Tribunal de Contas: financiamento da descentralização foi insuficiente e pouco claro em 2022

Juízes debruçaram-se sobre execução da transferência de competências e concluíram que verbas atribuídas pelo Governo às autarquias não acompanharam aumento da despesa.

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Mértola foi uma das autarquias analisada pelo Tribunal de Contas Rui Gaudencio
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O processo de transferência de competências da administração central para as autarquias locais tem sido longo, complexo e feito de avanços e recuos. Para os juízes do Tribunal de Contas (TdC), que olharam para os números, tem também sido marcado por pouca clareza e transparência, mas também pela escassez dos fundos que acompanham as novas atribuições.

Num relatório tornado público nesta segunda-feira, o TdC conclui que, ao longo de 2022, houve falta de critério no apuramento de verbas a transferir para as autarquias para descentralizar competências na área da Educação. No diploma sectorial que desenhava esse processo, apontam os juízes, os critérios não são estabelecidos “de forma clara, directa e transparente”.

O Tribunal de Contas analisou a execução financeira do processo de descentralização ao longo de 2022, tendo em atenção o papel do Governo e de vários serviços da administração central que participaram na transferência de competências. Seleccionou ainda os municípios de Albufeira, Amadora, Coimbra, Guimarães, Marinha Grande e Mértola para perceber como tinha decorrido o processo ao nível da administração local.

Olhando para a informação recolhida, os juízes concluem que “o financiamento das competências descentralizadas não foi suficiente face ao acréscimo de despesa em que os municípios incorreram com o seu exercício”. Acresce que, nesse mesmo ano, não houve mecanismos “que permitissem os municípios analisar e perceber os montantes das transferências financeiras relacionadas com as competências descentralizadas”, lê-se.

No entanto, os magistrados admitem que, com a publicação de diversas portarias e despachos que reforçaram essa mesma verba, a situação de insuficiência “terá sido corrigida” em 2023.

O problema da transparência também se aplica ao Fundo de Financiamento da Descentralização, que teve em 2022 o seu início de operação, nota o TdC. Os relatores referem que o quadro legal sob o qual funciona o fundo “não é suficientemente claro, necessitando de aperfeiçoamentos”.

Esta não é a primeira vez este tribunal se debruça sobre o processo de transferência de competências. No entanto, ao analisar este novo ciclo de 2022, não encontrou evidências de que o seu curso esteja sustentado em “estudos técnicos, independentes ou científicos”. Estes documentos poderiam ter ajudado a tomar decisões nas fases de concepção e implementação do processo, escrevem os juízes.

Os relatores também não ficaram indiferentes aos "trâmites burocráticos redundantes”. Na educação, exemplificam, a descentralização não foi sinónimo de simplificação administrativa que libertaria tempo e recursos para actividades curriculares e pedagógicas.

Havia um argumento que estava na base de todo este processo de passagem de pastas: a proximidade levaria a uma melhor gestão e eficiência da despesa pública. No entanto, pelo menos até ao início de 2023, não foi possível aferi-lo, regista o tribunal. Como os municípios “ainda revelam muitas dificuldades na aplicação da contabilidade de gestão”, as “operações relacionadas directamente com o processo de descentralização não foram contabilizadas à parte. Ou seja, não é possível perceber a eficácia e eficiência “na gestão dos recursos públicos descentralizados e, portanto, efectuar uma avaliação de desempenho”.

Os juízes recomendam ao Governo que ajuste a lei das finanças locais e os diplomas sectoriais da descentralização para tornar o financiamento deste processo mais claro, mas também que introduza na lei mecanismos que tenham em conta as diferenças entre cada município.

Na lista de recomendações que o TdC endereça às entidades auditadas, os juízes incluem ainda a alteração do Fundo de Financiamento da Descentralização, para que as transferências a realizar a partir deste meio sejam mais transparentes e para que os valores a pagar a cada município sejam adequados às competências descentralizadas.

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