Porque não se abre a fronteira de Rafah, a única forma de entrar ou sair de Gaza?
Impasse no único posto fronteiriço que permitiria o contacto da Faixa de Gaza com o exterior. Estados Unidos envolvidos nas negociações para o reabrir.
Por Rafah pode entrar ajuda humanitária em Gaza e sair quem tenha passaporte estrangeiro. Mas Israel e Egipto não chegam a acordo para poder abrir.
Porque é que a passagem fronteiriça de Rafah é tão importante?
Situada a sul da Faixa de Gaza, é a única fronteira do território que não é controlada por Israel. Por isso, é a única possibilidade de saída e contacto com o exterior dos palestinianos que ali vivem, devido ao bloqueio israelita que dura já há 16 anos. Ao abrigo de um acordo com Israel, o Egipto controla esta passagem para a península do Sinai desde 2007, mas para que por ali entrem bens de consumo e ajuda humanitária é preciso autorização israelita.
É por Rafah que a maioria dos palestinianos da Faixa de Gaza tenta sair, embora a maioria dos 2,2 milhões de habitantes nunca tenha deixado os 365 km2 daquele território.
Está a funcionar?
Não. Em poucas palavras, Israel está a bombardear aquela zona, e não aceita um cessar-fogo que permita usar a fronteira. No entanto, há centenas de palestinianos com passaportes estrangeiros ali concentrados, com malas, crianças e idosos, na esperança de poderem sair de Gaza, depois de Israel ter feito vários ultimatos para que a população do Norte da Faixa de Gaza fugisse para Sul. Mas os portões não se mexem, relata a AFP.
Do lado egípcio, amontoa-se há vários dias uma centena de camiões com ajuda humanitária para Gaza oferecida por países como a Turquia e a Jordânia, diz a Al-Jazeera. O Egipto recusa abrir o seu lado da fronteira enquanto não estiverem reunidas condições de segurança.
A entrada desta ajuda é fundamental. “Restam 24 horas de água, electricidade e combustível em Gaza”, disse Ahmed Al-Mandhari, director da Organização Mundial da Saúde para o Mediterrâneo Oriental, citado pela AFP.
No entanto, a CNN está a avançar que um membro da sua equipa em Rafah viu cinco camiões de combustível das Nações Unidas passarem a fronteira para a Faixa de Gaza nesta tarde. O responsável máximo pela ajuda humanitária da ONU, Martin Griffiths, chegará ao Egipto na terça-feira.
O que está a ser feito para a reabrir?
Há intensas negociações diplomáticas, nas quais se envolveram os Estados Unidos – há 253 cidadãos norte-americanos a quererem abandonar Gaza, com 153 familiares, de acordo com um documento obtido pela CNN, e não conseguem –, e foi anunciado pela embaixada dos Estados Unidos em Israel e também pelo Egipto que nesta segunda-feira a fronteira de Rafah abriria durante algumas horas. Mas essa possibilidade foi desmentida por uma nota do gabinete do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, citada pela Reuters: “Não há actualmente nenhuma trégua nem entrada de ajuda humanitária em Gaza e saída de estrangeiros.”
O secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, regressou a Israel, onde esteve na semana passada, e julga-se que estará a tentar negociar condições para a abertura da passagem de Rafah. Mas ainda nesta tarde um bombardeamento israelita matou cinco pessoas e feriu pelo menos 15 na cidade de Rafah, anunciou o Ministério da Saúde de Gaza, citado pelo New York Times.
Há outras razões que estejam a travar a abertura da fronteira de Rafah pelo Egipto?
O Cairo restringe as travessias da fronteira de Rafah, e manteve sempre a fronteira fechada em anteriores conflitos do Hamas com Israel, em 2008, 2014 e 2021, nota o Guardian. E desde 2013, quando se agravaram os confrontos entre jihadistas e o exército egípcio na península do Sinai, foi limitada a passagem de jornalistas e organizações de ajuda humanitária.
Do lado egípcio, há o temor de que, abrindo a fronteira, haja um êxodo palestiniano para a península do Sinai. Isso poderia dar novo alento à ideia de que “o Sinai é o país alternativo para os palestinianos”, disse ao New York Times Mustapha Kamel al-Sayyid, cientista político da Universidade do Cairo. Além disso, o Egipto já acolhe nove milhões de migrantes, e está a enfrentar uma crise económica, o que aumenta a relutância em receber mais refugiados.
O empenho egípcio no envio de ajuda humanitária é lido, por vários analistas, como uma forma de ajudar a que os palestinianos não saiam da Faixa de Gaza.
Há também uma questão política concreta: o Hamas, que governa a Faixa de Gaza, tem raízes no ramo palestiniano da Irmandade Muçulmana, um movimento transnacional nascido no Egipto, e o Presidente egípcio Abdel Fattah al-Sissi tem reprimido fortemente o movimento.