Inquérito que visa António Costa será investigado de forma autónoma no DCIAP
Processo estava a ser dirigido pelo procurador-coordenador do Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça e baixa porque Costa já não é primeiro-ministro.
As suspeitas de envolvimento do ex-primeiro-ministro António Costa num esquema de corrupção que tiveram origem na chamada Operação Influencer vão ser investigadas pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), onde correm as restantes três investigações relacionadas com este caso.
O inquérito corria até agora no Ministério Público (MP) junto do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), estando nas mãos do respectivo procurador-coordenador que tomou agora a decisão de fazer baixar o processo. Isto porque António Costa deixou de ser primeiro-ministro, o que, na opinião deste magistrado, lhe retira a prerrogativa de ser investigado pelos procuradores que representam o Ministério Público no Supremo.
A remessa do processo de António Costa para o DCIAP foi avançada pela CNN e já confirmada ao PÚBLICO pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que o PÚBLICO questionara há vários dias sobre esta matéria. A resposta surgiu já depois de a CNN ter avançado com a informação sem citar qualquer fonte. "Confirma-se que os autos que corriam termos no STJ desceram ao DCIAP", afirma o gabinete de imprensa liderado por Lucília Gago.
Segundo o PÚBLICO apurou, o inquérito que envolve António Costa deverá ficar separado do processo principal da Operação Influencer, uma investigação centrada nos alegados favorecimentos a um megaprojecto para instalar um campus de data centers, em Sines, que está parcialmente construído.
Inicialmente, a investigação a quatro negócios (dois do lítio, um do hidrogénio e o Sines 4.0) foi conduzida de forma conjunta pelo DCIAP, mas após as buscas de Novembro passado, que abarcaram vários ministérios e a sala de trabalho do então chefe de gabinete de António Costa (onde foram encontrados 75.800 euros em dinheiro), o MP decidiu separá-los. De um lado ficaram os contratos do lítio, do outro o negócio falhado do hidrogénio e, no principal, as suspeitas relativas ao megaprojecto da Start Campus.
Agora, com a chegada deste caso ao DCIAP, o número de inquéritos da Operação Influencer subirá para quatro. A autonomização permite uma decisão sobre as suspeitas que visam António Costa antes do fim do inquérito centrado no megaprojecto da Start Campus, que se deverá prolongar pelos próximos meses ou até anos.
Na semana passada, António Costa anunciou que deu instruções ao seu advogado para apresentar um requerimento que lhe permita ser ouvido “com a maior celeridade” pela justiça para “esclarecer qualquer dúvida” e qualquer suspeita relacionadas com este caso. Essa decisão, que ainda não foi tomada, deverá agora ficar nas mãos da equipa de procuradores da Operação Influencer no DCIAP.
O inquérito que visa António Costa foi aberto pelo MP junto do Supremo a 17 de Outubro, ou seja, 20 dias antes das buscas da Operação Influencer. A informação foi transmitida pela própria PGR uns dias depois de ter anunciado que o então primeiro-ministro também era suspeito neste caso, facto com que Costa justificou a sua demissão.
Uma questão polémica
A questão de saber onde devem ser investigados os crimes praticados por um primeiro-ministro em exercício de funções não é pacífica. Há magistrados que defendem que, mesmo depois de deixar o cargo, os inquéritos deviam continuar a gozar desse foro especial porque o que se pretende proteger é a função e não a pessoa. Outros entendem que, para ter a prerrogativa de ser investigado pelo Ministério Público junto do Supremo, são necessários dois requisitos: os alegados crimes terem sido cometidos na qualidade de primeiro-ministro e a pessoa manter essa qualidade.
Facto é que o antigo primeiro-ministro José Sócrates, que vai ser julgado por crimes de corrupção na Operação Marquês, nunca foi investigado pelos procuradores que trabalham no Supremo, nem será esta instância superior a fazer o respectivo julgamento, que deverá decorrer na primeira instância. No caso de Sócrates, que começou a ser investigado já não era primeiro-ministro, o inquérito correu sempre no DCIAP.