Os médicos cubanos em Portugal só receberam 20% do salário bruto?
Presidente da Iniciativa Liberal disse que a maior fatia dos vencimentos dos profissionais contratados em 2009 era retida pelo Estado cubano.
A frase
A agência cubana fica com uma enorme parte da compensação recebida do Estado português. Aquilo que está documentado em Portugal da vez anterior em que este tipo de contratos foi celebrado é que essa agência ficaria praticamente com 80% da contrapartida contratual paga pelo Estado português.
Rui Rocha, presidente da IL, sobre contratação de médicos cubanos pelo SNS
O contexto
O Governo anunciou este mês que pretende contratar entre 200 a 300 médicos oriundos de países da América Latina, incluindo Cuba, para reforçar os centros de saúde carenciados. A pedido da Iniciativa Liberal, o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, foi ouvido esta quarta-feira na comissão de Saúde da Assembleia da República, para explicar “suspeitas de violações graves dos direitos humanos” em acordos de contratação de médicos com o Estado cubano, nomeadamente a retenção de grande parte do vencimento por parte de Cuba. O líder da IL, Rui Rocha, referiu-se, especificamente, ao que aconteceu na última vez que o Estado português recorreu à contratação de médicos cubanos, em 2009, quando o actual ministro era secretário de Estado da então detentora da pasta, Ana Jorge.
Os factos
Em 2009, o Governo então liderado por José Sócrates contratou 44 médicos cubanos para exercer a sua actividade em centros de saúde do Alentejo, Algarve e Ribatejo. Segundo uma notícia, de Agosto de 2014, do jornal i, que acedeu aos dados do contrato entre Portugal e Cuba na sequência de uma queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, cada médico iria auferir um salário mensal de 5900 euros brutos, valor que foi revisto em 2011 para 4230 euros. “As entidades onde estes médicos trabalham pagam à empresa Serviços Médicos Cubanos, que depois se encarrega de pagar aos médicos”, revelava o i, sendo que aos profissionais cubanos só era entregue o valor líquido de 900 euros, 21% do salário bruto.
Um caso semelhante aconteceu no Brasil, em 2017, quando vários médicos cubanos contratados pelo Estado brasileiro ao abrigo do programa Mais Médicos recorreram à justiça para, entre outras queixas, reclamarem o valor integral do salário que, pelo acordo estabelecido no programa, era transferido directamente para o governo cubano e pago apenas parcialmente aos profissionais.
Segundo o jornal Globo, citando dois dos 154 processos abertos pela justiça brasileira, o Ministério da Saúde transferia para a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), intermediária do convénio entre os dois países, o valor de 10.570 reais (cerca de 2000 euros ao câmbio actual), reajustado em 2017 para 11.520 reais (2200 euros). Deste valor, os médicos cubanos recebiam 3000 reais (575 euros), cerca de 26% do salário bruto, ficando o remanescente para o governo cubano.
Em resumo
O presidente da IL está correcto quando se refere ao acordo celebrado em 2009 para a contratação de médicos cubanos, e vários casos internacionais demonstram que a prática do governo cubano era habitual. Para além do Brasil, uma investigação do jornal britânico Guardian em 2019 dava conta de acordo semelhante entre Cuba e o Qatar. Quanto aos futuros contratos, o Ministério da Saúde ainda não revelou quaisquer detalhes.