Registo nacional de 2020 confirma impacto negativo da pandemia nos cuidados do cancro
Os cancros da mama, colorrectal, próstata e pulmão foram os mais frequentes em 2020. Nas mulheres prevaleceu o da mama e nos homens o da próstata, refere o Registo Oncológico Nacional.
A pandemia da covid-19 teve um impacto negativo na prestação de cuidados do cancro em 2020, confirma o Registo Oncológico Nacional (RON) divulgado nesta segunda-feira e que previa o aparecimento de mais casos face aos que foram registados.
As previsões para 2020 – ano fortemente marcado pela pandemia – apontavam para 60.000 a 65.000 o número de novos casos de cancro, tendo sido registados 52.723, menos 9% o que em 2019, e uma diferença de 15 a 24% face ao previsto.
Em declarações à agência Lusa, a coordenadora do RON, Maria José Bento, mostrou-se preocupada com os atrasos no diagnóstico e no tratamento, algo que, disse, "deverá ter expressão nos dados de 2021 ou 2022, traduzindo-se em mais morbilidade e mortalidade" por cancro.
Interrupção dos rastreios
"Uma das explicações está na interrupção dos rastreios. Há patologias onde o diagnóstico precoce é muito importante para o sucesso do tratamento e para mais probabilidades de sobrevivência. Isto provavelmente vai-se reflectir nos anos seguintes em pior morbilidade e maior mortalidade", considerou.
A também directora do serviço de Epidemiologia do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto destacou, além da paragem e diminuição dos rastreios, o facto das pessoas, sobretudo ao longo da primeira vaga de covid-19, se terem resguardado mais e terem procurado menos o médico de família.
"Para situações com sintomatologia mais forte, cancro mais avançado, as pessoas continuaram a dirigir-se aos serviços de saúde. Pessoas com novas suspeitas não recorreram aos cuidados de saúde da mesma maneira até porque muitos hospitais – não foi o caso do IPO – eram hospitais covid-19. Houve diminuição dos diagnósticos", analisou.
Dando o exemplo do IPO do Porto, a especialista referiu que o grande impacto na diminuição dos diagnósticos aconteceu na primeira vaga de Março a Maio. "Já na segunda e na terceira vagas os serviços parecerem mais resilientes", observou Maria José Bento.
Os cancros mais frequentes
Segundo a epidemiologista, a diminuição do número de casos de cancro foi transversal ao sexo, faixa etária e a todos os distritos do país. A diminuição foi mais evidente nos cancros do estômago, do cólon, do recto, do pulmão, da mama, da próstata e da tiróide.
O número de novos casos de cancro registado em 2018 foi 50.428. Já em 2019 foram registados 57.878 novos casos, mais 15% face ao ano anterior. Em 2020, o RON – registo alimentado de informação de todos os hospitais públicos e privados – tem 52.723 novos casos registados. Destes, 54% foram em homens, 40% em pessoas com idade entre os 60 e os 74 anos e 7,5% em pessoas com menos de 45 anos.
Os cancros mais frequentes foram o cancro da mama, colorrectal, próstata e pulmão. O cancro da mama representa 31% do cancro na mulher, e o cancro da próstata representa 11% do cancro no homem. "Nada foge ao padrão habitual, nem nas patologias de cancro, nem no sexo, nem nas idades", afirmou Maria José Bento.
O RON 2020 mostra que a taxa de novos cancros é superior nos distritos do litoral no continente. A especialista acredita que "os estilos de vida, nomeadamente os hábitos tabágicos". Soma-se, em termos de análise territorial, maior percentagem de novos casos de cancro na Região Autónoma da Madeira.