Colecção de Mário Teixeira da Silva depositada em Serralves
Família do histórico galerista falecido em 2023 diz que contrato de depósito de longa duração assinado com museu do Porto vai dar máximo de visibilidade à colecção.
A colecção Mário Teixeira da Silva, que reúne obras de arte de mais de 200 artistas plásticos, vai ser entregue em depósito à Fundação de Serralves, com o contrato a ser assinado esta quarta-feira, anunciou a instituição.
A colecção, que foi construída pelo galerista Mário Teixeira da Silva (1947-2023) ao longo de cerca de cinco décadas, é marcada pela sua "diversidade", constituindo um dos "mais importantes reportórios fotográficos de arte contemporânea em Portugal", lê-se num comunicado de Serralves. O núcleo de fotografia foi exibido em Barcelona em 2004.
Entre os artistas representados na colecção a Fundação de Serralves destaca os portugueses Helena Almeida (1934-2018), Julião Sarmento (1948-2021), Pedro Casqueiro, António Júlio Duarte, Jorge Queiroz e João Jacinto. “As primeiras exposições que Helena Almeida teve fora do país foram derivadas das minhas presenças [nas feiras] em Bruxelas e Basileia”, comentou Mário Teixeira da Silva ao PÚBLICO quando mostrou pela primeira vez parte importante da sua colecção em 2022. “Lembro-me de receber um telefonema da Helena a dizer que eu era a única pessoa que podia mostrar o seu trabalho. É uma obra que encaixa perfeitamente na estética dos anos 70, nos conceptualismos todos, e para mim tinha ainda o significado acrescido de ser um trabalho em suporte fotográfico.”
Em 2022, parte da colecção de arte de Mário Teixeira da Silva foi exposta pela primeira vez em Portugal, no Museu de Arte Contemporânea - Museu do Chiado, em Lisboa, com curadoria de Adelaide Duarte.
A colecção Mário Teixeira da Silva inclui também núcleos de Gérard Castello-Lopes (1925-2011), Bernard Faucon, Charles Fréger, Oriol Maspons (1928-2013), Lisa Milroy, Jack Pierson, Sérgio Santimaro, Wolfgang Tillmans, James Welling e Francesca Woodmand (1958-1981).
Ao assinar o contrato de depósito de longa duração, Serralves vai ter oportunidade de "diversificar os seus próprios depósitos", bem como vai poder complementar a representação de alguns artistas já presentes na sua colecção, apresentar exposições monográficas ou temáticas e desenvolver novas bolsas de estudo e iniciativas educativas.
Na mesma nota, a família de Mário Teixeira da Silva considera que o depósito em Serralves vai permitir preservar e dar o máximo de visibilidade à sua colecção, ao espólio de um "dos mais importantes galeristas e promotor de talentos na arte em Portugal".
"Foi cumprida a vontade do meu irmão, já que a sua colecção ficará no museu de maior projecção nacional e internacional, garantindo a visibilidade e promoção da sua colecção. Serralves é para a família a opção mais consistente", declarou a irmã, Isabel Teixeira da Silva.
Para além deste depósito, o contrato prevê também a doação a Serralves de uma instalação do belga Wim Delvoye. Intitulada Chantier (1992), é, como o nome indica, um trabalho neo-conceptual que reproduz em madeira entalhada de gosto barroco um estaleiro de obras da construção civil, numa reflexão sobre o lugar contraditório do trabalho artesanal numa sociedade de produção massificada, sobre a circulação das imagens.
A assinatura do contrato de depósito da colecção é realizada esta quarta-feira, pelas 18h, no Museu de Serralves.
Módulo nasceu no Porto
Nascido no Porto, Mário Teixeira da Silva licenciou-se em Engenharia Química e tinha formação em Museologia, destacando-se ao longo de 50 anos tanto como galerista como coleccionador de arte.
Em Maio de 1975 abriu no Porto o Módulo - Centro Difusor de Arte e quatro anos depois concretizou a galeria em Lisboa, mantendo os dois pólos durante vários anos até se mudar, já neste século, para a capital. Pintura Habitada, a obra seminal que Helena Almeida fez em 1976, foi mostrada no Módulo, ainda no Porto, um ano depois de a galeria abrir. Além de Helena Almeida, como lembrou Sérgio Mah num texto do catálogo do Chiado, também Julião Sarmento e Fernando Calhau apresentaram os seus primeiros trabalhos em fotografia na galeria.
Serralves recordou, ainda, que "a ligação do coleccionador e galerista a Serralves remonta também à década de 70 do século passado, mesmo antes da criação da própria fundação, pois Teixeira da Silva colaborou vivamente com Fernando Pernes e Etheline Rosas no Centro de Arte Contemporânea sediado no Museu Soares dos Reis entre 1975 e 1979", que veio a dar origem à Fundação de Serralves.
Embora o galerista fosse generoso nos empréstimos que fazia das suas obras, só a exposição do Museu do Chiado, que contava com 175 obras, de artistas como Alberto Carneiro, Julião Sarmento, Hamish Fulton, Jochen Gerz, João Jacinto, Adriana Varejão e Wolfgang Tillmans, permitiu ao público perceber a verdadeira dimensão da colecção.
Na altura da exposição no Museu do Chiado, a curadora Adelaide Duarte explicou ao PÚBLICO que a maioria das obras da colecção não tinha tido origem no trabalho da galeria, sendo antes resultado “da sua atitude de flâneur e de amateur como coleccionador”. Mais recentemente, a colecção tinha passado a incluir nomes de artistas oitocentistas e modernistas como Henrique Pousão e Aurélia de Sousa, que extravasam a cronologia de Serralves.