A difícil arte do sexo dos pandas – durante 20 anos Mei Xiang e Tian Tian tentaram e fracassaram
No jardim zoológico dos EUA tentaram quase tudo. Baixar as luzes, silêncio e houve quem sugerisse recorrer a filmes e até Viagra. Depois de 20 anos, ficaram só amigos, com quatro crias por FIV.
Os dois pandas gigantes gostavam um do outro. Mei Xiang, uma fêmea, e Tian Tian, um macho, pareciam especialmente felizes quando chegava a época do acasalamento. Mas quando as luzes se apagavam e o zoo ficava silencioso, eles eram um fracasso.
Durante anos, para desânimo dos responsáveis pelo parque, o casal de pandas gigantes do Jardim Zoológico Nacional não conseguiu acasalar. Não por falta de tentativas ou de esforços para os ajudar.
Quando chegava o momento, Mei Xiang costumava ficar esparramada no chão, tornando a tarefa de Tian Tian mais difícil. Tian Tian, por sua vez, parecia não saber como proceder. A luta continuou. Os dois ficavam frustrados, depois irritados, e tinham de se separar antes que os problemas começassem.
Quase todos os anos, de 2003 a 2020, os dois pandas tentaram mas não conseguiram acasalar naturalmente, segundo o jardim zoológico. Os curadores recorreram à inseminação artificial, que produziu as quatro crias sobreviventes do casal.
Enquanto o Jardim Zoológico se prepara para enviar os três pandas que restam – Mei Xiang, de 25 anos, e Tian Tian, de 26 anos, e o seu filho, Xiao Qi Ji, de 3 anos – para a China em meados de Novembro, os seus especialistas ainda se interrogam porque é que os adultos nunca se entenderam. (As outras três crias já foram devolvidas à China nos termos do contrato).
"Sempre que os juntávamos, quando achávamos que era a altura certa, eles gostavam definitivamente um do outro", lembra Pierre Comizzoli, biólogo, investigador do jardim zoológico e oficial sénior do programa Smithsonian para a ciência. "Estavam a brincar juntos, mas não estava a acontecer nada."
Durante todo o tempo, os funcionários do jardim zoológico observavam sem perturbar. Mas não o público. O complexo do panda gigante ficava fechado durante esse período.
"Esse era realmente o desafio", explica Comizzoli. "Os dois ficavam frustrados e, a certa altura, começaram a ficar muito impacientes. E era altura de os separarmos porque não queríamos que começassem a lutar." Os pandas gigantes têm garras grandes e mandíbulas suficientemente poderosas para abrir o bambu, e havia um sério risco de ferimentos.
"Este era realmente o padrão habitual em todas as épocas de reprodução", lamenta.
Viagra e filmes de pandas a acasalar? Não, obrigada
O jardim zoológico tentou quase tudo para alterar o padrão. Manteve as luzes baixas dentro do recinto dos pandas e o ruído baixo durante a época de acasalamento. Chamou especialistas em sexo com pandas gigantes da China. Os conservadores tentaram um programa de exercícios para pôr Tian Tian em melhor forma.
Tentaram pô-lo de pé o mais alto possível para fortalecer as pernas. "Estamos a transformá-lo num atleta olímpico", brincava Brandie Smith, na altura curadora sénior e agora directora do jardim zoológico, em 2011.
Os curadores fizeram com que Mei Xiang praticasse deitar-se num tronco para não se esticar durante os avanços de Tian Tian.
Os funcionários ponderaram mesmo a hipótese de mostrar ao casal filmes de pandas gigantes a acasalar – o chamado "panda pornográfico". Segundo consta, outras instituições já o tinham tentado. Até o Presidente Richard M. Nixon considerou, em tempos, que esta era uma boa abordagem.
"A única forma de aprenderem a acasalar é verem outros pandas a acasalar", terá dito o presidente numa chamada telefónica gravada quando os primeiros pandas gigantes chegaram ao jardim zoológico em 1972. "Se eles não aprenderem... não vai acontecer nada." Mas o jardim zoológico nunca usou pornografia panda, garante Pierre Comizzoli.
"Para mim, é um pouco como uma lenda urbana", diz. "Os pandas não vivem em grupos. São animais muito solitários. Por isso, na natureza, duvido que consigam realmente ver o exemplo de outros pandas a copular", argumenta.
Um santuário na China terá dado aos machos de panda gigante Viagra, o medicamento para a disfunção eréctil. Comizzoli disse que o jardim zoológico também não tentou isso. "O Viagra não era a solução", explica o biólogo num email. "A líbido e o comportamento reprodutivo não eram um problema. Era a falta de experiência na cópula."
Os especialistas dizem que tem sido vital para os zoológicos dos EUA produzir filhotes de panda gigante. Estima-se que existam apenas 1800 pandas gigantes na natureza e cerca de 600 em cativeiro. Anteriormente listados como ameaçados de extinção, eles agora são classificados como vulneráveis pela China e pela União Internacional para a Conservação da Natureza.
O Jardim Zoológico Nacional afirmou que a maior parte do seu trabalho com o panda gigante se centrou na reprodução. O jardim zoológico nacional fez experiências bem sucedidas com sémen congelado para inseminação e manteve um "livro genealógico" digital para manter um registo dos pandas gigantes geneticamente mais valiosos em cativeiro. Os pandas gigantes são mais valiosos se os seus genes estiverem menos bem representados.
E o acasalamento natural é preferível porque a inseminação artificial requer dois procedimentos em que ambos os animais são sedados, refere Pierre Comizzoli.
Outros zoológicos não parecem ter tido o problema do acasalamento. O antigo casal de pandas gigantes do jardim zoológico de San Diego, Bai Yun, uma fêmea, e Gao Gao, um macho, produziu cinco crias de 2003 a 2012 através de acasalamento natural, disse Andrew James, porta-voz da San Diego Zoo Wildlife Alliance, num email. (Todos os pandas gigantes do jardim zoológico de San Diego, por acordo prévio, foram entretanto enviados para a China).
Mei Xiang e Tian Tian não se escolheram como companheiros. A união deles foi arranjada, com base no valor dos seus genes, recorda Comizzoli. Eles foram acasalados quando jovens na China e enviados para os Estados Unidos em 2000.
Um estudo publicado em 2015 na revista Nature Communications sugeriu que os pandas gigantes que seleccionam os seus parceiros acasalam naturalmente com mais frequência e têm mais crias do que os pandas gigantes que não o fazem.
"Quando não há química entre um macho e uma fêmea, eles nem sequer tentam reproduzir-se", conclui Comizzoli. Mas não foi esse o caso entre Mei Xiang e Tian Tian. "Eles gostavam muito um do outro", garante. Simplesmente não conseguiam dominar o básico. "Ambos eram um pouco ignorantes", diz.
No final, perante a estreita janela de tempo em que uma panda gigante fêmea pode engravidar, o jardim zoológico teve de terminar as tentativas de acasalamento e recorrer à inseminação artificial, utilizando o sémen de Tian Tian.
As fêmeas de panda gigante entram normalmente no cio uma vez por ano, geralmente na Primavera, durante cerca de 24 a 72 horas, segundo os funcionários do jardim zoológico. Quase todos os anos, excepto depois de Mei Xiang ter dado à luz uma cria, o jardim zoológico preparou-se cuidadosamente para esse momento.
Após a inseminação artificial, os especialistas do jardim zoológico monitorizaram os níveis hormonais de Mei Xiang para tentar perceber se ela tinha engravidado. A população de Washington passou a estar atenta à gravidez do panda, com muitos residentes a sintonizar a transmissão em directo da câmara do panda, especialmente perto do fim do seu ciclo. (Em 2020, após uma gravidez bem sucedida, mais de 630.000 pessoas assistiram ao nascimento de Xiao Qi Ji).
A “pandamania” em Washington
O período de gestação de um panda varia de 90 a 180 dias. Mas a reprodução do panda gigante é misteriosa. As fêmeas de panda podem apresentar muitos sinais de gravidez sem estarem grávidas e podem sofrer a chamada "falsa gravidez". Muitas vezes, os especialistas têm de esperar que o ciclo do panda termine – com ou sem uma cria.
Há muito tempo que é crucial para o jardim zoológico produzir crias de panda gigante. Mei Xiang e Tian Tian tiveram quatro. O primeiro nascimento – de Tai Shan, um macho, em 2005 – foi uma sensação e ajudou a aumentar a pandamania em Washington.
Mas em 2011, depois de Mei Xiang ter sofrido a sua sexta falsa gravidez, os curadores perguntaram-se se ela estaria a ficar demasiado velha.
O jardim zoológico disse que só tentaria engravidar mais uma vez. Se não engravidasse, ela e talvez Tian Tian poderiam ter de ser substituídos. "Não tivemos aqui uma cria nos últimos cinco anos", disse na altura o então director do zoo, Dennis W. Kelly. "O que estamos a discutir é: o que podemos fazer para garantir que haja uma cria no nosso futuro?"
Em 2012, o agora reformado cientista de investigação do jardim zoológico, Jon Ballou, disse que, devido a tantas tentativas falhadas, Mei tinha cerca de 10% de hipóteses de engravidar novamente. "Se ela não se reproduzir, então está geneticamente morta", disse ele.
De qualquer modo, foi inseminada artificialmente nessa Primavera. Uma cria nasceu em Agosto, mas morreu ao fim de seis dias, devastando a equipa.
Em 2013, os cuidadores tentaram mais uma vez e, às 17h32 do dia 23 de Agosto – oito anos após o último panda bebé saudável –, nasceu uma cria fêmea, Bao Bao. Dois anos mais tarde, nasceu um macho, Bei Bei.
Ambos foram posteriormente enviados para a China – Bao Bao em 2017, Bei Bei em 2019. (Tai Shan, nascido em 2005, foi enviado para a China em 2010).
A China é proprietária e “aluga” todos os pandas gigantes dos jardins zoológicos dos EUA. Os adultos e as crias estão sujeitos aos contratos de aluguer, que expiram com o tempo e exigem que as crias sejam enviadas para a China para reprodução quando atingem a maioridade.
Apesar dos altos e baixos, o jardim zoológico disse que não quer que a era do panda gigante em Washington termine. "Esperamos ter mais", admite Pierre Comizzoli. "Espero que sim. Seria divertido."