Manuel Clemente abre a Jornada da Juventude e não diz se estará com vítimas de abuso

O cardeal-patriarca de Lisboa confirma que a Igreja fará um memorial às vítimas de abusos por parte da Igreja, mas não avança quando.

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O patriarca de Lisboa vai presidir a missa de abertura da JMJ EPA/JOSE SENA GOULAO/Arquivo
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Manuel Clemente, cardeal-patriarca de Lisboa e responsável pelo envio da carta ao Papa Francisco, em 2017, a propor Lisboa para receber a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), não revela se estará no encontro que o bispo de Roma terá com as vítimas de abusos sexuais por parte do clero português. O responsável justificou que tudo está em segredo. "O encontro é realizado com discrição, as [pessoas] que foram vítimas não querem ser publicitadas, o local e número de participantes é tão discreto que não tenho conhecimento", respondeu quando o PÚBLICO questionou se estaria presente nesse encontro.

Sobre a construção de um memorial às vítimas dos abusos, que foi adiado para depois da JMJ, Manuel Clemente confirma que será construído, não adiantando mais pormenores. Quanto às manifestações já anunciadas que contestam a vinda do Papa e criticam a forma como a Igreja Católica lidou com os abusos sexuais no seu seio, Manuel Clemente disse aos jornalistas: "Vivemos numa sociedade democrática e livre."

Voltando a sublinhar que o compromisso da Igreja para a resolução da questão dos abusos é "total", Manuel Clemente recordou as acções que a Igreja tem levado a cabo, desde o trabalho que as dioceses têm vindo a fazer com a constituição de comissões com "pessoas muito profissionalizadas", à criação do Grupo Vita, constituído por psicólogos e outros profissionais, coordenado pela psicóloga Rute Agulhas. No caso da diocese de Lisboa, foi feito um protocolo com a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima. "Estamos a trabalhar, continuamos a trabalhar", sublinhou.

Geração 2023

O cardeal-patriarca abriu, nesta segunda-feira, a primeira conferência de imprensa no centro preparado para os meios de comunicação social, no Parque Eduardo VII, em Lisboa. Manuel Clemente relembrou a proposta feita a Roma para organizar este evento que poderá trazer a Lisboa mais de um milhão de jovens e o "sim" de Francisco, em 2017. Então, tudo estaria preparado para que o encontro internacional de jovens aconteceria em 2022, mas a pandemia trocou as voltas à organização.

Manuel Clemente não esqueceu as autoridades, das centrais às autárquicas, bem como às de segurança e saúde. "Devo dizer que, independentemente de cores politicas, todos foram muito concordantes e entusiastas da organização das JMJ", declara. O patriarca de Lisboa enalteceu ainda o papel da juventude portuguesa na organização do evento, ao longo dos últimos quatro anos, de norte a sul do país, incluindo os arquipélagos dos Açores e da Madeira, nas mais de três mil paróquias nacionais. “A JMJ Lisboa 2023 é sobretudo uma obra de juventude portuguesa, organizada também por aqueles que já são jovens há mais tempo”, sublinha.

O patriarca acredita que esta experiência deixará frutos na sociedade portuguesa, como “uma experiência de militância, serviço e compromisso”. E assevera: “Isto não passa. Cria uma geração, a geração 2023, constituída por dezenas de milhares de jovens que ganharam uma maneira de estar na sociedade.” O patriarca fez ainda referência ao relatório Pordata, conhecido neste domingo, que revela que sete em cada dez jovens portugueses declara-se católico.

Filipe Diniz, director do Departamento Nacional da Pastoral Juvenil e coordenador dos Dias da Diocese — a semana que termina nesta segunda-feira e que levou milhares de jovens a centenas de paróquias do país —, avançou que mais de 67 mil peregrinos "quiseram conhecer" o país e 17 dioceses "aceitaram esta grande proposta" (as excepções foram Lisboa, Santarém e Setúbal que se prepararam para receber os jovens durante este dias que agora começam). "A própria sociedade não ficou indiferente", resumiu.

O coordenador contabilizou ainda os quilómetros que os símbolos da JMJ, a cruz e o ícone de Nossa Senhora, fizeram — desde Angola, passando pela Polónia, Espanha e terminando em Portugal, em dois anos —, "foram mais de 40 mil quilómetros na carrinha, foi mais de uma volta ao mundo que os símbolos fizeram".

Questionado por um jornalista brasileiro sobre a possibilidade de a Igreja Católica ser racista, Manuel Clemente respondeu que essa não é a experiência portuguesa onde, por exemplo, em paróquias da região de Lisboa, a maioria dos crentes são "segundas, terceiras e quartas gerações de pessoas de origem africana".

Mais: "Nós estamos bem, no bom caminho para que haja uma sociedade intercultural, de partilha. Estamos muito atentos mesmo na formação do sacerdócio." Essa é também a mesma atitude nesta JMJ para com os jovens de outras religiões: "São bem-vindos todos os outros."

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