ERC impede Chega de discriminar jornalistas freelancer no acesso à convenção
Jornalista Miguel Carvalho não recebeu creditação para cobrir a convenção do Chega. Partido justificou que repórteres freelancer não tinham prioridade. Regular aponta discriminação.
A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) determinou esta quinta-feira que o Chega não pode conceder tratamento preferencial a jornalistas afectos a órgãos de comunicação social, em detrimento de profissionais freelancer, no processo de credenciação para a cobertura noticiosa da convenção do partido.
A deliberação vem responder a uma queixa apresentada pelo jornalista Miguel Carvalho, a quem o partido disse que teria de "aguardar pelo encerramento das acreditações para saber se poderá ir ou não" à convenção, que se realiza este fim-de-semana em Viana do Castelo, justificando que os "jornalistas afectos a um OCS [órgão de comunicação social] têm primazia sobre os freelancers".
A decisão do regulador, tomada em tempo recorde para poder ser aplicada no evento político em causa, aponta que o incumprimento dessas regras — violando o direito de acesso dos jornalistas a espaços públicos, acessíveis ao público e a que a comunicação social deve aceder para garantir a cobertura informativa — pode traduzir-se num crime de desobediência e num crime de atentado à liberdade de informação.
A justificação do Chega para não garantir a entrada do jornalista na convenção do partido foi apresentada pela assessora daquela força política, Patrícia Carvalho, através de mensagens trocadas no WhatsApp. Miguel Carvalho apresentou o caso à ERC — cujo conselho regulador, numa reunião extraordinária, deliberou que o sistema de credenciação da convenção não pode discriminar os jornalistas em função da sua condição profissional.
"É designadamente ilegítimo o estabelecimento de regras ou critérios com os quais se pretenda conferir primazia na acreditação a jornalistas afectos a um dado órgão de comunicação social, em face e em detrimento de jornalistas freelancer", determinou o regulador, acrescentado que o sistema de credenciação "deve garantir as necessárias condições de igualdade e não discriminação a todos os órgãos de comunicação social e jornalistas".
Miguel Carvalho foi repórter na revista Visão desde 2000 e até recentemente, depois de também ter sido jornalista no Diário de Notícias e n'O Independente. Exerce agora jornalismo como freelancer — sem um vínculo laboral exclusivo a um órgão de comunicação social. Venceu o Grande Prémio Gazeta, do Clube dos Jornalistas, em 2010, graças à reportagem "Os segredos do Barro Branco”, sobre Joaquim Ferreira Torres, o autarca de Murça que resistiu à revolução do 25 de Abril de 1974 e veio a ser morto em 1979 no Barro Branco, em Paredes. Voltou a vencer o Prémio Gazeta graças à investigação "O braço-armado do Chega", sobre as ligações das forças de segurança ao partido.