Israel impede recolha de água da chuva a palestinianos na Cisjordânia
Em algumas áreas da Cisjordânia, o exército israelita destrói cisternas de recolha de chuva de comunidades palestinianas. Em Gaza, “Israel não tem controlo sobre a utilização de fontes de água”.
A publicação
Contexto
Diversos utilizadores de redes sociais, como o X (antigo Twitter) e o Instagram, têm mostrado indignação com o facto de, alegadamente, Israel ter proibido os palestinianos na Cisjordânia e em Gaza de recolherem água da chuva.
Inclusivamente, há quem mencione um suposto relatório da ONU que indicará que “a chuva é propriedade das autoridades israelitas e, portanto, os palestinianos estão proibidos de recolher água da chuva para necessidades domésticas ou agrícolas”.
Uma utilizadora escreve que os “palestinianos na Cisjordânia não só estão proibidos por Israel de recolher água da chuva, como todas as cisternas encontradas são destruídas”. Outro diz ter descoberto que Israel “é dono da água que cai em Gaza”.
Os factos
No site da Autoridade da Água Palestiniana (PWA, na sigla em inglês), pode consultar-se (com recurso a Wayback Machine, já que a página não está funcional) uma lista de ordens militares impostas por Israel em relação à utilização de água.
A ordem militar n.º 158, de 1967, proibia os palestinianos de construir novas instalações de água sem permissão prévia do exército israelita. A ordem n.º 948 reforçava que qualquer cidadão da Faixa de Gaza precisa da “aprovação de um comandante do exército israelita antes de implementar um projecto hídrico”.
No entanto, como escreveu a Amnistia Internacional num relatório de 2022, estas ordens militares, no presente, apenas têm efeito sobre os palestinianos em parte da Cisjordânia que se mantém sob controlo administrativo e de segurança israelita. Desde 2005, quando aconteceu a retirada de Israel da Faixa de Gaza, que a maioria destas não é válida no território. “Palestinianos [nas restantes áreas da] Cisjordânia e Faixa de Gaza estão, adicionalmente, sujeitos às leis palestinianas”, refere o mesmo documento da Amnistia.
“Israel não tem controlo sobre a utilização de fontes de água em Gaza, exceptuando, por exemplo, a venda de água à Faixa de Gaza ou a permissão de introdução de combustível e materiais em estações de bombeamento ou centrais de tratamento de águas residuais”, esclareceu Dror Sadot, porta-voz do B’Tselem, uma organização sem fins lucrativos cujo objectivo é documentar violações de direitos humanos nos territórios palestinianos ocupados por Israel, em declarações enviadas por e-mail ao PÚBLICO.
Um comunicado das Nações Unidas de 2011 – não o que é mencionado pelos utilizadores das redes sociais – refere que o Gabinete para a Coordenação de Assuntos Humanitários “registou a demolição de 27 cisternas de água e outros sistemas de recolha de água da chuva na Cisjordânia”. A Amnistia Internacional, em 2022, confirmou que tal continuava a acontecer: “Israel controla até a recolha de água da chuva na maior parte da Cisjordânia e o exército israelita costuma destruir cisternas de recolha de chuva de comunidades palestinianas”.
O documento que é mencionado nas várias publicações não é, ao contrário do que escrevem os utilizadores, um relatório da ONU. Apesar de estar disponível no site das Nações Unidas, logo no título é explicitado que se trata de um “Non-UN document”, ou seja, “documento não-ONU”.
O texto foi submetido pela EWASH (Grupo de Emergência Hídrica, Saneamento e Higiene, em tradução livre) e pelo Al-Haq. O primeiro é um corpo que junta “28 organizações não-governamentais internacionais e locais, assim como agências das Nações Unidas, que procuram coordenar trabalhos no sector hídrico, de saneamento e higiene no território palestiniano ocupado”. O Al-Haq é uma organização palestiniana para a defesa dos direitos humanos.
Veredicto
É verdade que o exército israelita está a controlar a recolha de água da chuva em algumas zonas da Cisjordânia chegando, inclusivamente, a destruir cisternas comunitárias de recolha de chuva. Existem ordens militares escritas nesse âmbito mas não foram encontradas leis governamentais que proíbam especificamente a recolha de água da chuva nestes territórios.
Em Gaza, do ponto de vista legal, e de acordo com o B’Tselem e a Amnistia Internacional, Israel não tem controlo sobre o uso de água da chuva por parte dos palestinianos. Portanto, não é "dono da chuva", como foi afirmado nas redes sociais.