Dos 30 segundos nos noticiários à viralidade na Internet. Como a morte de Prigozhin foi noticiada na Rússia

Primeiro, foi ignorada. Depois, a morte do mercenário na queda de uma aeronave foi noticiada em apenas 30 segundos nas televisões estatais russas. Na internet, foi um tema incontornável.

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Socorristas carregam um dos cadáveres do jacto particular que se despenhou em Tver, Rússia Reuters/STRINGER
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Quando o noticiário nocturno arrancou às 20h locais no Russia-1, um canal televisivo do Estado russo, os relatos sobre a possível morte de Yevgeny Prigozhin (Ievgueni Prigojin na transliteração portuguesa) na queda de uma aeronave em Tver já circulava havia pelo menos uma hora. As primeiras informações chegaram ao Telegram pouco antes das 17h30 portuguesas, mais de uma hora depois de o Embraer privado ter desaparecido dos radares às 16h11 de Lisboa, mais duas horas em Moscovo.

Ainda assim, nos principais noticiários russos, a morte quase certa do líder do Grupo Wagner mereceu pouco mais do que uma nota de rodapé. Depois de o tema ter sido ignorado no noticiário das 19h do canal NTV (detido pela Gazprom, a empresa de energia estatal russa), que ainda decorria quando as informações preliminares e os primeiros vídeos chegaram ao Telegram, também o canal Russia-1 esperou 26 minutos para fazer uma referência ao tema no jornal das 20h.

O assunto foi referido meramente durante 30 segundos, contou a BBC e o projecto jornalístico Agents Media. Foi o mesmo período de tempo que o Canal Um, o principal canal noticioso da Rússia e também ele controlado pelo Kremlin, dedicou ao tema no noticiário das 21h — e só 51 minutos depois de ele ter começado. Foi preciso esperar até às 23h20 locais para a NTV ser o primeiro canal a passar a morte de Prigozhin à frente do 80.º aniversário da vitória na Batalha de Kursk ou da cimeira dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) em Joanesburgo.

Por essa altura, os trabalhos nas redacções fora da Rússia já orbitavam em torno da queda da aeronave e da previsível morte de Prigozhin em Tver. O percurso das notícias começou nas redes sociais: os conteúdos saltaram de conta em conta no Telegram, migraram depois para a rede social X (antes conhecida por Twitter) e culminaram numa notícia da agência russa TASS, controlada por Moscovo, que serviu de alerta para os jornalistas em todo o mundo. Às 18h12 de quarta-feira, mais duas horas na capital russa, a agência noticiou que um “jacto executivo caiu em Tver”, matando os três tripulantes e sete passageiros a bordo.

A partir desse momento, as confirmações chegaram a conta-gotas. Cinco minutos depois da primeira notícia, um novo artigo confirmava que Prigozhin constava na lista de passageiros da aeronave. Às 21h12, a TASS noticiou que o líder do grupo Wagner estava efectivamente no interior do Embraer que tinha caído. O título do artigo (e o ângulo com que foi escrito) não incluiu em momento algum a formulação que mais se poderia esperar — “Prigozhin morreu”. Antes, que o mercenário estava “na lista de passageiros”. Só no texto é que se afirma que “todos os passageiros morreram”.

Depois das actualizações realizadas a esse artigo até pouco antes da uma da manhã de Portugal (eram já quase três da manhã em Moscovo), a primeira notícia da agência TASS na manhã desta quinta-feira sobre a morte de Prigozhin é publicada às 9h24. Nela, a agência russa noticia as “mudanças erráticas de altitude de voo” nos 32 segundos antes de o Embraer se despenhar.

Na imprensa online, a informação parece ter sido menos ignorada do que nas televisões. Tanto a RIA Novosti como a Sputnik, ambas controladas pelo Kremlin, noticiaram que “um avião caiu na região de Tver”, “Prigozhin foi listado entre os passageiros” e “todas as dez pessoas [a bordo] morreram”. Ambos publicaram vídeos da queda da aeronave, deram conta de que um segundo avião de Prigozhin tinha aterrado em segurança pouco depois do incidente, publicaram as descrições de testemunhas oculares e referiram as reacções internacionais ao caso. Os detalhes do incidente continuaram a ser publicados madrugada dentro e ao longo desta quinta-feira.

Ao fim da tarde, com Vladimir Putin a reagir pela primeira vez à morte do líder do grupo Wagner, no primeiro comentário oficial do Kremlin desde a queda do avião, as manchetes dos jornais russos na internet voltaram-se para as condolências que o Presidente da Rússia endereçou à família de Prigozhin e para as promessas de uma investigação exaustiva.

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