponsabilidade orçamental" e de querer "bloquear e minar a acção" do executivo em conjunto com o Chega, desafiando novamente os partidos a assumirem se querem "coligar-se na governação do país". Perante este episódio, a que se soma o do IRS, Pedro Duarte procurou ainda garantir que o executivo continua "empenhado na execução do Programa do Governo".
O líder do PS, Pedro Nuno Santos, por sua vez, defendeu que está a "cumprir o seu trabalho com sentido de responsabilidade", já que não está a ir além do programa eleitoral nem do cenário macroeconómico, argumentando mesmo que "o PS na oposição está a conseguir fazer mais do que o PSD no Governo". E recusou qualquer "entendimento com o Chega", ao apontar que o PS não vai deixar de apresentar propostas "porque determinado partido também concorda".
O mesmo fez o líder do Chega, André Ventura, que considerou que o Governo foi "derrotado", mas retorquiu que "abolir portagens não é uma força de bloqueio", antes da "democracia".
PS justifica mudança de posição com "novo programa"
Também durante o debate os partidos tiveram de se defender das acusações de "incongruência" vindas da direita: ao PS por querer "hoje o que dizia ser impossível há seis meses" ou já não estar preocupado com "as contas públicas equilibradas" e ao Chega por dizer que quer "derrubar o socialismo" e, depois, "votar maioritariamente ao lado do PS e da extrema-esquerda", como assinalou Paulo Núncio, do CDS.
Pelo PS, Jorge Botelho defendeu que, depois da “redução progressiva” de 65% dos preços das portagens face a 2011, posta em marcha pelos governos do PS, é preciso “reduzir os 35% que faltam” para aumentar os "rendimentos" e a "competitividade". E recusou qualquer incoerência por ter votado contra o fim das portagens nas SCUT no passado, argumentando que, durante os governos de António Costa, o PS defendia a redução das portagens nas ex-Scut, ao passo que no programa actual defende a abolição.
“Há um novo tempo, um novo programa”, disse o deputado, defendendo que a proposta do PS se trata do “cumprimento” desse programa e que tem um “valor mais do que aceitável para acomodar no Orçamento do Estado” para 2025.
Da bancada do Chega, Pedro Pinto contrapôs que o Chega acompanha a medida do PS porque não tem "nenhuma coligação negativa", apenas "com o povo português".
Já o BE e o PCP alinharam-se em criticar PSD e CDS por nunca terem votado a favor do fim das portagens para "protegerem os interesses das concessionárias” e ao Chega por não ter tido a "coragem" de apresentar um projecto de lei e querer "enganar as populações".
Pelo Livre, Rui Tavares questionou porque é que o PSD e o CDS fizeram apenas recomendações “do ponto de vista orçamental” e, pelo PAN, Inês de Sousa Real, defendeu a renegociação das parcerias público-privadas de forma a reduzir os encargos do Estado e canalizar recursos para os transportes públicos.