O lugar do anime num mundo que anseia pela diversidade

Através do anime voltamos à infância, a momentos e lugares em que fomos felizes, em que decidimos deixar-nos levar pela beleza e pela filosofia do questionamento.

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Megafone P3: O lugar dos animes num mundo que sempre anseia pela diversidade Gracia Dharma/Pexels
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Numa sociedade globalizada em que as culturas se inter-relacionam de forma cada vez mais intensa, o acesso às criações artísticas é facilitado. Assim, conseguimos estar a choramingar perante um enredo de um filme americano de manhã e numa gozação total de tarde sobre os efeitos especiais de uma novela indiana.

Um produto que caracteriza as vivências adolescentes e juvenis contemporâneas é o anime. Quem aprecia estas histórias japonesas não fica indiferente à própria cultura nipónica, nomeadamente pelos avanços tecnológicos que caracterizam esta diversidade de animações, compostas de lições sobre o lugar e o papel da humanidade.

Nós, otaku (pessoa com um interesse especial pelos animes e manga, banda desenhada japonesa), acreditamos que a nossa identidade se cruza com as dores e as alegrias de cada uma das personagens. Todas elas manifestam os seus sentimentos de um modo profundo, sendo o outro lado da moeda de um mundo em que as pessoas se fecham em si mesmas e deixam de dar origem a espaços de comunicação.

Nos 20 minutos que um episódio de anime habitualmente tem, perspectivamos vidas em jogo, sonhos nascidos e reconfigurados, obstáculos à concretização dos mesmos e lutas pela valorização de ideais. Confiamos que os heróis, os apoiantes e os antagonistas detêm uma complexidade maior do que aquela que compõe os nossos próprios trajectos biográficos.

Mas o anime tem também uma importância social e, até, sociológica. Revelam os contextos de vida do Japão, exibindo as infra-estruturas das cidades ou as ruralidades da vida no campo. Também levantam o véu sobre fenómenos tão belos como o apoio familiar, a força da amizade, o sentido da perseverança ou, por outro lado, tão cruéis como a violência doméstica, a pobreza ou o suicídio. Dão-nos a conhecer a presença de uma sociedade em que o capitalismo ocidental se interliga com as temporalidades do oriente e os sentidos missionários e pedagógicos que o caracterizam.

Existe uma função comercial na produção destas animações, mas elas vão muito além do mero consumo pop que pretende homogeneizar as nossas práticas culturais. Há discursos de personagens que não esquecemos e que não podem ser comprados numa lógica de mercantilização das relações sociais, constituindo, antes, uma dimensão de autoconhecimento pela maneira como se entrelaçam com o que estamos a pensar ou a sentir.

O facto de jovens norte-americanos e europeus acompanharem de forma frequente e atenta o anime demonstra uma suplantação das distâncias entre nações, apresentando-se, pois, como uma aproximação de experiências e uma diversificação dos modos de vida.

Além disso, através do anime voltamos à infância, a momentos e lugares em que fomos felizes, em que decidimos deixar-nos levar pela beleza e pela filosofia do questionamento dos sentidos da nossa existência. Os olhos muito grandes, brilhantes, os cabelos de cores e feitios (quase) impossíveis, as falas e os diálogos não pertencem apenas àqueles seres, são também pistas que nos deixam para tornarmos a realidade mais vívida e mais compassiva.

Por favor, à eterna elaboração das animações japonesas, fontes de inspiração e bondade recíproca. Que todos nós possamos dar uma maior oportunidade a estas ficções, pois, antes disso, elas são sinais tanto daquilo que mais valorizamos no mundo como daquilo que mais sentimos falta para alcançarmos um maior conforto colectivo.

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