Zona de protecção do Douro Património Mundial divide-se em duas

Até agora, qualquer obra na região demarcada dependia do aval da Cultura. Daqui para a frente, só haverá pareceres obrigatórios para a zona classificada e a sua zona tampão.

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Zona de protecção do Património Mundial, situado em torno das margens do Douro, deixa de abranger toda a região demarcada Nelson Garrido
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Treze anos depois de ser criada à luz da lei portuguesa, a Zona Especial de Protecção do Douro Património Mundial dividiu-se em duas: os 225 mil hectares da Região Demarcada do Douro continuam, de alguma forma, a proteger o bem classificado pela UNESCO, mas as restrições aos licenciamentos urbanísticos passarão apenas a ser aplicadas a uma área bem menor, que envolve os 25 mil hectares que ficam dentro das fronteiras do Património Mundial. Uma portaria publicada esta terça-feira no Diário da República institui assim três esferas de gestão e de ordenamento do território do Douro: a zona classificada, a zona 1 que mantém regras rígidas de protecção e a zona 2 que vai manter apenas restrições para a salvaguarda da paisagem, sem medidas especiais para os licenciamentos nas áreas urbanas.

Há muito tempo que autarcas e empresários se queixavam do “exagero” da zona de protecção, que obrigava os habitantes de aldeias ou vilas que chegam a ficar a 30km do Património Mundial a solicitar pareceres à Direcção Regional da Cultura para poderem, por exemplo, construir uma marquise. As mudanças, fizeram-se “num clima de consenso”, diz Célia Ramos, vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento (CCDR) do Norte e tiveram como força motriz a Missão Douro, que funciona em sede da Comissão, a Direcção Regional da Cultura do Norte e a Comissão Intermunicipal do Douro – apesar de várias tentativas, não foi possível obter a opinião de Carlos Silva Santiago, presidente em exercício do organismo.

No período da consulta pública à mudança, a delegação portuguesa do Icomos, Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios, “manifestou o seu desconforto” com as mudanças, não tanto pela subdivisão do mapa do Douro em zonas distintas de protecção, mas por considerar que 22 anos depois da classificação da região continua a faltar uma “metodologia consistente” para gerir a delimitação, faz notar Célia Ramos. Mas a Comissão Nacional da UNESCO aprovou as mudanças. O parecer obrigatório da DRCN a todas as intervenções urbanas de toda a região demarcada estava a gerar “enormes encargos administrativos” e “ineficiências de gestão”, frisa a vice-presidente da CCDRN.

As mudanças impostas pela Portaria 122/2024 acabam por traduzir as conclusões de um período experimental de uma legislação que teve de ser criada de novo para responder às exigências da UNESCO. Quando o Alto Douro Vinhateiro foi declarado Património da Humanidade, em 2001, não havia na lei portuguesa enquadramento para acolher a sua natureza especial: o Douro foi classificado como “paisagem cultural evolutiva e viva”, o que acaba por o transformar num bem “híbrido” que acolhe a dimensão natural e patrimonial, sem ter características específicas de uma “reserva natural”, nem de um monumento facilmente identificável. Logo na altura, e em cumprimento das regras da UNESCO, foi criada uma “zona tampão” em torno da área classificada, mas a legislação nacional só incorporou essa realidade em 2011.

Com a polémica da barragem de Foz Tua como pano de fundo, nesse ano o legislador preocupou-se em alargar essa “zona tampão” a todo o Douro. De imediato se levantaram vozes contra o excesso de protecção, impondo-a a localidades que, estando no perímetro da área demarcada para a produção de vinhos do Douro e do Porto, nada têm que ver com a paisagem cultural classificada. A portaria que acaba de ser publicada é uma resposta a esses desconfortos.

Assim, na zona classificada e na zona 1 que a envolve, as restrições mantêm-se. Continua a ser exigível um parecer da Direcção Regional da Cultura, que agora funciona na órbita da CCDRN – apesar de, em alguns casos, exigir intervenção do novo Instituto do Património. A colocação de uma simples cobertura numa casa ou o muro de um quintal continuam a ser sujeitos a parecer prévio da DGCN. Na zona 2, essas exigências deixam de se aplicar. O que continua a ser objecto de acompanhamento e autorização da CCDRN são alterações paisagísticas – ou operações urbanas que exijam declaração de impacte ambiental, como nas restantes áreas do país. Uma nova plantação ou reestruturação de vinha, por exemplo, continuam a depender da validação da Comissão.

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