Arquivos de Gaza destruídos: “uma grande parte da memória palestiniana” foi “apagada”

Relatórios da comissão palestiniana do ICOMOS continuam a listar os sítios patrimoniais da Faixa de Gaza destruídos pela ofensiva israelita, apesar das dificuldades em recolher informação.

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Mesquita destruída em Gaza logo após o início dos ataques israelitas IBRAHEEM ABU MUSTAFA/Reuters

Continuam a suceder-se os casos de destruição de património cultural na Faixa de Gaza, alguns dos quais ocorridos após a semana de tréguas entre Israel e o Hamas, que terminou a 1 de Dezembro. A conclusão consta de um novo relatório da comissão palestiniana do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS, na sigla inglesa), que esta semana actualizou a informação preliminar divulgada no final do mês passado, e que dava já conta da destruição parcial ou completa de pelo menos nove sítios patrimoniais naquele território, em resultado da ofensiva israelita em curso.

O relatório anteriormente avançado apontava, entre outras baixas, o caso dos Arquivos Centrais de Gaza. Milhares de documentos históricos com mais de 150 anos foram queimados e convertidos em cinzas, tendo assim sido apagada uma grande parte da memória palestiniana”, indicava o ICOMOS.

Shireen Allan, presidente da comissão palestiniana do ICOMOS, já adiantara ao Art Newspaper ser provável que a dimensão dos danos excedesse a reportada no relatório preliminar. “Os parâmetros para incluirmos sítios patrimoniais no relatório são muito exigentes. Por norma, confirmamos [a destruição] através de visitas ao local e de fotografias”, explicava então, acrescentando que neste momento é muito difícil ir ao terreno fazer esse tipo de levantamento. Mas o curto período de tréguas, disse, permitiu ao ICOMOS, em colaboração com as autoridades palestinianas, fazer algumas avaliações.

O relatório de 30 de Novembro elencava a destruição total do mercado de Al-Zawiya, “um dos mais antigos no centro da Cidade de Gaza”, de um centro cultural e de um palácio e de uma casa históricos. Reportava, também, danos no Hospital Árabe Al-Ahli, “um dos mais antigos” na região, na Igreja de São Porfírio de Gaza e em duas mesquitas, entre as quais a Grande Mesquita de Gaza, “a maior e mais antiga” do território.

“A mesquita era um símbolo para as pessoas de Gaza”, afirmou ao Art Newspaper Jehad Yasin, do Ministério palestiniano do Turismo e das Antiguidades, onde tem a seu cargo as pastas do património arqueológico e dos museus. “Acho que as pessoas sentem que a ocupação [israelita] pretende destruir a nossa herança. Aquilo que para nós é um símbolo ou identidade, eles querem destruir.”

O relatório desta terça-feira refere, por exemplo, que metade da antiga câmara municipal terá sido destruída. Menciona também ataques a três outras mesquitas (uma delas, a Othman bin Qashqar, era “um dos sítios arqueológicos mais antigos na Faixa de Gaza” e terá sido totalmente destruída) e à “única igreja católica” no território.

As avaliações da comissão palestiniana do ICOMOS, que enfatiza não ser possível ter uma noção completa dos estragos enquanto não houver um “cessar-fogo permanente”, surgem depois de, no início do mês passado, a organização não-governamental espanhola Heritage for Peace ter publicado um relatório em que dava conta da destruição de mais de cem sítios patrimoniais e locais históricos desde 7 de Outubro, dia em que o Hamas lançou a sua ofensiva-surpresa contra Israel.

Entre os locais identificados estava, por exemplo, o porto de Anthedon, um dos três sítios de Gaza que integram a Lista Provisória do Património Mundial da UNESCO. Jehad Yasin disse ao Art Newspaper que o porto está “completamente destruído”.​

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