Apostas desportivas online “são altamente adictivas” e criam “ciclo mental vicioso”
Associação da publicidade às apostas tem impacto em públicos mais vulneráveis. Instituto de Apoio ao Jogador defende mais políticas de jogo responsável.
As apostas desportivas online "são altamente adictivas" e a sua ligação ao desporto, seja pela publicidade ou associação, apresentam um "ciclo vicioso" em termos psicológicos, que apresenta problemas, disse à Lusa a psicóloga clínica Assunção Neto.
Segundo a especialista do Grupo de Actuação em Psicologia & Performance, as apostas desportivas têm um efeito no cérebro que "funciona da mesma forma de qualquer outra adição", seja o álcool, drogas, medicamentos ou outros comportamentos adictivos.
A associação da publicidade ao fenómeno desportivo, remetendo a pessoa para acertar no resultado e em dezenas de outros factores possíveis tem também efeitos nefastos, sobretudo para pessoas vulneráveis a este tipo de problemas. "Torna-se mais fácil influenciar as pessoas, por várias razões. As pessoas já vão ver desporto porque o desporto permite uma sensação intensa que a maioria das pessoas não consegue ter de outra forma na vida", defende a profissional clínica.
As apostas, um fenómeno de jogo, ficam ligadas a este momento de prazer e "a algo muito socialmente aceite". "O próprio jogo da aposta tem este componente mágico, de "vou apostar e receber alguma coisa em troca".
Já o líder do Instituto de Apoio ao Jogador, Pedro Hubert, defende mais políticas de jogo responsável para o jogo online. Considera ainda que as apostas desportivas exigem uma alteração legislativa, uma "rede de apoio mais eficaz" e um mecanismo de auto-exclusão mais robusto.
O relatório do Serviço de Regulação e Inspecção de Jogos (SRIJ) relativo ao segundo trimestre de 2023, nota um aumento de 2,9% face aos três meses anteriores, fruto dos mais de 190 mil novos registos, contra o cancelamento de cerca de 80 mil, sendo que a maioria dos apostadores (81%) tem menos de 45 anos.
Para o líder do Instituto de Apoio ao Jogador, a publicidade é também um factor impactante, sendo "particularmente grave porque as pessoas não têm nenhuma capacidade decisão de se exporem ou não". "Fiz um estudo com pacientes que tinham tido recaídas e perguntei o que poderia incitar mais à recaída. O que mais mencionaram foi a publicidade, os prémios, os bónus, os convites a jogar”, afirma Pedro Hubert.
Manifestando-se pouco virado “para a proibição total”, considera que o reconhecimento do jogo como problema patológico abre caminho a que “se possa fazer mais” do que um código de boas práticas em publicidade, até porque começam a surgir países em que este tipo de mensagens, nas camisolas e outros espaços, já não é permitido.
A psicóloga clínica, Assunção Neto, duvida que a legislação em torno das apostas desportivas possa "apertar", até porque a própria lei só permite jogar a partir dos 18 anos "e não é o que acontece". A aposta, então, terá de ser "na educação, e em permitir às pessoas que tenham uma vida melhor e não precisem tanto de jogar", para contrariar uma temática que "têm um potencial adictivo mesmo muito grande".