Onze mulheres exigem mais tempo e transparência à Comissão de Inquérito do CES para denúncias de assédio

Colectivo de Vítimas critica comissão independente por prazo “exíguo” para fazer queixas e quer mais garantias de sigilo para denunciantes. “Há probabilidade de vítimas não se sentirem seguras.”

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O Centro de Estudos Sociais criou a comissão que investiga os casos de abuso no dia 1 de Agosto Sergio Azenha
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Um colectivo que já agrega 11 mulheres que dizem ter sido vítimas de assédio sexual e moral e extractivismo intelectual por dois investigadores do Centro de Estudos Sociais (CES) exige um prazo mais alargado para a apresentação de denúncias à comissão independente que investiga os casos, bem como maior transparência nos procedimentos. “Se não responderem num tempo hábil e a sua resposta não for coincidente com o que pensamos ser uma comissão independente, há probabilidade de algumas vítimas não se sentirem seguras”, lamenta a advogada Daniela Félix, que representa este grupo.

Quatro meses após as primeiras denúncias que visam os investigadores Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins, após a publicação do artigo Sexual Misconduct in Academia pela conceituada editora Routledge (que se encontra com venda suspensa via editora por estar “sob revisão"), foi criada a Comissão Independente do Centro de Estudos Sociais "para o esclarecimento de eventuais situações de assédio". A 1 de Agosto, entrou em funções e apresentou como prazo-limite para a recepção de denúncias o dia 30 de Setembro.

O auto-intitulado Colectivo de Vítimas, que em Abril começou por juntar três mulheres e que foi crescendo em dimensão, manifesta a sua “surpresa” por, após quatro meses de demora na criação da comissão, ser fixado “um período tão exíguo para apresentação de denúncias”. Num comunicado enviado à imprensa, o grupo considera que na verdade o prazo corresponde a apenas um mês para “preparar e submeter denúncias” devido ao período de férias e considera “imprescindível” a extensão do prazo. O colectivo foi avisado pelo CES, no fim de Julho, da criação da comissão, à qual escreveu no dia 11 pedindo esclarecimentos sobre que procedimentos serão adoptados na prática para receber as denúncias.

Até agora, nenhuma das pessoas que Daniela Felix representa avançou com qualquer queixa junto da comissão “por causa das inconsistências e desconhecimento sobre a forma como as denúncias serão recebidas”, disse a advogada ao PÚBLICO. “Só vamos avançar depois de serem dadas respostas pela comissão”, garante. “É necessário que a comissão independente acolha as vítimas e as trate com seriedade e torne públicos os procedimentos” que envolverão as denúncias e o tratamento desses dados. Na prática, este grupo quer conhecer o regulamento interno, como serão produzidas e recolhidas as provas, as línguas em que trabalharão ou como será garantido o sigilo e segurança das queixosas, por exemplo.

A comissão, segundo informação oficial do CES, analisará “situações e denúncias já tornadas públicas, recebidas através dos meios institucionais do CES” ou aquelas que surjam no canal de denúncia criado para o efeito na plataforma FaceUp. Nesse canal, diz-se que este é “um meio seguro e privado para reportar à CI situações, apenas e só, relacionadas com abuso e assédio sexual e/ou moral ocorridas no âmbito das actividades desenvolvidas no contexto” do CES. Promete-se ainda que a comissão “promoverá audições”, presenciais ou via digital, a todas as pessoas que demonstrem interesse nisso através da FaceUp, que indica que as comunicações feitas na plataforma são anónimas e encriptadas, ou do email da comissão.

Os membros da comissão são a especialista em psicologia clínica Catarina Reis Neves, actualmente directora técnica da Casa de Abrigo para homens vítimas de violência doméstica, a presidente do Instituto Latinoamericano del Ombudsman – Defensorias del Pueblo Cristina Ayoub Riche, a advogada especializada em contencioso, penal, direito de família e sucessões Eduarda Proença de Carvalho, o mestre em Medicina Jorge A. Ribeiro Pereira, hoje membro da direcção da European Network of Ombuds in Higher Education, e pela provedora da/o Estudante da Universidade Palacky, na República Checa, Michaela Antonín Malaníková, que é ainda membro da Câmara de Especialistas de Género do seu país.

“Tendo em conta os campos de especialidade” dos membros da comissão, o colectivo manifesta ainda em comunicado que é “imprescindível” saber como os seus métodos de trabalho vão “incluir a perspectiva de género e considerar as várias dimensões de vulnerabilidade das mulheres vítimas de assédio”.

O colectivo insta a comissão a saber “qual a situação actual, e de facto, dos principais investigadores acusados: Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins”. O grupo alude à possibilidade de, no âmbito da auto-suspensão dos seus cargos, que os investigadores “retomem selectivamente [as] suas actividades, podendo utilizar a sua influência para interferências” no processo ou “criar um ambiente intimidatório para as vítimas”. Daniela Felix diz ainda ao PÚBLICO que o dossier que está há meses a compilar para a comissão e que conterá documentos, mensagens e testemunhos alegadamente incriminatórios só será entregue se as respostas do organismo forem céleres e adequadas à sensibilidade do caso.

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