Um terço das famílias em risco de perder a casa não tem alternativa habitacional
Uma fatia significativa da população que acredita estar em risco de perder a casa diz “não ter para onde ir” se esse cenário se concretizar, conclui um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos.
Mais de um terço das pessoas que acreditam estar em risco de vir a perder a sua casa durante os próximos cinco anos admite não ter qualquer alternativa habitacional. Outros seriam forçados a ir viver com outras pessoas, familiares ou não, ou a arrendar uma nova casa. E menos de um décimo desta população afirma que poderia comprar uma casa.
As conclusões são do "Barómetro da Habitação", um estudo realizado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (controlada pela família Soares dos Santos, dona do grupo Jerónimo Martins), que conduziu um inquérito sobre a actual crise habitacional. Ao todo, foram inquiridas 1086 pessoas residentes em Portugal Continental e maiores de idade, com uma idade média de 51,7 anos.
Com o objectivo de "obter informação sobre as condições em que as famílias vivem, as necessidades e dificuldades que enfrentam e as percepções e convicções das pessoas" quanto ao tema da habitação, os responsáveis pelo estudo questionaram os inquiridos, entre outros aspectos, sobre o risco de perda de casa e as alternativas de que dispõem nesse cenário.
"Perguntámos a todos os inquiridos se pensam que correm o risco de perder a sua casa nos próximos cinco anos, numa aproximação a uma especificidade da vulnerabilidade na habitação: a da instabilidade ou segurança no regime de ocupação da casa", pode ler-se no relatório onde são apresentadas as conclusões do estudo.
A esta pergunta, a larga maioria dos inquiridos (85,8%) responde que não acredita correr esse risco e 2,5% não sabem ou não responderam à questão. Outros 11,7% acreditam que podem vir a perder a sua casa, a maioria dos quais (59%) são arrendatários no mercado privado. Dito de outra forma, um em cada nove inquiridos admite que pode vir a perder a sua casa.
Várias razões justificam esta crença, mas a principal, apontada por cerca de metade dos inquiridos que acredita estar em risco de perder a casa, diz respeito ao aumento das despesas relacionadas com a habitação (prestação do crédito ou renda). Outros (28,3%) apontam para a saída da casa por iniciativa do senhorio (28,3%), para a diminuição do rendimento do agregado familiar (11,8%) ou para o mau estado de conservação ou degradação da casa (5,5%).
Às pessoas que disseram acreditar estar em risco de perder a casa, os responsáveis do estudo perguntaram, ainda, para onde iriam viver se tal acontecesse. "É particularmente preocupante o facto de 33,9% destes inquiridos referirem não ter para onde ir, ou seja, muito possivelmente, necessitariam de alguma forma de apoio social para solucionar a sua situação habitacional", resume o relatório.
Para outros 33% destes inquiridos, a solução passaria por arrendar outra casa, enquanto 14,2% iriam viver com familiares e outros 7,9% com não-familiares. Só 8,7% diz que compraria uma casa e 2,4% não respondeu à questão.
Inquilinos pagam mais 30%
O estudo procurou, ainda, avaliar quais os custos associados à habitação, acabando por concluir que aqueles que arrendam casa têm despesas mais elevadas do que os proprietários que pagam empréstimos, uma conclusão que vai ao encontro das estatísticas oficiais do Instituto Nacional de Estatística (INE) relativas aos valores das rendas e das prestações do crédito à habitação.
Em média, conclui o estudo, os proprietários com um empréstimo à habitação ainda por pagar têm um custo mensal fixo de 524,7 euros. Já os arrendatários do sector privado pagam, em média, uma renda de 678,8 euros por mês, um valor cerca de 29,4% superior àquele que é pago pelos proprietários com empréstimos.
Ainda relativamente à população que tem custos mensais fixos com a habitação, o inquérito conclui que mais de 62% destes inquiridos admite sentir "pelo menos alguma dificuldade em fazer face aos custos mensais da casa", enquanto perto de 13% admitem sentir "grande dificuldade" em cobrir estas despesas. "Neste aspecto, não existem diferenças estatisticamente significativas entre os três regimes de ocupação do alojamento considerados (proprietários com empréstimo, arrendatários dos sectores privados e público ou equivalente) nem por grupo etário, nem por escolaridade", aponta o relatório.
Os inquiridos foram, ainda, questionados sobre os factores que consideram ter contribuído mais para a actual crise habitacional. O baixo nível de investimento público em habitação, a falta de casas disponíveis para habitação familiar e a falta de regulação do mercado habitacional são aqueles que foram apontados pela maioria dos respondentes como o factor mais importante para o actual cenário, seguindo-se ainda o aumento do alojamento local, o aumento dos fundos de investimento imobiliário a actuar em Portugal e os incentivos do Estado à procura de habitação por estrangeiros.