Santa Maria: Administradora diz que Ayres de Campos foi exonerado porque indicadores assistenciais “não são bons”

Presidente da administração do Hospital de Santa Maria acrescentou, na comissão parlamentar de saúde, uma nova razão para a exoneração do director do departamento de obstetrícia e ginecologia.

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Ana Paula Martins, presidente da administração do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, foi ouvida na comissão de saúde Daniel Rocha

A administradora do Hospital de Santa Maria acrescentou esta quarta-feira uma nova justificação para a controversa exoneração do director do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia, Diogo Ayres de Campos, além do outro motivo já conhecido - a contestação ao fecho da maternidade a partir de Agosto por causa das obras de remodelação. Ana Paula Martins adiantou aos deputados da comissão de saúde que este departamento tinha maus indicadores assistenciais, como a redução de consultas e de exames de diagnóstico.

Em declarações aos deputados na comissão de saúde, onde foi ouvida a pedido do Chega, a presidente do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (CHULN) - que integra os hospitais Santa Maria e Pulido Valente - repetiu o que já tinha sido anunciado, enfatizando que as demissões aconteceram (além de Diogo Ayres de Campos, foi afastada a directora do serviço de obstetrícia) porque os entraves colocados pelo ex-director não eram de natureza técnico-científica.

"Sempre que imaginávamos que estávamos prestes a ter um plano, reiteradamente o ex-director colocava alguns entraves que considerámos não serem de natureza técnico-científica, por não estar em causa a segurança", disse, frisando ser "muito difícil, quase impossível" para o conselho de administração "não ter a colaboração participada da direcção".

Contradizendo a informação avançada há dias aos deputados da comissão de saúde pelo ex-director, Ana Paula Martins anunciou que "os indicadores assistenciais, infelizmente, não são bons". "Diminuímos em 21% o número de consultas perinatais, os meios complementares de diagnóstico [ecografias] e temos dados do planeamento e controlo gestão que comprovam isto", afirmou, adiantando ainda que se verificou também uma diminuição de acesso à interrupção voluntária da gravidez.

Ana Paula Martins disse ainda que não havia alternativa a não ser a de encerrar o bloco de partos do Santa Maria e transferir uma parte da equipa para o S. Francisco Xavier, uma vez que as obras no primeiro implicam uma intervenção "em três pisos em simultâneo". São "obras estruturais", num investimento de "seis milhões de euros" que visam não só requalificar mas também expandir a maternidade do hospital, de forma a aumentar a capacidade para que seja possível fazer "mais 1500 partos" por ano, sintetizou.

Por último, foi de novo invocado como mais um motivo para o afastamento de Diogo Ayres de Campos o relatório da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS), que terá detectado erros na transferência - do Santa Maria para o Hospital S. Francisco Xavier - de uma mulher grávida que acabou por morrer em Agosto do ano passado.

Questionado pelos deputados que reclamaram a divulgação deste relatório que foi enviado para o Ministério Público, o director clínico do CHULN, Rui Tato Marinho, também presente, argumentou que foi Diogo Ayres de Campos que comentou o documento publicamente,"de forma depreciativa relativamente ao perito e à IGAS", por não concordar com as conclusões.

Um trabalho de equipa "muito complicado"

Apesar deste "evento adverso muito grave", a morte da grávida, Rui Tato Marinho reconheceu que se trata de um trabalho de equipa "muito complicado". "É muito fácil haver um evento adverso (...). Vão morrer grávidas sempre, isso faz parte da estatística, sobretudo quando se trata de pessoas mais velhas, com mais doenças". Recordou, a propósito, que o Santa Maria está a receber muitos casos de grávidas de outros países - o chamado "turismo de saúde" -, notando que são gravidezes não seguidas, o que dificulta o trabalho dos obstetras. "Aí, ficamos com os dois meninos nos braços: a grávida e o bebé".

Rui Tato Marinho corroborou igualmente os dados avançados por Ana Martins sobre os indicadores assistenciais no departamento de Ginecologia e Obstetrícia e acrescentou mais um: as reclamações "duplicaram em três anos". Afirmações que foram contestadas por Catarina Martins, do Bloco de Esquerda, que recordou que "o director clínico mandou um mail a esta equipa [do Departamento de Ginecologia e obstetrícia] a dar os parabéns" pela actividade desenvolvida.

Ana Paula Martins fez ainda questão de sublinhar que a exoneração nada teve que ver com a equipa de 40 elementos do departamento, e notou que as obras vão servir para dar melhores condições aos profissionais que trabalham em Santa Maria e evitar que saiam do Serviço nacional de Saúde.

Lembrando que se trata de um hospital universitário, Ana Paula Martins explicou, a propósito, que há especialidades a que os internos "nem se candidatam e nem querem ficar, porque as condições não são boas". "Houve uma área em que abrimos 13 vagas e apenas cinco ficaram", exemplificou, sem especificar de qual se trata.