IGAI: migrantes devem ter advogado antes da recusa de entrada no aeroporto

Ordem defende que presença de advogados “deve ser sempre assegurada, independentemente” do pedido do próprio. PSP vai analisar recomendação da “polícia dos polícias”.

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Daniel Rocha
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A Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI) recomendou à PSP que permita a assistência jurídica a estrangeiros retidos no aeroporto quando estes são barrados na fronteira e antes da decisão de recusa de entrada em Portugal.

A recomendação refere que isso deve acontecer “sempre que a mesma seja solicitada pelo próprio ou por advogado, durante a fase de instrução do processo administrativo”. Isto porque vários advogados e estrangeiros relataram casos em que não lhes foi possível aceder a assistência jurídica no momento em que têm de responder a várias questões das autoridades, o que, alegam, os impede de defenderem os seus direitos antes de serem confrontados com a recusa. E, como enfatiza a IGAI, "daqui resulta que esses cidadãos podem ficar durante um período, que pode ser longo, impossibilitados de entrarem em território nacional e impedidos de serem assistidos juridicamente por advogado".

A PSP diz que recebeu a recomendação e que está “a analisar o seu conteúdo e os impactos do referido documento na operação” desta força de segurança.

A recomendação publicada pela IGAI lembra que a garantia de apoio jurídico apenas após a decisão administrativa de recusa de entrada decorre do "procedimento instituído na PSP e, anteriormente, também pelo SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras]".

Enquanto os estrangeiros a quem é recusada a entrada têm garantida na lei a assistência jurídica, quem for interceptado e encaminhado para o que chamam "segunda linha de controlo" do aeroporto tem de esperar pelas diligências de instrução destinadas a apurar se há fundamento de recusa de entrada. São também registadas em auto, e assinadas pelos próprios, as suas declarações, sendo depois apresentada proposta de decisão.

Citando a Constituição Portuguesa em cujo artigo 20.º se contempla que todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consultas jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade – e os códigos do Procedimento Administrativo e de Processo Penal –, a IGAI defende que, até a decisão estar tomada, “poderão ser efectuadas diligências de produção de prova pelo instrutor, designadamente a tomada de declarações do cidadão sobre os motivos de entrada, com a subsequente assinatura do auto, tudo sem a presença do advogado, mesmo em situações em que tal é requerido”.

“É certo que não há qualquer obrigatoriedade de ser garantida a assistência jurídica a todos os cidadãos durante a instrução do processo administrativo e em momento prévio à decisão de recusa de entrada em território nacional, nomeadamente quando o cidadão presta declarações. Contudo, quando são tomadas declarações, a audição do cidadão estrangeiro vale, para todos os efeitos, como audiência do interessado. (...) Trata-se, indiscutivelmente, de um procedimento administrativo do qual vai resultar uma decisão que afecta a esfera jurídica do cidadão estrangeiro”, afirma a IGAI.

O pedido de um cidadão para ser acompanhado de advogado não pode ser recusado pela PSP, defende.

Esta era uma posição defendida há vários anos por quem acompanha estes processos, e que a bastonária da Ordem dos Advogados (OA), Fernanda de Almeida Pinheiro, recordou depois de visitar o aeroporto em Janeiro.

Contactada, a Ordem “congratula-se por, na senda do já solicitado junto da PSP do aeroporto", a IGAI ter adoptado esta recomendação”, como afirmou Filipa Santos Costa, vogal do conselho geral. Porém, a responsável refere que a presença de advogado “deve ser sempre assegurada independentemente” do pedido do próprio, “uma vez que nem sempre os cidadãos nestas circunstâncias estão habilitados a expressar a sua vontade”.

“Pese embora seja um avanço relativamente à situação actual, parece-nos que ainda peca por escassa, estando agora na esfera da PSP agir de modo a garantir o acesso a aconselhamento jurídico prestado por profissionais habilitados.”

A Ordem defende que deve ser criada uma escala que garanta o acompanhamento dos cidadãos por advogados a partir do momento em que são ouvidos pelas autoridades – e em que prestam declarações que os podem prejudicar.

Desde Março de 2021 que a Ordem tem uma escala de advogados que prestam apoio aos cidadãos impedidos de entrar, mas não assegura apoio na primeira entrevista que serve de base à decisão de não admissão. A medida, na altura, foi tomada depois da morte do cidadão ucraniano Ihor Homenyuk no centro de instalação temporária do aeroporto, depois de lhe ter sido impedida a entrada em Portugal por suspeitas de que vinha trabalhar.

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