Pesquisas no Google sobre ansiedade climática dispararam em 2023. Em português também

As pesquisas em português por “ansiedade climática” no motor de busca da Google aumentaram 73 vezes ao longo dos últimos dez meses de 2023, em relação ao período homólogo de 2017.

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A empresa Google registou um maior interesse em pesquisas sobre a ansiedade climática em várias línguas do mundo nos últimos meses FreePik/DR
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As pesquisas sobre “ansiedade climática” dispararam no principal motor de busca online, de acordo com dados da Google partilhados com a cadeia britânica BBC. As consultas em português sobre o tema da eco-ansiedade aumentaram 73 vezes nos primeiros 10 meses de 2023, em relação ao mesmo período de 2017.

A Google registou um maior interesse em pesquisas sobre a ansiedade climática em outras línguas do mundo. As consultas em inglês sobre o tema aumentaram 27 vezes maiores durante o mesmo período, oito vezes em idiomas chineses e 20% em árabe.

“A eco-ansiedade foi definida em 2017 pela Associação Americana de Psicologia como sendo um medo crónico da degradação ambiental, tendo como base estudos anteriores, que até trouxeram outros termos, como solastalgia ou luto ambiental”, explicou ao PÚBLICO Teresa Pereira, investigadora da Universidade do Minho que integra a equipa do EcoPsi – Psicologia e Clima, um colectivo que agrega profissionais de psicologia atentos à associação entre saúde mental e crise climática.

A frequência com que falantes de uma determinada língua procuram informação sobre eco-ansiedade não pode, de forma alguma, ser confundida com a propensão desse mesmo grupo a ter certas respostas emocionais em relação à degradação do planeta. Factores como padrões de consumo digital ou literacia climática podem condicionar os dados disponibilizados pela Google.

A informação extraída da ferramenta Google Trends combina pesquisas por “ansiedade climática” e “ansiedade ecológica” (ou eco-ansiedade), termos que são muitas vezes usados como sinónimos, mas cujo significado, dependendo da fonte ou do interlocutor, pode apresentar ligeiras diferenças.

“Quando falamos de termos similares, é importante perceber que nos últimos anos já foi feita alguma investigação. E o que se evidencia é que os termos que são usados na literatura de forma semelhante, mas a realidade é que quando falamos de eco-ansiedade estamos a falar de um conjunto diverso de emoções, que ainda está a ser estudado”, esclarece Teresa Pereira.

A ferramenta Google Trends avalia aquilo que denomina “interesse de pesquisa”, algo que não equivale ao número total de consultas, mas sim à popularidade relativa das pesquisas ao longo do tempo e em diferentes geografias. Para o efeito, são consideradas amostras que, estatisticamente, indicam tendências globais nas consultas de um motor de busca específico (existem outros, convém lembrar).

Teresa Pereira frisa que a ansiedade climática não é uma condição clínica. “A eco-ansiedade constitui um conjunto de respostas emocionais, como o medo ou a preocupação, e que têm um impacto nos indivíduos que pode ser ou mobilizador, no sentido de os envolver na luta climática, ou paralisante”, refere a investigadora, que é coordenadora do Climate Teenage Guide, um manual, lançado em Setembro, que foi elaborado por e para activistas climáticos.

Países nórdicos lideram pesquisas

Ainda segundo dados partilhados pela Google com a BBC, os países nórdicos tiveram a maior percentagem de consultas de pesquisa globais relacionadas com a ansiedade climática nos últimos cinco anos. Juntas, a Finlândia, a Suécia, a Dinamarca e a Noruega foram responsáveis ​​por mais de 40% das consultas de pesquisa relacionadas com a “ansiedade climática”.

Os dados disponibilizados pela empresa são tratados estatisticamente, permitindo comparar as consultas feitas em países com 10 milhões de habitantes, como Portugal, com as pesquisas realizadas em nações com uma população mais de vinte vezes maior, como o Brasil. Os dados mencionados acima sobre as pesquisas em português, contudo, consideravam apenas o idioma, e não o país onde o motor de busca foi utilizado.

Países do hemisfério Sul, como o Chile, as Filipinas e a África do Sul, estão representados no mapa da Google com fatias mais modestas no bolo das pesquisas sobre ansiedade climática.

Os dados divulgados pela gigante tecnológica à BBC revelam ainda que houve um aumento global nas consultas sobre o futuro do planeta, juntamente com consultas sobre o ambiente, ao longo dos últimos 12 meses.

“Quando olhamos para o tipo de perguntas que as pessoas procuram, fica evidente que procuram compreender melhor, mas também querem agir”, disse um porta-voz da Google citado pela BBC. “Um exemplo: 'como solucionar as alterações climáticas' foi uma das perguntas mais frequentes sobre a crise do clima em todo o mundo nos últimos dois anos”, acrescentou o responsável.

Os dados da ferramenta da Google mostram ainda uma subida nas consultas sobre o “futuro”, juntamente com as “alterações climáticas” (120%), adaptação (120%), “sustentabilidade” (40%) e “emissões de gases com efeito de estufa” (120%) nos últimos 12 meses.

O impacto que a crise climática pode ter nas emoções humanas é reconhecido, com um grau “muito alto de confiança”, em relatórios do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC, na sigla em inglês). A Organização Mundial da Saúde também tem divulgado documentos que associam as alterações climáticas à saúde mental.

“Comportamentos e sistemas humanos vão ser perturbados pelas mudanças climáticas de diversas maneiras e as potenciais consequências para a saúde mental e o bem-estar são proporcionalmente diversas quer na quantidade quer na complexidade”, refere um relatório do IPCC divulgado em Fevereiro de 2022.

As relações entre a mudança do clima e a saúde mental são um campo de investigação relativamente recente, tendo começado a merecer atenção a partir de 2007. Há muito ainda por investigar, mas o interesse pelo tema está a crescer – tanto nas publicações científicas como nos motores de busca.