Sem parágrafo da PGR, Costa ter-se-ia demitido por causa do dinheiro encontrado em São Bento

“Devia ter-se feito tudo menos uma crise política”, diz Costa sobre Marcelo: “Fez uma avaliação errada e só espero que das eleições de Março resulte uma situação mais estável do que a que temos hoje.”

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António Costa é entrevistado pela 16.ª vez na TVI desde as legislativas de 2015 LUSA/ANTÓNIO COTRIM
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Se não tivesse havido o parágrafo do comunicado do Ministério Público que anunciava a existência de uma investigação ao primeiro-ministro, provavelmente António Costa teria pedido demissão por causa de outros "factos novos" da Operação Influencer, nomeadamente o "dinheiro encontrado" escondido na sua residência oficial, na sala do seu então chefe de gabinete, Vítor Escária, de que só se soube no dia seguinte.

Ou teria esperado até ao final do processo de buscas, e depois avaliar a sua possibilidade para continuar, dependendo da decisão do juiz de instrução, afirmou António Costa na entrevista à TVI/CNN Portugal nesta segunda-feira. Porém, também fez questão de realçar que o juiz deixou cair as suspeitas dos crimes de corrupção e de prevaricação.

Costa contou ainda que na reunião que teve com o Presidente da República às 9h30 de 7 de Novembro, quando soube das buscas, quis "expor as dúvidas" e ouvir a sua opinião. Porém, quando a procuradora-geral da República "oficializou uma suspeita" sobre si com um "parágrafo acrescentado", então, falou com a mulher, "uma voz de serenidade", decidiu e falou com Marcelo Rebelo de Sousa novamente já com a decisão tomada. "Para protecção do cargo que exerço, a situação exigia a minha demissão. (...) A dignidade da função não é compatível com a suspeição oficializada com aquele comunicado." Foi um "acto de verticalidade", defendeu.

"Estou magoado, mas estou conformado. Aguardo o que a Justiça vai fazer: se vai mesmo avançar com o inquérito, se vou ser constituído arguido (...) Eu sei o que fiz e o que não fiz. Não tenho a menor dúvida que isto acabará com uma não-acusação, com um arquivamento ou absolvição se chegarmos à fase de julgamento. Tenho a minha consciência absolutamente tranquila", reiterou António Costa. Que recusou avaliar o trabalho da procuradora-geral ou do Ministério Público e defendeu o seu estatuto de autonomia único na Europa, mas também fez questão de dizer que distingue "bem" o agente A ou B que não aja correctamente do conjunto da Justiça.

Presidente fez "avaliação errada"

O primeiro-ministro demissionário insistiu na ideia de que, apesar do seu caso, continua a acreditar no sistema de Justiça, reiterou não saber qual a suspeita de que é alvo e esperar que o seu caso seja tratado "com a diligência possível". A bem da confiança dos portugueses nas instituições e da imagem internacional do país.

Mas não se coibiu de voltar a criticar a opção de Marcelo Rebelo de Sousa pela marcação de eleições: “Devia ter-se feito tudo menos uma crise política.” O Presidente "fez uma avaliação errada e só espero que das eleições de Março resulte uma situação mais estável do que a que temos hoje”, disse Costa, recusando qualquer ironia neste comentário, mas acrescentando não acreditar "em nenhuma que não tenha o PS".

"Perdeu-se uma boa oportunidade de gerir a estabilidade", apontou, criticando a "teorização" que Marcelo iniciou quando lhe deu posse e que não há nenhuma obrigatoriedade constitucional de ir para eleições se saísse do executivo. "Tínhamos uma alternativa que era credível; havia vários nomes (...) que podiam ter assegurado um bom governo."

Costa reiterou a necessidade de o PS se manter "à parte desta história" e apostar no balanço destes anos de governação, em "ter um programa renovado e uma nova liderança com nova energia". Aproveitando para apontar baterias ao PSD com o exemplo dos Açores, que descreve como "uma barafunda que nem três anos durou. Foi um ensaio geral do que o PSD quer fazer a nível nacional. Um fiasco." No PSD, Costa só vê "palavras e gente do passado", ironizando: "O melhor que têm para dar energia e dinâmica ao partido é irem buscar o dr. Cavaco Silva."

Entretanto, o PS emitiu esta noite um comunicado sobre o que classifica como “implosão do Governo” açoriano liderado pelo PSD, com a dissolução do parlamento regional, considerando que “demonstra o claro fracasso do ensaio geral da grande aliança da direita”. “O fracasso nos Açores ilustra o fracasso que representaria um Governo da República suportado pelo PPD/PSD, Chega e Iniciativa Liberal” a nível nacional, acrescenta a nota à imprensa, como que replicando o que António Costa acabara de dizer na entrevista à TVI/CNN.

Sobre a campanha eleitoral das legislativas, diz que participará como o próximo líder do PS entender que "deva fazer" e garante não ter mesmo preferência entre o candidato a secretário-geral. Mas defende que quem vier deve "fazer um balanço do que correu bem e mal", encontrar novas respostas e abordagens para os problemas.

António Costa defendeu o seu legado na Saúde com estatísticas e com a reforma que fica pronta a executar a partir de Janeiro, seja na organização dos cuidados de saúde, seja com o acordo, ainda que parcial, com os sindicatos dos médicos. Sobre a Educação, o ainda primeiro-ministro relativizou a importância do Pisa devido aos efeitos da covid nas aprendizagens e procurou desmistificar a ideia de que o Governo não tomou muitas medidas para os professores, elencando uma série de decisões sobre as carreiras e os salários. E defendeu a privatização de pelo menos 51% da TAP.

Admitiu-se "frustrado" por, por duas vezes, não ter conseguido levar as legislaturas até ao fim e defendeu que as contas certas são a forma de dar liberdade aos portugueses para escolherem o que fazer com o excedente orçamental, seja baixar impostos, subir salários, investir. O PS, consigo, escolheu uma "política equilibrada".

Como pior momento da sua vida política, Costa escolheu o dia 17 de Junho de 2017, devido aos incêndios de Pedrógão, e a decisão de que se poderá arrepender será a de confiar no PSD se este não decidir sobre o aeroporto. Antes dissera que este dossier "é um grande teste à credibilidade do PSD" e explicou que tem inveja de não poder decidir porque seria uma das raras vezes em que o faria com tanta informação técnica.

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