Urgências pediátricas. Sindicatos lamentam falta de medidas para fixar médicos no SNS

Direcção Executiva do SNS mantém encerramento programado de algumas urgências pediátrias. Administradores hospitalares dizem que modelo faz sentido num contexto de recursos humanos limitados

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Na região de Lisboa e Vale do Tejo, das 14 urgências pediátricas só oito estarão abertas de forma permanente durante o Verão Rui Gaudêncio
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Para os sindicatos dos médicos, a continuidade do encerramento programado de algumas urgências pediátricas na região de Lisboa e Vale do Tejo mostra a falta de medidas para reforçar os meios humanos no SNS. "Isto é uma forma de o Governo tentar disfarçar a falta de médicos no SNS", considerou a Federação Nacional dos Médicos (Fnam). Para o Sindicato Independente dos Médicos (SIM), enquanto não houver reforço do SNS, "as pessoas mais frágeis terão mais dificuldade de acesso”. Para a Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares, esta é uma "solução que faz sentido num contexto de recursos humanos limitados" e é preferível a ter urgências abertas sem escalas completas e resposta limitada.

Na noite de quinta-feira, a Direcção Executiva do SNS (DE-SNS) actualizou o plano referente às urgências pediátricas, mantendo um esquema semelhante ao que já estava em vigor. Até ao final de Setembro, na região de Lisboa e Vale do Tejo, das 14 urgências existentes só oito estarão abertas de forma permanente durante o Verão. Das restantes, três funcionarão durante o dia e as outras três terão "condicionamentos programados".

Tânia Russo, membro da direcção do Sindicato dos Médicos da Zona Sul e do Conselho Nacional da Fnam, considera que o plano apresentado “não traz nada de novo em relação ao que estava em vigor”. “Para a Fnam, isto não é um processo de reorganização, nem de reforma ou plano estratégico como a DE-SNS chama a estas alterações. Isto é uma forma de o Governo tentar disfarçar a falta de médicos no SNS, nomeadamente de pediatras.”

A médica salientou que esta era uma situação previsível, sabendo-se de antemão a previsão de médicos que se podem reformar e aqueles que terminam a especialidade em cada ano. “Esta é uma situação que deveria ter sido acautelada há muito tempo. Este plano é uma forma de o Governo mostrar que está a tomar algumas medidas, mas que não trazem eficácia na melhoria da qualidade dos cuidados. Trazem mais barreiras ao acesso e mais confusão”, considerou.

“Existem várias medidas que o Governo elenca, como a promoção da saúde, o reforço dos cuidados de saúde primários, medidas que temos vindo a defender e que são desejáveis, mas que tardam a ser concretizadas. O Governo não tem mostrado propostas que surtam algum efeito”, apontou Tânia Russo, recordando que na região de Lisboa e Vale do Tejo mais de um milhão de pessoas não têm médico de família atribuído. “Na maior parte dos casos, as crianças só conseguem alguma vigilância [nos centros de saúde] até aos dois anos e mesmo assim com algum atraso”, disse, referindo que “faltam as medidas para fixar os profissionais e acautelar o planeamento em cada região”.

Recursos humanos limitados

Para a representante da Fnam, “todos estes planos estratégicos que o Governo e a DE-SNS têm vindo a fazer denotam o desnorte e a total incapacidade de resolver os problemas do SNS e a degradação a que o SNS chegou”. Destacando o facto de o comunicado da DE-SNS fazer referência ao processo negocial que decorre com os sindicatos médicos como podendo criar condições “mais favoráveis à motivação dos médicos para o SNS", Tânia Russo disse que a Fnam espera que isso seja “o assumir de um compromisso sério de haver negociações com os sindicatos que possam tornar atractiva a carreira e o serviço no SNS”.

Também para o Sindicato Independente dos Médicos, a solução que se mantém em vigor está longe de ser a ideal. “Infelizmente, os piores receios e alertas do SIM confirmaram-se. Quando o Governo e a DE-SNS falam em reestruturação, estão a falar de encerramentos. Não só em pediatria e pedopsiquiatria, mas também em obstetrícia”, disse Jorge Roque da Cunha.

O secretário-geral do sindicato lamentou que nos últimos meses nada tenha sido feito para criar condições para estancar e colmatar a saída de pediatras do SNS, seja por rescisão de contratos ou por reformas. “Enquanto o Governo insistir nesta atitude de não robustecer o SNS, as pessoas mais frágeis terão mais dificuldade de acesso.”

Visão menos crítica da solução tem o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares, referindo que este é “um modelo que faz sentido num contexto de recursos humanos limitados”. Para o representante dos administradores hospitalares, é importante que se faça uma avaliação da medida em curso, nomeadamente perceber se os tempos de espera foram afectados ou não nas unidades abertas e que poderão vir a receber utentes que procurariam outras urgências.

Recordando que no Porto já existe um modelo de urgências nocturnas concentradas no Hospital de São João que tem funcionado, Xavier Barreto salientou que “é melhor ter a prestação de cuidados centrada em algumas urgências, durante alguns períodos do dia, do que ter serviços com escalas incompletas com um atendimento aquém do necessário”.

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