Há muito que a notícia balouçava ao vento, mas resistia a pousar. Antes da confirmação da venda da Quinta do Portal, nesta segunda-feira, foram caindo compras e aquisições várias. Da dona da Taylor’s, mas também dos grupos Winestone, Roullier, Sogrape, Sogevinus e Symington, entre outras, evidenciando um movimento de concentração no sector dos vinhos que, pelos vistos, está para continuar. E não só no Douro, já que o vento arrasta também notícias de outras regiões.
Numa altura em que se assinalam 30 anos do Relatório Porter e os 50 da Revolução de Abril, apetece até dizer que há um PREC que vai marcar a história futura do sector em Portugal. Sigla que corresponde desta vez a um Processo de Reestruturação em Curso no sector vitivinícola, e não ao processo revolucionário que se seguiu ao 25 de Abril de 1974.
E embora a linguagem revolucionária seja claramente excessiva neste caso, um dado histórico fica desde já registado: com a compra da Quinta do Portal, e a consequente produção e comercialização de vinhos DOC Douro por parte da dona da Taylor’s, acaba também uma realidade de séculos, deixa de haver na região qualquer grande empresa exclusivamente centrada no vinho do Porto.
Uma mudança estratégica que é tanto mais de sublinhar quando ainda há menos de um ano o grupo The Fladgate Partnership, cuja empresa fundadora, a Taylor’s, data de 1692, se mantinha aferrado à tradição da exclusividade dos vinhos do Porto, mostrando-se determinado a resistir aos ventos de mudança que nas décadas recentes têm trazido valor e notoriedade aos vinhos DOC do Douro.
Tal como reconhece a dona da Taylor’s, Croft e Fonseca no comunicado onde dá conta da compra, os vinhos do Douro irão fortalecer a sua presença internacional nos mercados de exportação, que acrescentará agora à oferta de Vinhos Verdes, Dão e Bairrada, de que passou a dispor depois da compra da Ideal Drinks, em Agosto último.
Por essa altura o CEO do grupo, Adrian Bridge, reiterava ainda que produção de vinhos do Douro não era opção — "precisamos de todas as uvas para vinho do Porto" —, mesmo sabendo-se que a venda da Quinta do Portal (que engloba também as quintas do Confradeiro e Abelheira) era já um dado adquirido. Correram, entretanto, notícias de negócio fechado com outros operadores de envergadura, mas o negócio final terá balouçado entre a Fladgate e a Sogevinus, tendo prevalecido a melhor oferta depois de uma tentativa de espécie de leilão em que ambas se recusaram a participar.
Mas o movimento de concentração e aquisições no sector parece estar ainda para durar, e as brisas noticiosas dão contra de mais compras de vinhas e adegas a anunciar em breve, abrangendo também regiões como Bairrada, Dão e Alentejo. No ar balouçam nomes de propriedades como a Quinta do Pessegueiro, os grupos Winestone, Granvinho ou Herdade do Esporão.
É, no fundo, a concretização de alguns dos vectores para que apontava, há 30 anos, o relatório que Michael Porter elaborou sobre a Competitividade da Economia Portuguesa. O célebre académico apontava, entre outros, os sectores do vinho e do turismo como apostas estratégicas onde o país poderia reunir algumas vantagens.
Forçoso era desenvolver ecossistemas de inovação, competência e competitividade, entretanto postos em prática, mas onde a dimensão e músculo financeiro são factores igualmente decisivos. É por isso que, àqueles que têm a exportação como finalidade e apostam na competitividade a nível global, não resta outro remédio senão tornarem-se maiores e mais abrangentes.
Além da histórica presença nos vinhos do Porto, a Fladgate foi das pioneiras a explorar a vertente do turismo. Ao The Vintage House Hotel, no Pinhão, no coração do Douro, juntou o The Yeatman e o temático WOW — World of Wine, ambos associados às históricas caves de Vila Nova de Gaia. Com a Quinta do Portal, junta também um dos mais sólidos e apelativos projectos de enoturismo do Douro, que inclui a icónica adega e armazém de envelhecimento projectados por Siza Vieira (na foto, de Maria João Gala), um restaurante e o boutique hotel Casa das Pipas. Tudo conforme perspectivava Porter há 30 anos, quando apresentou o documento "Construir as Vantagens Competitivas de Portugal".