João Galamba apresenta demissão de ministro das Infra-Estruturas. Marcelo já exonerou

Galamba é um dos arguidos da Operação Influencer e exercia as funções de ministro desde Janeiro.

Foto
João Galamba era ministro desde Janeiro deste ano, tendo substituído no cargo Pedro Nuno Santos (foto de arquivo) Nuno Ferreira Santos
Ouça este artigo
00:00
07:34

O ministro das Infra-Estruturas, João Galamba, anunciou nesta segunda-feira que pediu a demissão ao primeiro-ministro “após profunda reflexão pessoal e familiar”. Pouco depois, o Presidente da República adiantou, em nota publicada no site da Presidência, ter aceitado a exoneração "com efeito imediato". Marcelo Rebelo de Sousa revelou ter aceitado as propostas recebidas da parte do primeiro-ministro para a exoneração de Galamba e também de "Pedro Miguel Ferreira Jorge Cilínio, das funções de secretário de Estado da Economia".

“Comunico que apresentei hoje o pedido de demissão do cargo de ministro das Infra-Estruturas ao senhor primeiro-ministro. Apresentei este pedido de demissão após profunda reflexão pessoal e familiar, e por considerar que na minha qualidade de pai e de marido esta decisão é a única possível para assegurar à minha família a tranquilidade e discrição a que inequivocamente têm direito”, afirmou Galamba num comunicado divulgado há instantes.

O ministro demissionário explica que pediu a demissão a António Costa “apesar de entender que não estavam esgotadas as condições políticas de que dispunha” para exercício das suas funções.

João Galamba é um dos arguidos da Operação Influencer, em que o Ministério Público está a investigar alegados crimes de corrupção e tráfico de influências em negócios relacionados com a produção de hidrogénio, a exploração de lítio e a construção de um megacentro de dados em Sines.

Galamba era ministro desde Janeiro deste ano, tendo substituído no cargo Pedro Nuno Santos.

O assunto da manutenção de João Galamba na liderança do ministério que tem a tutela das infra-estruturas depois de serem conhecidas as suspeitas do Ministério Público sobre o ministro demissionário seria abordado amanhã, terça-feira (às 15h30), numa reunião entre o primeiro-ministro e o Presidente da República. Foi o próprio António Costa que o afirmou, na semana passada, que a situação de Galamba no Governo seria motivo de uma conversa entre o primeiro-ministro e Marcelo Rebelo de Sousa nesta semana.

Este foi o segundo pedido de demissão de Galamba, depois de o agora ex-ministro ter apresentado um pedido nesse sentido em Maio passado, na sequência do caso que envolveu o seu ex-assessor Frederico Pinheiro e da noite fatídica no Ministério das Infra-Estruturas. O primeiro-ministro acabou por rejeitar a demissão contra a vontade do Presidente da República, abrindo uma crise institucional entre São Bento e Belém.

Por outro lado, o pedido de demissão apresentado esta segunda-feira surgiu poucos minutos depois de serem conhecidas as medidas de coacção aplicadas aos arguidos na Operação Influencer.

Empenho e “bons resultados”

“O trabalho feito, os seus bons resultados e o desempenho das minhas funções com absoluto respeito pela lei e com total dedicação ao país e aos portugueses são, em meu entendimento, as condições políticas necessárias para o desempenho de funções governativas”, considera o ministro, que enumera também o que entende terem sido os traços principais da sua governação.

“Enquanto secretário de Estado da Energia, empenhei-me, em total consonância com as prioridades da União Europeia e do Programa do Governo, na transição energética que sempre considerei, e publicamente defendi, um desafio que abria ao país oportunidades únicas de desenvolvimento tecnológico, industrial e de maior independência energética”, frisa o ministro.

Foi neste contexto, explica o governante, que se empenhou “em assegurar as condições para que as matérias-primas críticas como é o caso do lítio e a fixação no país de toda a cadeia de valor das baterias, incluindo a refinaria de lítio, pudessem trazer novos investimentos, tecnologia e empregos altamente qualificados”.

Na mesma lógica, e enquanto ministro das Infra-Estruturas, Galamba frisa que procurou desenvolver as “vantagens competitivas de que o país dispõe ao nível da digitalização, descarbonização e industrialização dos seus portos comerciais, em particular na cadeia de valor do eólico offshore, e também ao nível da amarração e interligação de cabos submarinos”.

O objectivo era fazer de Portugal “um hub [centro] competitivo de conectividade, armazenamento e processamento de dados”, refere.

João Galamba também afirma estarem “em curso medidas essenciais e que são do conhecimento público para o descongestionamento do Aeroporto Humberto Delgado” e, sobre a TAP, defende que a transportadora “tem vindo, numa trajectória sustentável, a fortalecer-se, tanto financeira como economicamente, e a apresentar bons resultados”.

“Total obediência à lei”

“Quero transmitir que este pedido de demissão não constitui uma assunção de responsabilidades quanto ao que pertence à esfera da Justiça e com esta não se confunde”, frisa João Galamba, dizendo-se “totalmente disponível para esclarecer qualquer dúvida que haja a respeito do desempenho” das suas funções governativas.

“A acção de um membro do Governo impõe a ponderação de todos os interesses públicos presentes e a obrigação de desenvolver todos os esforços para os compatibilizar ou maximizar a sua realização quando não seja possível alcançar a realização plena de todos eles, e sempre com total obediência à lei”, explica Galamba, dizendo que isso “foi, sem dúvida” o que fez enquanto governante.

Galamba diz ter procurado “soluções para que todos os projectos de investimento no país” referentes às suas áreas de actuação “lograssem concretização” e trouxessem desenvolvimento económico.

“Saliento e destaco que me refiro a todos os projectos de investimento inseridos na minha área de actuação enquanto governante porquanto essa corresponde à governação legítima num Estado democrático, trabalhando a bem de todos os projectos e respondendo à necessidade de a todos eles se assegurarem condições de concretização. Repito: de a todos eles se assegurarem condições de concretização”, afirma o ministro.

Com agradecimentos à equipa actual e a todas as equipas com as quais trabalhou, bem como aos trabalhadores das entidades que tutelou nos ministérios do Ambiente e das Infra-Estruturas, João Galamba diz ter sido uma honra exercer funções governativas.

“Por fim, reitero o agradecimento à minha família, que me tem acompanhado e que tem sido a mais prejudicada nos últimos tempos, o que não posso ignorar e cuja protecção, como referido, me faz apresentar, sem mais, a presente demissão”, conclui.

Dossiers em aberto e planos atrasados

Nos meses em que esteve à frente das Infra-estruturas, João Galamba ficou marcado pelo rocambolesco episódio com o ex-adjunto Frederico Pinheiro e o seu computador de trabalho, mas o antigo titular da Energia herdou dois dossiers especialmente complexos e polémicos.

A TAP, cuja reprivatização estava a ser conduzida por Galamba depois da saída também conturbada de Pedro Nuno Santos, fica agora adiada para a próxima legislatura, depois de ter sido chumbada por Marcelo Rebelo de Sousa.

E o novo aeroporto de Lisboa, cujo processo está a correr o seu rumo, junto da Comissão Técnica Independente (CTI) que está a estudar a expansão da capacidade aeroportuária de Lisboa e que terá o seu relatório final ficará concluído até ao final deste mês e em condições de ser entregue para ser submetido a consulta pública. No entanto, qualquer decisão resvalará para o próximo executivo que saia das eleições de Março do próximo ano.

Na ferrovia, Galamba também não deixa obra concluída, pelo contrário, os principais dossiers estão a arrastar-se em atrasos e indefinições. A CP continua a tentar comprar 12 comboios de longo curso. A empresa só há um mês viu concretizado o saneamento financeiro da sua dívida histórica, mas, para não falhar os prazos (o primeiro comboio demora sete anos a ser entregue a partir da data da sua compra), teria de lançar o concurso público já nos primeiros meses de 2024. Sem ministro e com um Governo demissionário, este dossiê continuará por fechar.

Já o concurso público para a compra de 117 comboios regionais e suburbanos (o maior de sempre da história da CP) encontra-se na sua recta final, mas ainda com desfecho incerto devido à litigância dos três concorrentes. Quanto ao Plano Ferroviário Nacional, Abril seria o mês em que estaria em vigor uma lei que definiria, entre outras coisas, a nova linha Lisboa-Porto, a linha do Vale do Sousa, a linha de Trás-os-Montes (Porto-Vila Real-Bragança com continuação a Zamora), bem como as ligações ferroviárias às dez maiores cidades do país. Agora, pára tudo, inclusive a linha de alta velocidade. Com Pedro Ferreira Esteves

Sugerir correcção
Ler 45 comentários