Portugal transpõe regras de transparência sobre os lucros das multinacionais
Conselho de Ministros aprovou diploma que traduz a directiva europeia já fora do prazo dado aos países da União Europeia para o fazerem.
O Governo português aprovou na reunião do Conselho de Ministros desta quinta-feira um diploma que transpõe para o plano nacional as novas regras europeias que obrigam as maiores multinacionais a publicar informações sobre os lucros obtidos e os impostos pagos em cada jurisdição onde estejam presentes.
Os grupos com receitas consolidadas de pelo menos 750 milhões de euros (como a Microsoft ou a Volkswagen, por exemplo) terão de divulgar uma série de informações financeiras e fiscais sobre as suas empresas, o que abrangerá as sucursais com actividade no território nacional.
O diploma vem transpor a directiva europeia 2021/2101. O Governo fê-lo com atraso, já depois de terminar o prazo definido a nível europeu para tal, já que, segundo a directiva, os 27 Estados-membros tinham até 22 de Junho deste ano para colocar em vigor “as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias” para o cumprimento da directiva. As regras começam a aplicar-se “o mais tardar” a partir do primeiro exercício que se inicie a partir de 22 de Junho do próximo ano.
Ao divulgar nesta quinta-feira que o Conselho de Ministros aprovou o decreto-lei, o Governo não explicou a razão do atraso na transposição das normas.
A estrutura principal do texto da directiva europeia foi consensualizada entre os governos europeus durante a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE) no início de 2021 e a versão final, já depois das negociações com o Parlamento Europeu, ficou pronta em Novembro desse ano, já durante a presidência eslovena.
Apesar de as regras envolverem matéria fiscal, que exige uma aprovação por unanimidade na União Europeia, este dossier foi tratado juridicamente na UE como uma medida da área da economia — numa perspectiva de transparência das informações comerciais das empresas — e, por isso, no plano nacional, a transposição da legislação acontece através de um decreto-lei do Governo, não de uma proposta de lei que segue para o Parlamento.
Relativamente à actividade de cada país, o relatório deve incluir, por exemplo, “uma breve descrição da natureza” das actividades desenvolvidas pela empresa, o número de trabalhadores a tempo inteiro no ano a que a informação se reporta, o valor das receitas anuais, o montante dos resultados antes de impostos sobre o IRC, o valor do IRC “devido durante o exercício em causa” relativamente aos resultados tributáveis “pelas empresas e sucursais na jurisdição fiscal” em causa, o valor do IRC “pago em base de caixa”.
No comunicado desta quinta-feira, o Governo sublinha que a medida “visa aumentar a transparência das empresas, contribuindo para um maior escrutínio por parte dos financiadores, investidores, fornecedores, clientes, trabalhadores e da sociedade civil em geral, quanto aos impostos sobre o rendimento suportados pelas empresas multinacionais que exercem actividade na União Europeia e em particular em Portugal”.
Na directiva, a UE defende que a “comunicação pública de informações discriminadas por país” pode também “ter um impacto positivo nos direitos dos trabalhadores à informação e à consulta” de dados, melhorando a “qualidade do diálogo” no interior das empresas.
Neste momento, as casas-mãe das multinacionais presentes na UE já são obrigadas a entregar uma declaração de informação por país — o que permite às autoridades tributárias usar essa informação para inspecções, incluindo em eventuais casos de cooperação internacional com outras congéneres. Agora, as empresas ficam obrigadas a divulgar determinadas informações ao público, através de relatórios.
Esta nova directiva não é a mesma que fixa o IRC mínimo das multinacionais de 15% a nível mundial, que também se aplica aos grupos com receitas consolidadas a partir dos 750 milhões de euros anuais. Portugal tem igualmente de transpor essas regras este ano. Nesse caso, está em causa legislação fiscal que obrigará o Governo a apresentar uma proposta à Assembleia da República nos próximos meses, para salvaguardar que Lisboa cumpre o acordo internacional celebrado em Roma em Outubro de 2021 para criar um patamar mínimo de tributação a nível global para o mesmo universo de multinacionais.