Bloco abre porta a nova “geringonça” e deixa caderno de encargos para negociar acordo
Mariana Mortágua diz que quer formar uma maioria de esquerda para solucionar o que a maioria absoluta do PS “não soube resolver”.
O Bloco de Esquerda (BE) assume-se disponível para negociar uma nova "geringonça" após as eleições legislativas de 10 de Março e já tem um longo caderno de encargos para exigir ao PS, com o aumento de salários e respostas para a habitação à cabeça, de forma a "reverter as escolhas da maioria absoluta".
A decisão foi tomada esta quinta-feira à noite pela comissão política do BE e apresentada por Mariana Mortágua esta sexta-feira. Falando a partir da sede nacional, em Lisboa, a coordenadora do partido revelou que o Bloco "assume o compromisso da negociação de um acordo de maioria para um programa de governo que faça aquilo que nunca foi feito".
"O voto no Bloco é um garante de que Portugal vai ter uma maioria comprometida com um programa de esquerda e medidas que solucionem os problemas que a maioria absoluta não soube resolver e agravou", acrescentou.
A bloquista justificou o anúncio com o facto de "a clareza sobre o dia seguinte" às eleições ser "uma condição da escolha informada e uma exigência democrática" e defendendo que o BE "assume a responsabilidade de informar os eleitores ao que vem". A campanha eleitoral "não pode ser sobre acordos escondidos, programas que ninguém viu e entendimentos que ninguém conhece", disse.
Mortágua começou por fazer um balanço da maioria absoluta do PS, argumentando que “caiu por responsabilidade própria” e que "a instabilidade e a promiscuidade entre a gestão pública e os interesses privados são apenas uma parte desse processo de degradação política”, visto que se “enredou na própria incapacidade de resolver problemas e agravou a crise social”.
Apesar disso, mostra-se disponível para um entendimento com os socialistas por considerar que "Portugal precisa de soluções" para esses problemas. Mas avisa que "a mera soma de deputados não faz só por si uma maioria estável", sendo necessárias "medidas concretas que revertam e corrijam as escolhas da maioria absoluta do PS".
E garante que "é preciso hoje muito mais" do que em 2015, altura em que os bloquistas fizeram um acordo com o PS, porque já não está apenas em cima da mesa "reverter as medidas da direita", antes solucionar a crise da saúde, educação, da habitação ou dos salários.
"É com base nessas propostas que assumimos a responsabilidade de abrir caminhos de diálogo, de clareza, de mobilização para concretizar medidas que façam do 10 de Março o início de uma mudança decisiva em Portugal", vincou, desafiando os restantes partidos a também "dizerem ao que vêm" e o que "querem para o país" no início da campanha eleitoral e num "cenário em que ninguém quer uma maioria absoluta".
Questionada pelos jornalistas sobre se já falou com Pedro Nuno Santos, divulgou que apenas o cumprimentou após ter sido eleito secretário-geral do PS. Quanto à hipótese de o BE aceitar um acordo de incidência parlamentar ou integrar o Governo, Mortágua respondeu apenas que quer "negociar medidas concretas" e que "este não é o momento" para essa questão.
As "medidas concretas" do BE
Os "temas essenciais" para negociar esse acordo são seis e farão parte do programa eleitoral que o Bloco vai aprovar e apresentar a 20 de Janeiro. Em primeiro lugar, os bloquistas defendem um "aumento real dos salários" com "novas regras de combate à precariedade", "mecanismos de contratação colectiva" e uma redução do horário de trabalho.
Na área da habitação, Mortágua enumerou a descida do preço das casas, dos juros e das rendas, o aumento da oferta pública de habitação e o combate à especulação. Defendeu ainda "cuidados dignos na infância e na velhice" e, quanto à saúde, um "acesso universal" através de um "serviço público capaz de atender todas as pessoas com a melhor qualidade e no tempo necessário". Para isso, o BE propõe "reformar o SNS", aumentando o investimento, criar "mais condições para atrair" profissionais e implantar novas valências.
"Recuperar a escola pública" é outra das exigências dos bloquistas que querem "melhores condições de remuneração e carreira" para os professores, reduzir a "burocracia" e aumentar a "participação", mas também reconhecer o tempo integral de serviço dos professores.
Também o clima faz parte do caderno de encargos e, nessa área, Mortágua salientou que, em vez de "penalizar quem tem menos", aumentando o IUC, ou de manter a "extracção mineira" e a "agricultura intensiva", o próximo Governo deve ter um "programa para a justiça climática" que reduza emissões e crie um "programa industrial de emprego qualificado".