Divisão sexual do trabalho: equilíbrio de poder e não de tarefas

Muitas mulheres podem nem sequer ter consciência disso, mas assumem tarefas “acessórias: são incentivadas a criar um ambiente “o mais harmonioso possível” e a promover a coesão da comunidade.

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Megafone P3:.Divisão sexual do trabalho: equilíbrio de poder e não de tarefas Tina Dawson/ Unsplash
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As mulheres continuam subordinadas aos homens. Ignorá-lo é ignorar o sexismo. Fico confusa quando o feminismo burguês apresenta a divisão de tarefas”, mas não de “poder”, como um problema. Como é quando não se divide uma casa?

Esta é questão social e não doméstica. Reduzir a divisão sexual do trabalho à esfera doméstica é cómodo. A divisão sexual do trabalho não é uma questão de tarefas; é uma questão de equilíbrio de poder. Ao pensar de outra forma estamos apenas a legitimar a opressão interna e externa das mulheres — as que continuam a ser responsáveis pelo trabalho reprodutivo.

E, o neoliberalismo aproveita-se disto. Os homens continuam a ter o “tempo”, os meios de produção para gerar lucro — para o patrão e o próprio. Quando o fazem, vendem não só o seu tempo, mas o de quem lhes é querido, porque deixam de ter tempo”. Já a mulher continua subordinada à “falta de tempo” do homem, pela “falta de cuidado” do mesmo, e à divisão do trabalho.

Muitas mulheres podem nem sequer ter consciência disso, mas assumem tarefas “acessórias”: são incentivadas socialmente a criar um ambiente “o mais harmonioso possível” e a promover a coesão da comunidade, porque faz parte de uma forma de divisão sexual do trabalho, faz parte dos cuidados. São elas que tiram “tempo” ao seu “tempo” para perguntar: “Como estás?”, “Tens andado bem?”, “Como anda o trabalho?”, “Tens conseguido alimentar-te bem?”. Por isso, as “tarefas domésticas” saem das casas e continuam a existir na sociedade.

Outro padrão que tem sido ensinado às mulheres através da educação e da socialização na sociedade é a moderação. Não gostar de conflitos, de discordar ou de se envolver em discussões faz parte do comportamento aprendido, tipicamente feminino. E, sim, isso pode criar um sentimento de injustiça nas próprias mulheres que têm medo de se contradizer. Porque pensam que é o que se espera delas.

A questão que se coloca imediatamente é: porque é que as mulheres assumem todas estas "tarefas domésticas" na sociedade? Porque temos estes comportamentos? E como os podemos mudar?

São tempos de convulsão, as pessoas procuram estabilidade e, por isso, recorrem a padrões de género bem conhecidos. Mas estou a escolher fazer isto de livre vontade, está conforme os meus valores ou estou a fazê-lo porque é esperado de mim e tenho medo das consequências se não corresponder a certas expectativas?

Não há nada mais invisível do que o próprio privilégio. Nem toda a gente quer abdicar das suas próprias vantagens e poder. As pequenas actividades podem parecer insignificantes, mas são exactamente o oposto. São essenciais. O facto de as mulheres também fazerem este trabalho não só te beneficia, mas a todo o sistema da sociedade.

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