Morreu Arno Penzias, físico que confirmou a teoria do Big Bang

Em 1978, Arno Penzias ganhou o Prémio Nobel da Física pela descoberta da radiação cósmica de fundo juntamente com o astrónomo Robert Wilson, colega dos Laboratórios Bell.

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Penzias e Wilson junto à antena que lhes permitiu descobrir a radiação cósmica de fundo NASA
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Arno A. Penzias, físico que ajudou a confirmar a teoria do Big Bang e laureado com o Prémio Nobel, morreu na segunda-feira aos 90 anos, em São Francisco, na Califórnia (EUA), devido a complicações da doença de Alzheimer de que sofria há vários anos.

Nascido a 26 de Abril de 1933 em Munique, foi quando era ainda uma criança que Arno Allan Penzias, filho de pais judeus, fugiu da Alemanha nazi para Inglaterra e, depois, para os Estados Unidos. Formou-se em física em Nova Iorque e, anos mais tarde, em 1978, ganhou o Prémio Nobel da Física pela descoberta da radiação cósmica de fundo juntamente com o astrónomo Robert Woodrow Wilson, colega dos Laboratórios Bell, nos Estados Unidos, uma das descobertas mais marcantes da ciência moderna que veio confirmar a teoria do Big Bang sobre a criação e evolução do Universo.

Recuemos até 1961, ano em que Arno Penzias começou a trabalhar nos Laboratórios Bell. A sua intenção era utilizar uma antena que estava a ser desenvolvida para comunicações por satélite como um radiotelescópio para fazer medições cosmológicas, destaca o jornal The New York Times.

“A primeira coisa em que pensei foi estudar a galáxia [a Via Láctea] de uma forma que mais ninguém tinha sido capaz de fazer”, disse o físico, numa entrevista de 2004 à Fundação Nobel.

Em 1964, enquanto preparavam a antena para medir as propriedades da Via Láctea, Arno Penzias e Robert Wilson depararam-se com uma interferência estranha — foi assim que ambos descobriram a radiação cósmica de fundo, remanescente de uma “explosão” que deu origem ao Universo (conhecida como Big Bang) há cerca de 14 mil milhões de anos.

Pombos, os culpados?

A descoberta da radiação cósmica de fundo ocorreu, portanto, de forma acidental. Isto porque a tal interferência estranha parecia uniforme, um sinal que parecia vir de toda e qualquer direcção para onde quer que a antena apontasse no céu, o que seria prova de uma suposta distribuição homogénea da matéria nos primeiros momentos do Universo. Isso levou Penzias e Wilson a pensarem que a interferência tinha origem terrestre e poderia até ser causada por pombos em cima da antena.

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Arno Penzias ajudou a confirmar a teoria do Big Bang AIP/Emilio Segrè Visual Archives/Physics Today Collection

Quando os dois investigadores se convenceram de que o sinal era real e vinha do Universo, discutiram as suas descobertas com outros cosmólogos, entre os quais Robert Dicke, da Universidade de Princeton, que andava a tentar provar precisamente que o Big Bang tinha deixado vestígios de radiação cosmológica. Foi Robert Dicke que sugeriu que se tratava da radiação cósmica de fundo em microondas: um eco do Big Bang, que deu origem ao Universo.

A teoria do Big Bang — que até então era vista mais como uma questão filosófica do que real — foi confirmada e tirou o lugar à teoria de que o cosmos era algo estável. O Universo não era, afinal, infinitamente velho e estático como se pensava anteriormente, mas tinha havido, sim, uma explosão primordial que deixou o Universo banhado em radiação cósmica de fundo.

Mais tarde, o satélite norte-americano Cobe, lançado em Novembro de 1989, detectou pequenas flutuações que explicavam como apareceram as estrelas, planetas e galáxias — por outras palavras, estas flutuações representavam as variações na radiação e na distribuição da matéria (as microondas).

“O Universo surge do nada num instante e, como astrónomo, observo que continuará a expandir-se para sempre, com um pouco mais de matéria do que de antimatéria... Por razões que não compreendemos. Para mim, a existência de matéria escura não é necessária [para descrever o Universo]; deixo a inflação cósmica e essas coisas para os físicos teóricos”, disse Arno Penzias numa entrevista ao El País há 30 anos, em 1994, três décadas depois da sua descoberta.

O nome de Arno Penzias ficará, portanto, na história da cosmologia depois de o físico ter ajudado a desenterrar aquilo a que se pode chamar um fóssil do Big Bang — um feito que possibilitou depois à comunidade científica estudar com precisão a origem do Universo e tentar compreender qual será o seu destino.

A “fotografia” mais antiga do Universo

O físico português Carlos Fiolhais sublinha ao PÚBLICO que Arno Penzias fez, acidentalmente, com Robert Wilson, uma das maiores descobertas científicas do século XX: a radiação cósmica de fundo, que forneceu uma confirmação maior da teoria do Big Bang”.

“O Universo tem, por todo o lado, um registo de quando era ‘bebé’: tinha 380.000 anos quando apareceram os primeiros átomos por todo o lado, com a junção dos electrões aos núcleos atómicos. Hoje já tem 13.800 milhões de anos. Penzias e Wilson tiraram o que podemos chamar a fotografia mais antiga do Universo”, explica Carlos Fiolhais, acrescentando que Penzias é autor do livro Ideias e Informação, um dos primeiros livros da colecção Ciência Aberta, da editora Gradiva.

O físico português destaca ainda que “antes de haver átomos o mundo era escuro e não podia ser ‘fotografado’”. “O brilho que hoje vemos com microondas, na Terra e no espaço, é um ‘fóssil’ da formação dos primeiros átomos, hidrogénio e hélio”, diz.

Carlos Fiolhais recorda que Arno Penzias e Robert Wilson “estavam a instalar antenas para comunicações de satélite, em Nova Jersey, por conta dos Laboratórios Bell”, tendo descoberto “um ruído praticamente igual por todo o lado que apontassem”. “Não sabiam o que era e queriam ver-se livres daquilo, que só perturbava as comunicações. Limparam as antenas, pois podia ser excrementos de aves. Só num contacto com outro físico de Princeton, ali próximo, é que souberam o que devia ser, um ‘fóssil’ da formação dos primeiros átomos, hidrogénio e hélio”, lembra o físico português.

A hipótese haveria de ser amplamente confirmada. “Há quem ganhe o Nobel por procurar algo. Nós ganhámos por nos querermos ver livres de uma coisa”, afirmou Penzias, segundo recorda Carlos Fiolhais. Certo é que “estavam, com atenção, no sítio certo e na hora certa”. E, segundo o físico português, Arno Penzias será para sempre recordado.

“Houve um dia em que não houve ontem”

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