Três milhões de pessoas recebem menos de mil euros brutos? Os factos da nona noite de debates
Foram entregues à banca, entre 2008 e 2021, 30 mil milhões de euros. Em 2021, Ventura faltou à votação de um pacote anticorrupção. Taxa de carbono proposta pelo PAN já “arrecadou” mais de 90 milhões.
✔️“Temos três milhões de trabalhadores que em Portugal ganham até mil euros de salário bruto por mês. É mais de metade de toda a mão-de-obra” – Paulo Raimundo
Na parte do debate com o presidente da Iniciativa Liberal (IL), Rui Rocha, reservado à discussão sobre os salários e o crescimento económico, o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, afirmou que há três milhões de trabalhadores em Portugal com um salário bruto inferior aos mil euros mensais – o que, referiu, representa “mais de metade de toda a mão-de-obra”.
Consultemos as estatísticas mais recentes da página da Gestão de Remunerações do site da Segurança Social (de Novembro de 2023) para confirmar: existem 132.938 pessoas com remunerações-base inferiores aos 600 euros mensais, 1.639.316 entre os 601 e os 800 euros e 997.940 entre os 801 e os mil euros – dados sempre referentes ao trabalho dependente.
Somando tudo, há cerca de 2,77 milhões de pessoas, um número próximo, mas ligeiramente abaixo, do mencionado por Paulo Raimundo.
Tendo em conta que a mesma página indica que haverá 4.177.476 pessoas singulares com remunerações declaradas, os 2,77 milhões correspondem a cerca de 66,3% da mão-de-obra, ou seja, mais de 50%, como afirmou o secretário-geral do PCP.
✔️“O Tribunal de Contas disse que entre 2008 e 2021 foram entregues à banca 30 mil milhões de euros” – Rui Rocha
Durante o debate com o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, o presidente da Iniciativa Liberal (IL), Rui Rocha, afirmou que, segundo o Tribunal de Contas, tinham sido entregues ao sector bancário 30 mil milhões de euros entre 2008 e 2021.
Os números do Parecer sobre a conta geral do Estado, do Tribunal de Contas, confirmam-no: entre 2008 e 2021 a despesa com apoios públicos ao sector financeiro atingiu os 29.587 milhões de euros, um número próximo daquele que Rui Rocha mencionou no debate com Paulo Raimundo.
O dirigente da IL indicou ainda que o saldo final seria de 22 milhões de euros. Como as receitas obtidas com os apoios à banca totalizam 7538 milhões de euros, o “saldo desfavorável para o Estado” foi de 22.049 milhões de euros, confirmando o número mencionado por Rui Rocha.
✔️“No final de 2021 foi aprovado um pacote anticorrupção por unanimidade com a excepção de André Ventura” - Pedro Nuno Santos
Durante o debate que o pôs frente a frente com André Ventura, o secretário-geral do PS apontou que, ainda que o Chega faça do combate à corrupção uma das suas principais bandeiras, o líder do partido não esteve presente na votação de um pacote anticorrupção que acabou aprovado por unanimidade no final de 2021 – porque “preferiu estar num encontro com líderes de extrema-direita”, acusou o socialista.
O pacote mencionado por Pedro Nuno Santos foi aprovado a 19 de Novembro de 2019 e incluía medidas como a inibição de exercício de cargo até dez anos para funcionários e políticos corruptos e a inclusão na lei do crime de recebimento ou oferta indevidos de vantagem.
Na votação final global, o pacote de medidas foi aprovado por unanimidade, com ausência do Chega, na altura representado pelo deputado único André Ventura.
No dia anterior à votação – em que também faltou ao plenário da Assembleia da República – André Ventura tinha publicado uma fotografia no seu Instagram, na qual surge acompanhado por líderes da família política de direita radical Identidade e Democracia, em Bruxelas.
✔️“José Sócrates já recorreu 30 vezes” – André Ventura
No que considerou ser um “abuso do direito de recurso”, André Ventura mencionou que o antigo primeiro-ministro José Sócrates já tinha recorrido 30 vezes de decisões judiciais. Mas o número referido durante o debate pelo líder do Chega peca por defeito.
Em 2017, o PÚBLICO contabilizou que só entre 2015 e esse ano já tinham dado entrada no Tribunal de Relação de Lisboa 33 recursos ou reclamações por José Sócrates.
Segundo o jornal Eco e o Correio da Manhã, porém, o número actual é ainda superior: Sócrates já terá apresentado 52 recursos, reclamações, recusas ou escusas ao Tribunal da Relação e ao Supremo.
✔️“Na Madeira não há touradas, mas houve massacres da cabra das Desertas, tanto na Deserta Grande como no Bugio” – Rui Tavares
“Incoerência” foi a palavra usada pelo porta-voz do Livre, Rui Tavares, referindo-se ao apoio do PAN ao governo da Madeira quando na região autónoma, afirmou, “houve massacres da cabra das Desertas, tanto na Deserta Grande como no Bugio”.
Em 2022, o Instituto das Florestas e Conservação da Natureza da Madeira (IFCN) detalhou os principais resultados de um projecto que visava recuperar “espécies e os habitat na Deserta Grande e Selvagem Grande, através da erradicação dos animais e plantas introduzidos” pelos colonizadores dos territórios.
Sobre o caso particular das cabras o IFCN sublinhou que, apesar de “a erradicação total” não ter sido possível, o projecto conseguiu “a redução drástica do efectivo populacional de cabras na Deserta Grande, através do seu abate com armas de fogo”.
No Bugio, lê-se no relatório técnico final do projecto Life SOS freira-do-bugio, posto em prática de Fevereiro de 2006 a Dezembro de 2010, “após as campanhas de erradicação foram verificadas algumas cabras mortas e desde 2008 não foram observadas cabras em toda a ilha”. O mesmo documento conclui que a densidade de cabras na ilha “diminuiu drasticamente”, não pondo de parte a possibilidade de a espécie ter desaparecido.
Em relação à primeira parte da afirmação, segundo o Relatório da Actividade Tauromáquica de 2023, da autoria da Inspecção-Geral das Actividades Culturais, “na Região Autónoma da Madeira não se tem conhecimento de que sejam realizados espectáculos de natureza tauromáquica”.
✔️“Inserimos a taxa de carbono sobre a aviação que hoje” já arrecadou “mais de 90 milhões de euros” – Inês Sousa Real
Enquanto sublinhava o papel do seu partido na defesa do ambiente e no combate às alterações climáticas, a porta-voz do PAN, Inês Sousa Real, atribuiu ao seu partido a responsabilidade pela criação de uma taxa de carbono sobre a aviação, reforçando que a medida já arrecadou “mais de 90 milhões de euros”.
Foi, efectivamente, o PAN que fez a proposta de alteração ao Orçamento do Estado de 2021 que levou à criação de uma taxa de carbono de dois euros cobrada aos passageiros de “viagens aéreas, marítimas e fluviais”. A proposta foi assinada por André Silva, Bebiana Cunha e Inês Sousa Real e foi aprovada com votos a favor do PS, Bloco de Esquerda e PAN.
De acordo com o Jornal de Negócios, que teve acesso aos dados da Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC), esta taxa gerou até Outubro de 2023, 92,9 milhões de euros. Assim sendo, o número apresentado por Inês Sousa Real é verdadeiro.