Recursos humanos em saúde, o elefante na sala

O Orçamento de Estado para 2024 e as mudanças na gestão do SNS são encarados como a esperança que irá solucionar a crise no sector da Saúde, mas não devemos desviar a atenção de outras preocupações.

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Megafone P3: Recursos humanos em saúde, o elefante na sala Miguel Manso
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O nosso sistema de saúde enfrenta uma terrível doença multifactorial. Apesar de apresentar exacerbações colocadas a descoberto recentemente, os problemas já são de longa data, com um SNS influenciado por ciclos políticos e falta de visão a longo prazo.

Assim, curar o SNS implica abordar todos estes aspectos — um exercício difícil, não fosse o nosso país marcado por soluções de pensos rápidos.

Hoje, fala-se de investimento, das verbas utilizadas para a saúde e daquela que será a sua execução. Com o SNS a passar por uma complexa crise, todos os olhos estão postos no Orçamento de Estado para 2024, que prevê para o sector da saúde um reforço de 1206 milhões de euros.

Além disso, assistimos finalmente à publicação dos Estatutos da Direcção Executiva do SNS e um plano de reestruturação das urgências. Com a perspectiva de um final de ano difícil, estas medidas aparecem como o Santo Graal que conduzirá a uma viragem no sector.

No entanto, a maior crise do SNS é uma de recursos humanos e, mais do que nunca, precisamos de união na abordagem desta situação. Vivemos um momento de debate sobre o real número de profissionais a exercer no SNS, sobre as expectativas perante o sistema público de saúde e sobre a justiça de reivindicações de condições de trabalho, o que gera um conflito entre políticos, gestores e profissionais de saúde.

O facto é que existe um novo modelo de profissional de saúde e novas exigências e pressões sobre o nosso sistema de saúde às quais temos de responder. A questão não deve continuar a ser “se” nos devemos adaptar, mas “como”.

Esta crise não é exclusiva e faz-se notar noutros países europeus. O National Health System (NHS) do Reino Unido, frequentemente usado como referência de comparação com o SNS pelas suas semelhanças de modelo, tem também enfrentado desafios semelhantes.

Neste contexto, foi criado o NHS Long Term Workforce Plan, um plano de retenção de profissionais de saúde a longo prazo. Embora os resultados deste documento ainda não sejam conhecidos devido à sua novidade, uma coisa é clara: a documentação detalhada de todos os problemas e propostas fornece objectividade e clareza, sendo um ponto de partida essencial para compreender esta problemática.

Também em Portugal o tema dos recursos humanos não parece totalmente esquecido, com a elaboração de uma proposta de roteiro de acção com vista à qualificação do planeamento e da gestão estratégica de recursos humanos da saúde prevista para o final de 2023.

A promessa existe, mas a pertinência e a atenção que vão ser dadas a esta questão permanecem ainda incógnitas e sem sinais de desenvolvimentos significativos que restituam a esperança aos profissionais de saúde.

É essencial um trabalho de auscultação e proactividade para traçar o caminho a seguir. No Reino Unido escolheram-se três prioridades: treinar, reter e reformar, ou seja, apostar na formação, numa cultura de trabalho que privilegie a valorização da carreira e o equilíbrio entre vida pessoal e profissional e num aumento da produtividade aliado a novas skills e adopção de tecnologias.

Definiram-se medidas concretas como o incentivo às instituições a conduzir reflexões sobre a sua cultura organizacional ou o estabelecimento de princípios de trabalho flexível, entre outros exemplos. As propostas encontram-se acessíveis não só para os legisladores, mas para a população geral, permitindo o desenvolvimento concomitante de acções locais. Esta realidade pode ser a nossa se exigirmos um plano detalhado e comprometido em melhorar o futuro do nosso país.

Uma reforma não é apenas um trabalho do governo, mas de todos nós, especialmente numa altura de descentralização de competências.

Avaliemos, sim, o OE 2024, as mudanças na gestão do SNS e tudo o que isso representa. Mas não nos esqueçamos de que o nosso escrutínio é também imprescindível noutros âmbitos e concentremo-nos nas várias peças que produzem um todo, incluindo aquelas que podem parecer mais desafiadoras de abordar, mas que estão mais próximas aos trabalhadores que precisam de ser valorizados.

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