E o céu não caiu sobre a cabeça de Israel

Defesas de Israel tiveram 99% de eficácia na intercepção dos mísseis e drones iranianos, mas o 1% que sobra acabou por deixar uma criança beduína em estado crítico.

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Os destroços que as autoridades israelitas dizem ter atingido Amina al-Hassouni Christophe Van der Perre/Reuters
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Na aldeia beduína de Al-Fur’ah não há abrigos onde as famílias possam buscar refúgio em caso de ataque, como é comum em Israel. Aliás, Al-Fur’ah, situada próximo de Arad, às portas dos desertos do Negev e da Judeia, nem sequer é reconhecida pelos mapas de Israel como uma aldeia. Por isso, quando soam ao longe as sirenes em Arad (em Al-Fur’ah não há sirenes para avisar dos ataques), as famílias buscam o céu aberto como único abrigo.

Foi assim esta madrugada. Enquanto as sirenes soavam em todo o país a avisar dos drones e mísseis disparados pelo Irão contra território israelita e as pessoas procuravam os abrigos, como habitualmente fazem nestas situações, ou não procuravam, porque confiam nos sistemas de defesa antiaérea de Israel, e seguiam as suas actividades normais, em Al-Fur'ah, as famílias beduínas só tinham entre elas e os céus o tecto frágil das suas barracas.

Faltavam cinco minutos para as duas da manhã em Israel (meia-noite em Portugal continental) quando a família de Amina al-Hassouni, de sete anos, sentiu os fragmentos de um míssil iraniano interceptado pelas defesas israelitas atingir o telhado da casa onde vive. O barulho da sirene de Arad chegava ténue aos seus ouvidos. Saíram para o relento.

É o irmão de Amina, Jihad, quem conta a história à repórter do Haaretz Eden Solomon. “Toda a família foi para o exterior para se tentar proteger. A Amina saiu com o resto da família e quando estava a regressar a casa foi atingida pelo foguete propulsor de um dos mísseis e caiu por terra.” A menina perdeu a consciência e deixou de reagir aos estímulos. A família levava-a de automóvel para o hospital quando se cruzaram com uma ambulância dos serviços de emergência médica (Magen David Adom), que lhe prestaram os primeiros socorros e a transportaram para o Soroka Medical Center, em Arad, onde está actualmente anestesiada e ventilada, e em estado crítico.

O caso de Amina é a excepção numa noite que os israelitas viveram entre o medo e a confiança, enquanto os clarões dos mísseis e drones interceptados alumiavam de laranja o céu escuro.

Tinham razão os israelitas em confiar no sistema de defesa, já que a taxa de sucesso atingiu cerca de 99%, de acordo com os militares israelitas, o que em termos de ciência, onde nada nunca é um redondo 100, é como se fosse perfeito; estava certo o instinto ao lhes dar o medo de que tudo falhasse ou falhasse um pouco, porque aí está a história da menina beduína para mostrar que mesmo esse 1% que passou pela rede (ou que não passou pela rede mas foi destruído demasiado perto de zonas habitadas) provoca vítimas. Aqui também haverá quem questione por que razão os beduínos não merecem as sirenes e os abrigos que têm o resto dos cidadãos de Israel.

"A situação é realmente assustadora, porque temos medo do que possa acontecer e de todos os bombardeamentos e aviões", disse ao Times of Israel Ayala Salant, um residente em Jerusalém de 48 anos. "No entanto, estamos muito, muito satisfeitos com a aliança que nos ajudou, porque a maioria dos aviões e mísseis não chegaram a Israel. Esperamos que esta escalada em curso termine em breve."

Yishai Levi, de 67 anos, optou por encher o peito com os avanços tecnológicos israelitas, declarando ao mesmo jornal que, “mais uma vez”, Israel demonstrou a sua “superioridade” e lidou com o ataque de uma “forma extraordinária”.

A maioria das pessoas correu aos supermercados para se abastecer de água e de alguns bens de primeira necessidade assim que surgiram os avisos de que o Irão havia disparado drones e mísseis em direcção a território israelita, e passou a noite nos abrigos enquanto lá fora o céu se tingia do laranja eficiente dos sistemas de defesa a trabalhar.

Numa mercearia no bairro de Mamilla, em Jerusalém, o proprietário, Eliyahi Barakat, constatava o óbvio perante o jornalista do Times of Israel, olhando à volta para a sua loja: “Como pode ver, está vazia, toda a gente está a ir para casa.”

Da noite longa amanheceu um dia em busca da normalização, com a Autoridade de Aeroportos israelita a anunciar a reabertura do espaço aéreo israelita à aviação comercial, encerrado durante a noite por razões óbvias. O aeroporto internacional Ben Gurion, em Telavive, reabriu logo de manhã, e os outros aeroportos do país tinham reabertura prevista também para este domingo.

Mohammed al-Hassouni, o pai de Amina, teme agora essa normalidade, quando a filha se mantém inconsciente no hospital. Na quinta-feira, recebeu a ordem de demolição da casa da família e vai ter de procurar um novo abrigo de todos os dias.

“Disseram-nos que tínhamos dez dias para demolir a casa”, conta ao Haaretz. “Tenho de lidar com isso enquanto a minha filha está no hospital em estado crítico. Ninguém nos ajuda. Não temos qualquer protecção, não temos nenhum direito. Querem demolir a única casa que temos.”

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