Três perguntas a João Feijó: Al-Shabab em Cabo Delgado “é uma espécie de franchising

João Feijó, investigador do Observatório do Meio Rural, uma organização não-governamental moçambicana, diz que os insurgentes militarizados são cerca de 200 e que estão dispersos pela floresta.

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João Feijó: "Não conheço nenhuma guerra que não tenha tido apoio externo. A Frelimo teve apoio externo. A Renamo teve apoio externo". Paulo Pimenta
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O islamismo chegou à costa norte de Moçambique com a cultura suaíli que se espalhou por toda a África oriental. Mas quando falamos das ligações entre o grupo Al-Shabab e o autoproclamado Estado Islâmico estamos a falar de um mito ou de uma realidade?
Nas nossas entrevistas [em Cabo Delgado], constatamos que os líderes se apresentam como pertencendo ao Estado Islâmico e que utilizam uma bandeira muito parecida. Tinham sempre alguém a filmar quando raptavam. A minha interpretação é que isto funciona como uma espécie de franchising. Aliando-se ao Estado Islâmico, ganham publicidade, recrutamento e mercenários para ataques de maior envergadura. E podem ganhar algum apoio em treino e armamento. Eu acho que essa ligação existe. Até porque, sempre que há um ataque também há um anúncio (em tempo real) da agência do Estado Islâmico. E também não há dúvida de que os líderes mais influentes são moçambicanos, porque são eles que falam as línguas locais e têm a capacidade de recrutamento. Por outro lado, não conheço nenhuma guerra que não tenha tido apoio externo. A Frelimo teve apoio externo. A Renamo teve apoio externo.

A chegada de militares do exército ruandês alterou o conflito. O Al-Shabab tem condições para resistir?
Eles não confrontaram o exército ruandês. O que acontece é que eles utilizaram a típica técnica de guerrilha, que a Frelimo e a Renamo também já tinham utilizado. Optaram por se dispersar por pequenos grupos e actuar na periferia, onde o inimigo está mais fraco, que foi o que fez a Frelimo na sequência da operação Nó Górdio... É por isso que eu digo que esta é a terceira vez que estamos a ver o mesmo filme.

Mas sabe-se qual é a dimensão deste grupo?
As estimativas apontam para terem chegado a ser mais de dois mil. Relatos dos ataques em Mocímboa da Praia referem 700 pessoas e os de Palma entre 400 a 500. Hoje, devem ser cerca de 200, se estivermos a falar da parte militar. Muitos deles estão, anonimamente, nas aldeias e vilas. Não sabemos se enterraram a arma ou se vão regressar. Eles conhecem muito bem a mata, as potencialidades nutritivas das raízes e plantas silvestres. Num território com uma mata densa, abriram clareiras, onde foram construídos aldeamentos. Escondem-se nestas bases. Há florestas tão fechadas nas quais não se vê a luz e onde construíram bunkers. Os insurgentes nunca saíram da bacia do rio Messalo [o maior do Nordeste de Moçambique], porque têm acesso a água, peixe e às machambas (pequenos terrenos agrícolas). Estão habituados a sobreviver no mato.

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